Inspira, expira, alonga, medita… Não é de hoje que a prática de ioga vem se popularizando entre as mais diferentes faixas etárias e pessoas de estilos de vida distintos. E, não por acaso, ganhou ainda mais atenção devido a pandemia de coronavírus, o cansaço físico e mental e a necessidade de ficar em casa, já que quando ministrada corretamente é diversa e envolve exercícios de postura, alongamento, respiração, meditação e relaxamento.
Com esta disseminação da potência da modalidade, muitas gestantes também acabaram pegando gosto pela ioga, ou sentindo uma vontade de se aventurar a conhecer o que o método, pois desde que se tenha o aval médico, ele pode contribuir para uma gestação mais tranquila e saudável.
Para tirar todas as suas dúvidas sobre o tema e conhecer os benefícios da prática durante a gravidez, conversamos com as especialistas Anne Sobotta, idealizadora do projeto interdisciplinar de prática somática perinatal Birth in Motion e professora de ioga para gestantes durante 15 anos, e Carmen Perez, também professora da modalidade há mais de cinquenta anos e especialista em preparação de gestantes para o parto natural.
Toda grávida pode praticar Ioga?
A princípio sim, mas com ressalvas. Anne explica que é bem comum, ao falamos sobre a ioga, “colocarmos tudo no mesmo saco”, quando, na verdade, o que existem são muitas práticas diferentes. Se considerarmos a ioga como uma atividade física de intensidade moderada – que, para os médicos, é algo benéfico e permitido na gravidez – existem algumas restrições, mas elas são as mesmas que se aplicam a qualquer outro tipo de exercício físico.
“A recomendação de repouso total para gestantes, hoje em dia, é muito menos indicada pelos médicos. Dentro da ioga existem práticas que vão ser benéficas para essa gestante, pois vão focar no relaxamento, no trabalho respiratório, de mobilidade e consciência corporal mais suave. Entretanto, são poucos os profissionais que trabalham dessa forma”, completa a especialista.
Carmen sugere que grávidas procurem por aulas de ioga com abordagens pensadas para gestantes dentro desse universo, que vão ajudá-las a manterem e fortalecerem o vínculo com esse novo ser, seja por meio das asanas (posturas), dos pranaiamas (exercícios de respiração), dos mantras ou das meditações.
De qualquer forma, é sempre importante consultar o médico antes de iniciar a prática, até para entender melhor sobre sua gravidez e restrições mais específicas. É essencial fazer o pré-natal e avaliar caso a caso a situação de cada pessoa e, quando existirem complicações, reavaliar a continuação ou não da atividade.
“Em alguns casos, como descolamento de placenta, é melhor que a gestante não comece a praticar ioga, e isso vai de acordo com aquilo que o médico liberar. Os casos de placenta prévia também causam restrições, sendo recomendado focar apenas nas meditações, relaxamentos e pranaiamas”, indica Carmen.
Quando começar e até quando praticar?
Segundo Anne, apesar de no primeiro trimestre da gravidez ocorrerem mais perdas gestacionais, a prática de atividade física durante esse período não está relacionada a elas, ou seja, não há contraindicações ou hora certa para começar a fazer ioga na gestação, desde que ela seja permitida pelo médico.
Só que é ainda no primeiro trimestre da gravidez que as mudanças hormonais apresentam-se de maneira mais intensa, o que pode despertar uma maior sensação de cansaço e mal-estar. Portanto, se a gestante quiser sentir-se mais segura, o ideal é esperar o período passar para começar a se exercitar:
“A partir das doze semanas a gestante pode iniciar a prática com maior segurança. Antes disso, o novo ser está passando por um processo de adaptação e ajuste, e é recomendado que se dê esse tempo”, opina Carmen.
Não existem problemas, ainda, em fazer ioga até o momento do parto, já que se não há nenhuma complicação específica na gravidez, não existe motivo para essa mulher interromper a prática, que novamente não deve ser de alta intensidade ou ministrada em ambientes muito aquecidos.
Tudo deve desenrolar-se de acordo com o quanto a gestante se sente confortável até o último mês: a ioga deve ser um recurso para trazer acolhimento emocional e momentos de bem-estar e relaxamento, e não o oposto.
Benefícios de fazer ioga na gravidez
Carmen ressalta que, para a gestante, os pranaiamas, as posturas, os mantras e as meditações são capazes de aumentar o fluxo de energia vital e ajudar a equilibrar as emoções, promovendo atenção, sensação de bem-estar e segurança. Ainda de acordo com a especialista, isso tudo faz parte de uma maior humanização do parto, capaz de devolver o protagonismo a essa nova mãe.
Já do ponto de vista físico, completa a especialista, a prática de ioga aumenta a flexibilidade e fortalece a musculatura do aparelho abdominal e da região torácica. A ioga contribui ainda para melhorar a força e a capacidade respiratória, o que também ajuda na oxigenação do bebê, que respira através da mãe:
“Ele se conecta com esse pulsar rítmico da respiração da mãe, recebendo sensações agradáveis que favorecem seu crescimento. Durante a prática, há um estímulo muito grande de todo o sistema endócrino, fazendo com que os hormônios respondam corretamente durante a dilatação e o parto, o que vai manter essa mulher mais confiante e serena no processo”, exemplifica ela.
A profissional assume, ainda, que todo o trabalho de ioga para a gestante tem a intenção de proporcionar a ela um parto feliz, por ser uma atividade que envolve diferentes elementos. Junto com isso, Carmen recomenda que mecanismos espirituais também sejam acessados na prática, tudo de acordo com a crença e vontade de cada mãe, pois isso também vai fazer com que ela reconheça que, nas fases de gestação e parto, ela é “uma deusa em processo de criação”.
Posturas: existe certo ou errado?
“Quando pensamos sobre as posturas, na verdade podemos acabar criando mais problemas na cabeça da gestante, isso porque gravidez e parto são sobre tudo, menos postura. São muito mais sobre movimento, mobilidade e respiração do que algo estático”, comenta Anne.
Dito isso, e com base em um trabalho realizado por profissionais que respeitem essa filosofia, as posições mais benéficas são aquelas que vão promover maior mobilidade para a região da coluna e articulações, que serão capazes de trazer mais equilíbrio para o assoalho pélvico, de posicionar adequadamente o bebê e aquelas que trabalhem em prol do fortalecimento do períneo.
Existem, porém, asanas proibidos, que podem, sim, prejudicar a grávida. São elas as chamadas invertidas de cabeça, as posturas sobre o ventre e qualquer uma que faça pressão na região do abdômen. Exercícios que forcem a amplitude de movimento de uma articulação também devem ser evitados, assim como posições que demandam uma retenção na respiração e posturas nas quais o tronco é inclinado para a frente, sem suporte.
“Eu não recomendo fazer posturas que trazem uma inversão completa, como as de cabeça para baixo: o problema delas é que, tanto na entrada da posição quanto na subida da postura, há muito aumento na carga abdominal, o que não é bom na gestação”, ilustra Anne. Por conta das alterações hormonais, a gestante tem também mais instabilidade articular e frouxidão nos tecidos conjuntivos, sendo estes outros fatores para que as invertidas de cabeça apresentem maiores riscos de lesões na coluna.
Dicas de ouro
Carmen chama atenção para que tenhamos consciência de que não está para nascer apenas uma criança, mas também uma mãe, que passa por transformações físicas e psicológicas merecedoras de atenção e carinho. Esses cuidados, fala a profissional, também devem ser parte do trabalho de ioga quando falamos sobre gestantes.
É por isso que a principal dica para quem está grávida e quer entrar para o universo da ioga, finaliza Anne, é procurar por profissionais competentes, que saibam sobre o que estão falando, tenham boa formação e entendam realmente do assunto.