Pré-natal psicológico: a importância de cuidar da saúde mental da gestante

Gravidez e puerpério são períodos desafiadores, mas com inteligência emocional e preparo psicológico é mais fácil lidar com dificuldades e emoções intensas.

Por Chloé Pinheiro
21 ago 2020, 13h19
Colocar prótese de silicone: Antes ou depois da gravidez?
Colocar prótese de silicone: Antes ou depois da gravidez? (Adene Sanchez/Getty Images)
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Algumas mulheres passam a gestação tranquilas e sobrevivem ao puerpério sem maiores abalos. Mas essa não é a regra, pelo contrário. E, com a atenção maior que a saúde mental tem recebido nos últimos anos, cresce a ideia de que, assim como a gestante faz um pré-natal médico, também deveria cuidar da mente no período. 

“Ter um preparo psicológico é importante para entendermos como estamos lidando com a gestação, que é um momento com muitas mudanças físicas, emocionais, sociais, há muitas expectativas e a mulher pode experimentar sentimentos ambivalentes”, explica Mariana Bonsaver, psicóloga da Pro Matre Paulista. 

Só que, infelizmente, o tema ainda é um tabu no universo da gestação. “Tendemos a colocar a gestante ou a puérpera como uma pessoa que não pode sentir nada negativo”, aponta Mariana. Daí, vem o medo em falar de tristeza, angústia, ansiedade e ser julgada pela sociedade ou pelo parceiro/parceira. 

“Isso faz com que ela sofra sozinha, o que, no futuro, pode aumentar o risco de depressão e ansiedade”, continua Mariana. Fazer um acompanhamento do tipo não é obrigatório nem vai blindar a mulher de qualquer emoção negativa no período, mas dá ferramentas para lidar melhor com elas. 

Poderíamos, ao menos, ofertar pelo menos um atendimento multidisciplinar para a grávida, com nutricionista, fisioterapeuta e uma consulta de avaliação com um psicólogo”, sugere Tatiana Tognolli Bovolini, psicóloga do Hospital e Maternidade Brasil, da Rede D’Or.

Quem mais se beneficia dele 

De novo, vale destacar que não é regra, mas algumas situações são mais delicadas. “Mulheres com perdas gestacionais anteriores, doenças pré-existentes, como hipertensão e diabetes, podem ter medos exacerbados e, por isso, merecem atenção especial”, explica Tatiane. 

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Quem faz tratamentos de reprodução assistida também se beneficia da abordagem. “Geralmente, são mulheres que fizeram grandes investimentos financeiros, físicos e estão tentando por anos engravidar, então as preocupações podem vir com mais intensidade”, comenta Helena Montagnini, psicóloga da Huntington Medicina Reprodutiva. 

Personalidades mais ansiosas e controladoras tendem a viver a gestação de maneira mais tensa. “Se ela já tem essa característica de controlar tudo, pode sentir mais pânico e angústia durante a gestação, justamente porque ela é algo que não é possível controlar, você precisa confiar na natureza, então ter esse desapego é difícil para muita gente”, aponta Ana Carolina Casalinho, psicóloga e psicanalista do Núcleo Cuidar. 

Até é normal ficar preocupada com a saúde do bebê e o futuro, o problema é quando isso passa a prejudicar a vida da futura mãe. “Querer fazer ultrassom toda hora para se certificar de que o bebê está bem, ter dificuldades para dormir, sentir muita angústia, alterações de apetite para mais ou para menos, são sinais de que esse sofrimento está passando do ponto”, explica Helena. 

Terapia para entender a questão do controle 

Como já adiantamos, parte do treino para a maternidade envolve aceitar que se está pisando em um terreno onde não há controle sobre praticamente nada. “O pré-natal psicológico ajuda a assimilar o fato de quer ter um filho é algo que não podemos controlar, e esse olhar precisa ser exercitado durante a gestação, porque quando o bebê nascer isso será mais acentuado”, destaca Ana Carolina. 

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Muito ligada com a necessidade de controle está a idealização do que é ser mãe. “Você planeja tudo aquilo, sonha com a maternidade, idealiza até a hora que o bebê vai nascer e todo o processo de parto e puerpério nos mínimos detalhes, mas desse planejamento nasce um ciclo de ansiedade, frustração e depressão”, diz Tatiana. 

A psicóloga do Hospital e Maternidade Brasil, aliás, é a prova viva de como manter o controle é impossível. “Sempre me policiei para não idealizar nada, e mesmo assim acabei me deparando com uma situação super desafiadora. Eu, meu marido e nosso bebê tivemos Covid-19, sendo que os dois foram para a UTI”, conta. 

Ou seja, podemos planejar o quanto quiser, mas as coisas acontecerão independente disso, o próprio bebê ditará o ritmo de seus cuidados e cada mulher terá seu jeito muito único de maternar, sem obedecer a padrões. Mas aceitar isso não é fácil, daí a importância do profissional de saúde mental. 

É possível se preparar para o puerpério? 

É repetitivo dizer que o puerpério é um período intenso, mas vivenciar isso na prática é diferente de qualquer projeção que podemos fazer. “Sabemos que o bebê não dorme, que os hormônios ficam bagunçados, mas a vida real é muito desorganizadora, porque há uma demanda física intensa e um estado de alerta constante, a ponto de desestruturar a mulher”, pontua Ana Carolina.

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A psicóloga explica que a desorganização emocional pode ser interpretada como se fossem blocos de encaixar soltos e misturados. “Já a desestruturação é quando as peças se perdem, e aí é necessária uma intervenção para que a mulher construa novas peças. É nesse contexto que surge a depressão pós-parto”, continua Ana Carolina. 

Outra vantagem de fazer o acompanhamento psicológico durante a gestação é que, depois que o bebê nascer, a exigência física e mental é tamanha que é praticamente impossível procurar ajuda quando o calo apertar. “Se ela já vem num processo de sentir e processar as próprias emoções, conseguirá lidar melhor com a situação”, encerra Ana Carolina. 

A outra parte do casal também deve ser incluída na conversa 

E não só como parte da rede de apoio que zela pela saúde emocional da mulher, mas porque tudo mudará na dinâmica do relacionamento deles. “O ideal é educar não só a mãe, mas o casal, sobre o que é o puerpério, os sentimentos esperados, o que deve suscitar a busca de ajuda”, aponta Mariana. 

Outra conversa importante é em relação ao lugar que o outro ocupa na vida da mulher. “Às vezes, a pessoa vai para uma posição de concorrência que nada tem a ver com o amor pelo bebê, mas que o coloca em um sentimento de segundo plano”, destaca Ana Carolina. “Não à toa, vemos um alto índice de divórcios no primeiro ano do bebê”, completa. 

Até por isso, além da sessões individuais e em grupo, é possível fazer essa terapia em casal. Alguns locais até fazem visitas domiciliares durante o puerpério, serviço que ficou comprometido durante a pandemia. Nesse período, aliás, cresceu a procura por consultas via telemedicina.

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