Doença inflamatória caracterizada pela presença de partes do endométrio – o tecido que reveste a cavidade uterina – fora do útero, a endometriose surge quando o sangue eliminado pela menstruação regressa para as trompas, o que faz com que as células do endométrio fiquem implantadas no interior do abdome. A inflamação, geralmente descoberta na faixa dos 20 aos 30 anos, em casos mais graves também é capaz de acometer outros órgãos da região, como o intestino.
Se não tratada, a endometriose só diminui naturalmente ou até desaparece durante a menopausa, pois nessa fase os níveis dos chamados hormônios ovarianos, como o estrogênio, que são essenciais para a manutenção da doença, regridem bastante.
A endometriose é, também, uma das principais causas que impedem que mulheres engravidem, e conforme explica a médica ginecologista e especialista em reprodução assistida Cláudia Navarro, a infertilidade ou dificuldade para engravidar está relacionada às formas como a endometriose se apresenta. “A endometriose se manifesta de maneiras diferentes em cada mulher e, por isso, as situações que a levam à infertilidade também vão variar”, diz.
Segundo ela, apesar de existirem vários pontos sobre a doença que ainda precisam de mais estudo e investigação, é sabido que a endometriose é capaz de provocar distúrbios ovulatórios, redução no número e/ou na eficiência da reserva ovariana, distorção na anatomia pélvica e produção de toxinas locais, que podem prejudicar a implantação do embrião e a interação entre o óvulo e o espermatozoide.
Joaquim Roberto Lopes, ginecologista, obstetra e membro da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA), completa ao falar que o processo inflamatório instalado no abdome graças à endometriose promove uma espécie de aderência entre os órgãos da pelve, o que dificulta a coleta dos óvulos pelas trompas na hora da ovulação. Independentemente disso, a doença pode também obstruir as trompas, impedindo esse encontro entre óvulo e espermatozoide já citado. Para completar, a presença de cistos nos ovários é mais um fator prejudicial da função ovariana.
Se você tem endometriose e está tentando engravidar, não se desespere. Apesar de não ter cura, a doença pode sim ser tratada mediante diferentes métodos e abordagens que vão permitir à pessoa levar uma vida normal e confortável, contribuindo para a gravidez. Entenda quais as alternativas.
Antes de mais nada, fique atenta aos sintomas
É comum que mulheres que estejam tentando engravidar mas não conseguem, seja por desinformação ou por falta de acompanhamento médico, não associem isso a uma possível endometriose, e estar atenta aos sinais que podem levar ao diagnóstico da doença é essencial.
“Não é necessário temer a doença, mas conscientizar a população sobre ela. A endometriose atinge cerca de 10% das mulheres em idade fértil, mas nem sempre será grave e nem sempre causará infertilidade”, diz Cláudia, que reforça a importância de consultas ginecológicas periódicas.
O sintoma mais comum da endometriose, explicam os médicos, são cólicas fortes e prolongadas, que geralmente são interpretadas como sinal natural do corpo durante a menstruação. Porém, caso essas cólicas apareçam por volta dos 20 anos de idade e se intensifiquem com o tempo, o quadro deve ser investigado.
O mesmo vale para dores durante relações sexuais ou na hora de evacuar que, acompanhadas pelas cólicas, se configuram como outros sintomas de uma possível endometriose. Mas Cláudia reforça que a doença também pode ser assintomática. “Muitas mulheres só descobrem a doença quando começam a investigar a infertilidade. É importante frisar que a intensidade dos sintomas não tem relação com a gravidade da inflamação, nem com a probabilidade de engravidar. A mulher pode ter um dano sério na pelve e não ter sintoma algum”, fala a médica.
Para um diagnóstico preciso da doença, explica Joaquim, além das consultas médicas é recomendado que a paciente faça exames de imagem, como ultrassonografia e ressonância magnética.
Tenho endometriose e quero engravidar. O que fazer?
Após o diagnóstico preciso, o tratamento para a endometriose, explicam os médicos, deve levar em consideração alguns pontos: o estágio da doença, a intensidade dos sintomas e a idade da paciente, pois após os 35 anos (com ou sem endometriose) a capacidade reprodutiva costuma diminuir, então vale levar em consideração o desejo dessa pessoa de engravidar – e por quanto tempo ela estaria disposta a adiar essa gestação.
Em resumo, vale dizer que, enquanto a endometriose é tratada, a gravidez natural fica impossibilitada de acontecer, e é por isso que mulheres que planejam uma maternidade futura precisam ser acompanhadas por especialistas para que evitem uma progressão ou piora da doença.
Os tratamentos para a endometriose variam entre medicamentosos e cirúrgicos, sendo a pílula anticoncepcional, ministrada de forma contínua, o mais comum deles. É claro que, enquanto usar a pílula, a mulher estará impossibilitada de engravidar – o que entra, novamente, na questão de considerar se a vontade de engravidar é imediata ou não.
Além do anticoncepcional, injeções de hormônios também podem ser indicadas para o tratamento, bem como o uso de anti-inflamatórios e analgésicos (que não tratam a doença, mas amenizam os sintomas).
As alternativas para tentar uma gravidez quando se tem endometriose também são diversas, mas algumas pessoas conseguem engravidar sem a necessidade da reprodução assistida. Cláudia explica que isso se dá pois a infertilidade pode ocorrer em cerca de metade das mulheres com endometriose (sendo que as demais, por consequência, poderão gestar pós-tratamento).
Já para quem está com dificuldade para engravidar, alguns métodos considerados pelos médicos especialistas em reprodução humana são a estimulação ovariana, a inseminação intrauterina (IIU) ou até mesmo a Fertilização In Vitro (FIV). A escolha deve ir de acordo com as recomendações do profissional, levando em consideração a forma como a endometriose se apresenta e o tratamento indicado para a doença.
“A endometriose é uma enfermidade que acomete um grande percentual de mulheres com dificuldades de engravidar, mas os recursos diagnósticos e terapêuticos, quer seja por FIV, quer seja mediante cirurgia em casos especiais, representam um grande avanço no enfrentamento da infertilidade decorrente da doença”, completa Joaquim.
Em quais casos é recomendada a cirurgia? Ela afeta a fertilidade?
O tratamento cirúrgico para a endometriose, destaca Cláudia, é aplicado em casos específicos da doença, e é preciso que o médico avalie com cautela cada paciente. A cirurgia, complementa Joaquim, costuma ser mais frequentemente indicada quando a inflamação acomete de maneira grave o aparelho digestivo ou urinário, ainda mais se vem acompanhada por sintomas capazes de prejudicar a qualidade de vida da pessoa.
Nesses casos mais graves, sugere o médico, e especialmente em mulheres jovens que querem engravidar, deve ser considerada a indicação do congelamento de óvulos antes da cirurgia. Qualquer operação no útero é delicada quando o assunto é fertilidade, e alguns procedimentos podem agredir os ovários e comprometer a capacidade de reprodução futura.
Pandemia, endometriose e gravidez
Cláudia afirma que, de acordo com a Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA), a endometriose não representa um fator de risco para quem contrai a Covid-19, ou seja, a gravidade do impacto do coronavírus não muda caso você tenha endometriose ou não. Da mesma forma, quem tem a doença inflamatória não está mais exposto ao coronavírus do que outros indivíduos livres do diagnóstico.
Porém, nos casos de quem tem endometriose e deseja engravidar, algumas questões devem ser analisadas – avaliando cada paciente de forma individual. Segundo Joaquim, cabe à mulher que tem endometriose e está considerando a gravidez recorrer ao médico para que possa avaliar fatores como a reserva ovariana, o estágio da doença e a idade reprodutiva.