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Psicologia perinatal: entenda por que ela é tão importante para grávidas

A mudança que um bebê traz para a vida - mesmo quando não há grandes intercorrências - é um desafio que não pode ser, nem de longe, menosprezado

Por Da Redação
Atualizado em 1 set 2022, 14h59 - Publicado em 1 set 2022, 14h54

Para muitas mulheres, uma das maiores emoções da gravidez é o momento de descobrir o sexo do bebê no ultrassom. Quando o médico consegue ver e contar se quem está dentro da barriga é um menino ou uma menina, seja qual for o resultado, é uma felicidade, certo? Nem sempre. Com a fisioterapeuta Vanessa Zani, de Bauru (SP), a sensação foi diferente. “Eu sonhava em ter uma menina. Quando fiz o exame e vi que era um menino, meu mundo desabou. Passei a noite inteira em claro”, conta.

Vanessa mal conseguia falar sobre isso, nem mesmo com as pessoas mais próximas. Afinal, uma grávida esperando um bebê saudável deveria estar feliz e sorridente, independentemente do sexo da criança. É assim que a sociedade espera que seja e, caso algo saia da linha, vem o julgamento, a culpa, a sensação de inadequação. A simples menção de que você está sentindo algo diferente de uma alegria extrema pode ser entendida como um disparate, uma ofensa, uma ingratidão, quase um crime! E aí tudo vai se acumulando e se tornando uma verdadeira bola de neve. As emoções, boas e ruins, vão crescendo. Você não consegue conversar sobre elas com ninguém, começa a se sentir ainda pior e… A questão parece não ter fim.

“O ginecologista que me atendia dizia que eu estava com depressão gestacional, mas eu não queria tomar os remédios”, diz ela, lembrando que se sentia deprimida, apesar de não querer estar daquele jeito.

A história, porém, teve um rumo diferente quando a irmã de Vanessa, que é psicóloga, sugeriu que ela conversasse com uma psicóloga perinatal. Embora nunca tivesse ouvido falar da especialidade, ela queria entender o que estava acontecendo com a própria saúde mental em um momento tão especial de sua vida. Foi aí que a fisioterapeuta conseguiu falar, com transparência, sobre o que estava vivendo e pedir ajuda para decifrar aquilo tudo.

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“Na primeira sessão, ela já me abriu os olhos e revelou que o motivo pelo qual eu estava assim não era o sexo do bebê, o que já me aliviou bastante. Ela também fez alguns testes, que detectaram que meu nível de depressão era muito baixo e que aquilo nem poderia, de fato, ser considerado depressão”, relata. “No entanto, meus níveis de estresse e ansiedade estavam altos. Fiz a terapia do terceiro ao sétimo mês de gestação, que foi o que me salvou”, afirma. A futura mãe entendeu e conseguiu trabalhar as questões que, de fato, estavam afetando suas emoções e sua saúde mental. O sexo do bebê, por alguma razão, se tornou o alvo, mas as causas eram outras, muito além disso.

O caso de Vanessa é um, entre tantos, que pode ser analisado, identificado e tratado com ajuda da psicologia perinatal. “A psicologia perinatal é uma área que estuda os fenômenos psicológicos envolvidos na gestação, no parto e no pós-parto, explica a psicóloga e professora Rafaela Schiavo, autora de centenas de trabalhos científicos sobre saúde mental materna e uma das principais especialistas no assunto do país. “Toda gestante pode fazer. E não necessariamente só elas. A psicologia perinatal atende quem está em fase de planejamento familiar, reprodução assistida, adoção, desenvolvimento do bebê, o pai, os avós…”, diz.

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Na verdade, não é preciso ter algum problema para buscar esse tipo de atendimento ou orientação. “Dentro da psicologia perinatal, trabalhamos tanto na prevenção quanto na intervenção. A intervenção é quando já há algum conflito em relação a essa transição para a parentalidade. Na prevenção, não há problema, sofrimento psíquico. É o caso do pré-natal psicológico”, afirma.

Pré-natal psicológico: o que é?

O pré-natal psicológico (feito individualmente ou em grupo) é uma forma preventiva, mesmo para quem não está em conflito, mas deseja se preparar e se entender, antes da maternidade ou da paternidade. Em algumas sessões, o profissional consegue identificar se a mulher tem ou não fatores de risco e, em caso positivo, é possível fazer a intervenção antes de o problema “explodir”.

Colocar prótese de silicone: Antes ou depois da gravidez?
(Adene Sanchez/Getty Images)

Assim como a rotina de consultas com o obstetra e os exames, o pré-natal psicológico deveria ser acessível a todas as mulheres, entretanto essa não é a realidade. “Infelizmente, isso ainda não existe como política pública”, diz Rafaela. Pelo menos, não em todas as regiões do Brasil. O projeto de lei 98/2018, que tem o objetivo de tornar obrigatória a avaliação psicológica de gestantes e puérperas em território nacional, tramita na Câmara dos Deputados, mas, por enquanto, não foi aprovado.

As questões tratadas na psicologia perinatal

São várias as situações de conflito que levam as famílias a buscar a psicologia perinatal. Segundo a especialista, as mais frequentes são:

Sobre o último tópico, a psicóloga explica: “Não é nem uma questão de que a mulher não consegue criar vínculo com o bebê, mas com as tarefas que a maternidade impõe. É um luto, na verdade, referente a essa transformação.”

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Especialidade pouco conhecida

Apesar de ter ganhado um holofote maior durante a pandemia, quando diversos profissionais acabaram usando ainda mais as redes sociais para divulgar seus serviços e atender pacientes online, a psicologia perinatal ainda é pouco conhecida. Muitas grávidas, mães e pais não sabem que existe uma área focada nesse assunto.

“Na verdade, há muitos psicólogos que não sabem”, afirma Rafaela. “Existem cerca de 2 mil psicólogos perinatais no Brasil e temos mais de 450 mil psicólogos com o CRP ativo [registrados nos Conselhos Regionais de Psicologia]. Isso é menos de 1%”, destaca.

Como são as sessões de psicologia perinatal?

Existem várias formas de atendimento, para diferentes casos. Há aquelas em grupo, muito comuns no pré-natal psicológico, com as rodas de gestantes e pais. Há sessões de casais, de família, individuais… De acordo com a especialista, o número de consultas varia conforme o profissional, o paciente e a situação.

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“Geralmente, atendemos uma vez por semana, por cinquenta minutos, trabalhando com técnica de psicoterapia breve. Isso porque a maior parte das queixas precisa ser trabalhada durante a gravidez. Não dá para esperar o bebê nascer”, explica Rafaela. “Mas não são todos os casos. Uma mulher que tenha um quadro de depressão perinatal muito grave, por exemplo, precisa de outro tipo de tratamento e de frequência”, pontua.

Um apoio, quando não há rede

Uma característica da sociedade contemporânea é o fato de que as pessoas vivem cada vez mais isoladas. Antes, quando uma mãe dava à luz, ela contava com a família por perto, com as mulheres mais experientes, com um entorno. Agora, é cada um dentro da sua casa, engolindo os próprios problemas e as próprias dúvidas – com a obrigação de resolver e entender tudo a sós.

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Nesse sentido, a psicologia perinatal pode também ser um apoio em momentos difíceis. “Se alguém sentir que está em sofrimento psíquico no período de gestação, parto e pós-parto, não precisa se sentir envergonhada, acuada, com medo de ir em busca de ajuda. Ela pode recorrer. O profissional não está ali para julgar. Pelo contrário: ele está preparado para lidar com as situações nas quais, muitas vezes, a sociedade julgaria”, finaliza Rafaela.

Foi assim com Vanessa. Matheus já completou 10 anos e, agora, ela trata do assunto sorrindo. A fisioterapeuta conta que, inclusive, conversa normalmente com o filho sobre o que aconteceu durante o período da gestação e afirma, com toda a certeza do mundo: “Nem imagino uma menina no lugar dele hoje.”

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