“Dizemos para garotas: ‘você pode ter ambição, mas não muito. Você deve tentar obter sucesso, mas não ser tão bem-sucedida assim – ou você vai acabar sendo vista como ameaça para os homens’. Por eu ser mulher, espera-se que eu aspire por um casamento, espera-se que eu faça escolhas na minha vida tendo sempre em mente que o casamento é a coisa mais importante. (…). Por que ensinamos isso às meninas, mas não aos meninos? Nós criamos garotas para que enxerguem umas às outras como se estivéssemos competindo – não por trabalho ou realizações pessoais, o que poderia ser uma coisa boa – mas pela atenção dos homens”.
A passagem acima, em tradução livre, é de autoria da escritora e ativista feminista nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, e representa um trecho de seu famoso discurso “We should all be feminists”, a princípio um TED Talk que, posteriormente, se transformou no livro “Sejamos todos feministas”. O sucesso da fala foi tanto, que até mesmo a cantora Beyoncé a incluiu em “Flawless”, uma de suas canções mais famosas sobre autoaceitação.
Chimamanda faz comparações extremamente relevantes quando falamos sobre as diferenças existentes na criação e educação de meninos e meninas, o que contribui para a manutenção de tantos privilégios sociais que ficam na mão dos homens. Uma maneira de mudar isso, ainda que aos poucos, é educar garotas para que elas tenham mais amor próprio e desenvolvam autoconfiança ainda pequenas – o que também é tarefa de pais, mães e demais familiares próximos.
Se você é mãe ou pai de menina e quer que sua filha cresça valorizando suas qualidades e sendo mais gentil consigo mesma, sem arrogância ou competição, listamos algumas medidas simples que podem ser tomadas para incentivar diariamente o desenvolvimento do autoamor nas pequenas.
1. Incentive a identificação e a diversidade por meio de brinquedos
Se a sua filha gosta de brincar de bonecas, por exemplo, garanta que ela tenha brinquedos que gerem identificação, mas ao mesmo tempo a façam enxergar diversidade. Parece algo bobo, mas enxergar identidade em brinquedos é uma maneira de incentivar o amor próprio.
Por exemplo, ainda é bem mais difícil encontrarmos bonecas brancas do que bonecas negras para vender, mas se você é mãe de uma menina preta, é essencial que ela tenha pelo menos uma bonequinha que vá servir de espelho – o mesmo vale para meninas de ascendência asiática. Já se você é mãe de uma menina branca, encontrar uma boneca “parecida” com a sua filha não será tão difícil, mas trate de investir também nas que tenham cores, tipos de cabelo e aparência diferentes da dela.
2. Saiba como cuidar do cabelo da sua filha – e ajude-a a fazer penteados que ela goste
Não importa se o cabelo da sua filha é liso, ondulado, cacheado ou crespo. Saber como cuidar dos fios da criança e incentivá-la a fazer penteados diferentes e divertidos vai ajudá-la a se conhecer melhor e aprender a amar cada pedacinho de seu corpo. Se você não leva muito jeito para a coisa, vale usar tutoriais e imagens da internet como referência, e aprender a reproduzir os estilos em casa. Acessórios capilares também costumam fazer sucesso entre meninas, mas não se esqueça de perguntar a ela sobre o que ela gostaria de usar e deixá-la livre para tomar decisões.
3. Apresente figuras femininas poderosas para ela
Vale tudo: uma super-heroína da TV ou dos quadrinhos, uma cantora com história inspiradora, mulheres que marcaram a ciência, a política, a literatura, as artes… Mostre, através de exemplos fáceis, para que ela entenda e visualize que pode ser o que quiser – do jeitinho que ela é.
4. Não incentive a competição feminina
Converse com a sua filha para que ela entenda que outras meninas não são melhores ou piores do que ela: cada uma é diferente e tem suas próprias qualidades, que devem ser celebradas. Ajude sua pequena a construir laços de amizade e cumplicidade com outras garotinhas, e incentive elogios sempre que possível!
5. Use a literatura a seu favor
Caso a sua filha ainda não saiba ler, na hora de contar uma história para ela escolha livros que tenham meninas e mulheres protagonistas, e valorizem aspectos como autoaceitação, liberdade feminina, quebra de padrões e diversidade.
O mesmo vale para garotinhas que estão aprendendo a ler: a literatura pode ser extremamente transformadora e gerar essa identificação para que sua filha desenvolva confiança e amor próprio. Mais uma vez, a ideia é não impor nada a ela: dê opções para que ela possa escolher os títulos que mais gostar.
6. Enalteça qualidades que vão além da aparência
Como apontamos, é sempre importante mostrar para a sua filha que ela é bonita do jeitinho que é, e fazê-la ser mais gentil com seu corpo. Porém, para que o amor próprio evolua e perdure, outras características também precisam ser reconhecidas.
Não deixe de valorizar qualidades como inteligência, paciência e generosidade, de reconhecer pequenas conquistas ou de elogiar um desenho ou alguma tarefa que ela tenha se empenhado a fazer. Isso não é, porém, um convite para tratar a garota como se ela fosse perfeita: dê a sua filha a chance de errar e não a culpe por isso, mostrando acolhimento.
7. Ajude-a a descobrir hobbies, atividades e paixões
É bastante comum que pais e mães projetem em seus filhos vontades e hobbies que eles mesmos gostariam de realizar, mas não tiveram oportunidade. Portanto, antes de colocar sua filha para fazer aulas de balé, leve-a para descobrir se ela gosta mesmo desse tipo de dança, ou se prefere, por exemplo, praticar outro esporte.
O mesmo vale para música, artes e outros cursos ou atividades: permita que a criança explore esses territórios e encontre identificação antes de bater o martelo e, depois disso, seja um incentivador/a. Permitir que os pequenos façam o que gostam é essencial para desenvolver a confiança.
8. Seja um exemplo de amor próprio
Pais, mães e outros membros da família mais próximos são os primeiros referenciais das crianças, embora com o tempo elas encontrem outras pessoas que também vão servir de inspiração. Por isso, é importante que quem educa também passe uma imagem de autoconfiança e amor próprio, para que meninas se espelhem de maneira mais saudável.
Novamente, não é sobre mostrar arrogância, superioridade ou perfeição, mas sim enaltecer conquistas e qualidades próprias, prestando atenção na forma como você fala de si na frente da criança.
9. Valorize as emoções da sua filha
Ciúme, raiva, inveja, medo, insegurança… Educar uma menina para que ela cresça com mais amor próprio é também permitir que ela seja livre para sentir todas essas emoções. Ou seja, é importante não desqualificar nenhum tipo de sentimento, e mostrar para a sua filha que ela pode ser vulnerável e que as sensações ruins vão surgir, mas também vão passar.
A melhor forma de fazer isso é através do afeto e do diálogo: acolha e procure entender as questões da sua pequena, sem julgamentos, ajudando-a a encontrar aspectos positivos até nos dias não tão bons.