Saiba o que fazer se o seu filho for diagnosticado com obesidade infantil

Tenha em mente que a meta é alcançar uma vida mais saudável a longo prazo e não a perda de peso imediata da criança.

Por Manuela Macagnan
Atualizado em 21 set 2021, 09h50 - Publicado em 17 set 2021, 14h59
Mão de criança alcançando cupcake
 (Catherine Falls Commercial/Getty Images)
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Você sabia que a obesidade infantil afeta 3,1 milhões de crianças menores de 10 anos no Brasil? Este é um dado do Ministério da Saúde e, para falar sobre este assunto, já começamos com uma dica: pense que, quanto mais cedo o seu filho adquirir bons hábitos, mais fácil será ter uma vida saudável quando adulto. Se eles começarem ainda dentro da barriga, durante a gravidez, tanto melhor. Se não deu, não tem problema. Nunca é tarde para desenvolver uma nova rotina.

“Parece uma equação fácil de resolver: o que você come e não queima, acumula. Mas, na verdade, é muito mais complexo”, aponta Rubens Feferbaum, pediatra, nutrólogo e presidente do Departamento de Nutrição da Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP).

A obesidade infantil é um dos dilemas nutricionais cada vez mais prevalentes entre crianças nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, que aumentou ainda mais no período de quarentena por conta das mudanças na rotina e o impacto psicológico que o confinamento teve nas famílias. Um estudo recente publicado no periódico médico JAMA constatou um aumento da obesidade principalmente entre as crianças de 5 a 11 anos de idade, no período de 2019 a 2021.

Este ano, portanto, a campanha Setembro Laranja, criada pela Sociedade de Pediatria de São Paulo, é ainda mais necessária para que pais, cuidadores, escolas e médicos tenham informação, conhecimento, orientação e conduta para auxiliar as crianças neste quadro.

Mas afinal, por que as crianças estão engordando?

“Esta é a pergunta de um milhão de dólares”, brinca o pediatra. E explica: “Não é uma questão simples, como dizer para a criança não comer doces ou não ficar muito tempo em frente às telas. É muito mais complexo, tem muitos fatores relacionados: o ganho ponderal e multifatorial; genética; condições intra-útero, qual era o peso e o índice de massa corpórea da mulher quando engravidou; se a criança teve aleitamento materno (e por quanto tempo); como a família encara as questões nutricionais,; como é o estilo de vida dessa criança, se ela faz exercícios físicos – uma criança de 2, 3 anos, precisa se movimentar para queimar energia. É uma questão que envolve família e escola”.

Lidar com o sobrepeso infantil é uma tarefa conjunta, em que a conscientização precisa ser feita por todos ao redor da criança, já que é uma questão que pode levar a graves consequências para a saúde no futuro. “Já existem estudos que apontam que, em 2050, não haverá vagas em hospitais para doenças em decorrência da obesidade, como diabetes, hipertensão e alguns tipos de cânceres. Temos que pensar na saúde do futuro cidadão, mas não é simples”, completa Feferbaum.

Como saber se o meu filho está acima do peso?

Primeiro, vale entender a diferença entra sobrepeso e obesidade. Os pediatras usam as curvas da OMS e o z escore (estatística que mostra a pontuação padrão). De menos um até um é eutrofia (dentro do esperado), de 1 a 2 sobrepeso e de 2 a 3 obesidade. Acima de 3, é obesidade grave.

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Se você tem uma criança que pode estar com sobrepeso, o primeiro passo é marcar uma consulta com o pediatra. “O diagnóstico é clínico, baseado em exames físicos e nos dados antropométricos (altura, peso, índice de massa corpórea) e ver a correlação nos gráficos, que vão mostrar se a criança está com o peso adequado ou não”, explica Martha Mattos, pediatra do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Vale lembrar que apenas o IMC da criança não diz muito, pois ela está em crescimento e, justamente por isso, é tão importante ter a curva de crescimento para acompanhar.

Todas as vezes que o pequeno for ao consultório do pediatra, ele deve ser pesado, medido, deve-se medir a circunferência abdominal e aferir a pressão arterial. “A curva demonstra a situação da criança: se ela está bem, se ela está se mantendo dentro do crescimento ou se ela está desacelerando ou acelerando. Para completar, o exame físico é importante porque a gente vai ver alguns sinais quando existem problemas”, ensina Martha.

Obesidade diagnosticada: por onde começar

família jantando no restaurante
(photobac/Envato)

Basicamente, sendo o exemplo. “É fundamental que os pais compreendam que são um modelo para a criança e seu envolvimento nas mudanças é peça-chave no processo. Além disso, o foco deve ser na mudança de estilo de vida, de forma a se alcançar uma rotina mais saudável a longo prazo e não a perda de peso imediata ou mudança na imagem corporal”, orienta Mariana Pimentel Pádua do Lago, psiquiatra do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo.

Os hábitos de uma vida saudável incluem a prática de exercícios físicos, um ambiente adequado durante as refeições familiares, alimentação variada, baseada em refeições (e não lanches), evitar alimentos de baixo valor nutricional, além de uma adequada rotina e higiene do sono, uma vez que poucas horas dormindo ou rotinas irregulares estão associadas à obesidade.

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Uma dica da psiquiatra Mariana é estabelecer metas de comportamentos saudáveis e não uma meta de peso em si. Combine com a criança um reconhecimento positivo, caso cumpra os combinados, como uma atividade bacana que ela queira fazer, mas nunca recompense com alimentos.

E, por fim, ofereça um ambiente de suporte, que proteja a autoestima da criança perante a estigmatização do sobrepeso, enquanto auxilia na escolha de alimentos mais saudáveis de forma não punitiva. “É importante também que não se adote uma postura crítica ou deposite uma pressão inadequada na criança. Evitar provocações sobre o peso, bem como comentários que foquem nos quilos ou na forma corporal, mesmo que formulados como elogios ou relacionados a outras pessoas que não a criança”, assinala a psiquiatra Mariana.

Os riscos por estar acima do peso

“Do ponto de vista psicossocial, o sobrepeso e a obesidade estão relacionados à queda na qualidade de vida em crianças e adolescentes, baixa autoestima, maior propensão a sofrer discriminação entre pares, maiores taxas de transtornos alimentares, além de transtornos ansiosos e depressivos. Muitos jovens, particularmente do sexo feminino, podem desenvolver percepção de autoimagem negativa, que persiste na vida adulta. Indivíduos obesos desde a infância também apresentam mais dificuldades no convívio social, relacionamentos amorosos e  profissionais”, salienta a psiquiatra.

Os problemas de saúde mais comuns quando há sobrepeso são, de acordo com a pediatra Martha, hipertensão e diabete tipo 2. “Existe também o risco de desenvolver doenças cardiovasculares, infartos e derrames, além de implicações ortopédica, como dores nos joelhos, no quadril, alguns na coluna pelo excesso de peso; problemas dermatológicos, como dermatites; apneia do sono; restrição ventilatória; dificuldade pra fazer atividade física; refluxo gastroesofágico e distúrbios que podem levar à puberdade precoce”, exemplifica a pediatra.

Como evitar o agravamento do sobrepeso infantil

Os bons hábitos devem começar o quanto antes, de preferência antes de a mulher engravidar. Faça o pré-natal com muita atenção, cuide do seu peso, tenha uma alimentação balanceada e pratique alguma atividade física – sempre seguindo a orientação do seu médico.

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Depois que o bebê nascer, saiba que não existe alimento melhor até os seis meses do que o leite materno. “Um dos fatores que pode desencadear doenças crônicas, como a obesidade, é a retirada do leite materno (ou de uma fórmula infantil que seja semelhante ao leite materno para a faixa etária) e começar a introdução alimentar precoce. Pode desencadear obesidade porque você vai oferecer nutrientes que não teria necessidade de fornecer nesta faixa etária”, explica Raquel dos Santos, nutricionista do Hospital São Vicente de Paulo de Passo Fundo (RS), pós-graduanda em materno infantil. “Caso a mãe não tenha leite materno ou, por algum motivo, não possa amamentar e faça uso de fórmula infantil, não precisa acrescentar açúcar ou complementos (como achocolatados) ao leite. Água e chá também não são necessários até os 6 meses”, completa.

A partir dos 6 meses, começa a introdução alimentar e a nutricionista indica: “Não ofereça alimentos liquidificados, é importante que esteja amassadinhos (com o garfo mesmo) e separado, para que o bebê possa sentir o sabor de cada alimento e evite também misturar tudo no prato. Mantenha este padrão até o primeiro aninho, depois pode ir modificando a consistência até chegar ao que é a alimentação da família”.

criança sentada em uma cadeira de alimentação comendo uma fruta que está sobre a mesa acoplada no acessório
(D-BASE/Getty Images)

Cada passo é importante!

Em agosto de 2021, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, anunciou a destinação de R$ 90 milhões para fortalecer o cuidado e a nutrição dos pequenos, pois o Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (Enani) revelou que 7% das crianças brasileiras menores de 5 anos estão com excesso de peso e 3% estão obesas.

“O sobrepeso infantil só vai ser impactante na vida adulta se a criança se mantiver nesta situação, mas a maioria que busca tratamento, responde muito bem. Elas normalizam os exames, normalizam o ultrassom com gordura no fígado e têm uma resposta maravilhosa”, indica a pediatra Martha.

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Para ela, a receita do sucesso é uma equipe multidisciplinar, com nutricionista, psicólogo, dentista, endocrinologista, pediatra, psiquiatra. “O importante é manter a aderência da família, que todos saibam que estamos investindo na saúde desta criança”, diz. Além disso, é indispensável validar cada conquista para estimular a criança e a família.

E por fim, não se cobre tanto. O assunto é sério e precisa ser enfrentado, mas estamos vivendo um tempo difícil, com muitas perdas e medos. “É preciso salientar que temos 15 milhões de desempregados, tivemos perda de poder aquisitivo, a conta no mercado subiu, o Brasil voltou ao mapa da fome”, alerta o pediatra Feferbaum.

Por isso, converse com o pequeno com calma, crie uma rotina saudável e, principalmente, possível. Procure ajuda, marque uma consulta com o pediatra. Tudo bem se os resultados não forem um sucesso logo de cara. “As crianças vão conseguir. Cada uma no seu tempo, não precisa pressa”, indica a pediatra Martha. E sempre vale lembrar: a obesidade também pode ser indício de que o emocional da criança precisa de amparo, por isso, olhe para este quadro com atenção e, principalmente, acolhimento.

Anote estas dicas:

– Seja o exemplo e tenha uma rotina saudável
– Desde a introdução alimentar, foque na hora do papá: nada de distração! Lembre-se que ele precisa de atenção, pois está conhecendo os alimentos, os sabores e as texturas
– Diminua ao máximo o tempo que a criança fica em frente às telas enquanto come
– Estimule o pequeno a brincar, correr, gastar energia
– As refeições principais devem ser feitas à mesa, com calma e tranquilidade
– Deixe a criança participar do preparo: lavar frutas, ajudar a montar o sanduíche para merenda, auxiliar na receita de bolo
– A criança precisa de rotina: horário para comer, para dormir, para tomar sol
– Incentive a criança a mastigar devagar, não engolir nada inteiro. Isso faz com que ela se sinta saciada e melhora a função intestinal
– Evite líquidos durante as refeições. Espere de 30 minutos a uma hora antes ou depois das refeições para oferecer líquidos e sempre dê preferência para água
– Tente não oferecer sucos em pó ou em caixinha, bolachas recheadas, salgadinhos
– Não substitua as principais refeições por lanches
– Leve o pequeno ao pediatra regularmente

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