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Como lidar com a ansiedade de separação na volta às aulas

Não só para crianças que retomam a socialização, a saída do isolamento também pode ser complicada para pais que criaram uma rotina mais próxima dos filhos.

Por Ketlyn Araujo
Atualizado em 30 jul 2021, 20h09 - Publicado em 30 jul 2021, 19h52

Foram necessários quase dois anos para que a pandemia de coronavírus começasse a dar os primeiros sinais de recuo em diversas partes do mundo. Apesar de o vírus e suas variantes ainda estarem em circulação (e, pelo menos por enquanto, longe de serem erradicados), o avanço da vacinação em escala global e o sucesso das medidas sanitárias e de isolamento em alguns países fizeram com que, de maneira geral, pudéssemos enxergar luz no fim do túnel e, consequentemente, uma escalada gradual à normalidade.

Um dos primeiros passos para isso é a retomada das aulas presenciais, levando em consideração que as crianças permanecem como grupo de menor risco de morte e internações por Covid. No aspecto psicológico, entretanto, a volta do ensino in loco pode desencadear uma série sentimentos relacionados à ansiedade de separação, tanto para os pequenos quanto para pais e responsáveis.

“Essa é uma situação nova para todos nós. Assim como vivenciar o início e a duração do isolamento social foi um período marcado por desafios, também será a retomada aos hábitos pré-pandêmicos”, diz a psicóloga Tainara Lazanha, que enxerga ser importante não cairmos na ideia de que vamos voltar ao normal como se nada tivesse acontecido.

“Além de encararmos a realidade, temos de pensar que ela mudou completamente a forma como nós nos relacionamos e vivemos o mundo. Nesse sentido, as crianças vão vivenciar a separação do meio familiar, sendo necessária essa adaptação a uma série de novas exigências do meio social e intelectual”, completa a especialista.

Como fazer, então, para que o período não desperte um comportamento de agressividade, negação ou frustração nos pequenos, ao passo que pode fazer com que pais e responsáveis sofram com o medo da quebra do vínculo criado durante o isolamento? Ouvimos especialistas na intenção de acalmar o coração dos menores – e o seu também.

Atente-se aos comportamentos da criança e, antes de julgá-los, converse com ela

Antes de mais nada, é importante que pais e responsáveis fiquem atentos aos comportamentos dos filhos sobre a volta às aulas, sem deixar que os próprios medos se transformem em aflições ainda inexistentes neste indivíduo em formação.

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“Uma criança que sempre foi insegura pode ter essa característica intensificada durante a pandemia, o que é natural. Mas é preciso se preocupar com os casos nos quais há uma mudança comportamental”, aponta a psicóloga Thalita Nobre, do Grupo Prontobaby. Um exemplo são crianças extrovertidas e independentes, mas que na fase pós-pandêmica apresentam dificuldades de ficarem sozinhas, além de desconforto generalizado quando estão longe dos pais. O melhor a fazer, caso isso aconteça, é deixar que ela fale sobre suas angústias, sem menosprezá-las.

Aline Hanna, psicóloga da Eurekka Med, reforça o quanto o diálogo é fundamental para acalmar as aflições. É preciso que pais e responsáveis sentem para conversar com o pequeno, explicando sobre a importância do espaço escolar e da convivência com outros coleguinhas, e que isso é algo natural, ou seja, faz parte de qualquer infância.

“O diálogo deve ser adequado à faixa etária, mantendo uma postura realista – porém, acolhedora – da situação. Comportamentos de estranhamento podem ser esperados, já que ela estava acostumada a ficar reclusa em casa em um contexto em que o mundo exterior se estabeleceu como um lugar perigoso, hostil e desagradável. Essa criança precisa, portanto, que os pais promovam segurança e independência, para que possa gerir seus sentimentos da melhor forma”, reforça Tainara.

Medidas práticas ajudam a lidar melhor com a situação

Além do diálogo e da escuta ativa, ações mais práticas também podem ser tomadas para tornar o momento pós-pandemia menos complicado para crianças que não parecem aceitar tão bem a situação.

Tainara sugere, neste sentido, que pais estimulem os filhos a saírem de casa aos poucos, seja para dar uma volta na rua – de máscara e mantendo o distaciamento, claro-, fazer um passeio pelo bairro ou, até mesmo, explorar a fachada da escola: apesar de simples, o ato pode ajudar o pequeno a se acostumar a ver pessoas diferentes dos membros da família, se aproximando da ideia de voltar para as aulas presenciais.

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Já no decorrer do semestre, é essencial que o adulto acompanhe o rendimento nas aulas, para que ela não se sinta desamparada devido à mudança brusca da rotina e, caso necessário, receba apoio profissional apropriado.

Outra ação que costuma dar certo é incentivar a criança a ocupar o tempo livre com práticas que a façam driblar a sensação de ansiedade de separação. Ajude-a encontrar hobbies dos quais ela gosta – sejam esportes, atividades artísticas ou leitura – e ofereça as ferramentas para que ela possa se distrair e se desenvolver mesmo quando não estiver com os pais.

Não se desespere em caso de birra ou agressividade

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(gahsoon/Getty Images)

Como as profissionais já citaram, o medo apresentado pelos menores é algo mais do que compreensível frente a uma nova situação, e o sentimento pode, inclusive, se transformar em comportamentos agressivos e reativos.

Para lidar com a birra ou a negação, é importante mais uma vez escutar a criança, e não focar em repreendê-la, mas sim em compreendê-la. O ideal, fala Tainara, é validar os sentimentos dela ao mesmo tempo em que os explica e a orienta, tratando a situação com acolhimento, firmeza e correção. Dessa maneira, ela terá maiores condições de entender o que está acontecendo e o que pode ou não fazer.

“Em resumo, é preciso ter paciência e amor. Crianças foram forçadas pelas circunstâncias a lidarem com a dura realidade da morte, da doença e de problemas do ‘mundo dos adultos’, em uma fase da vida onde tudo costuma ser fantasioso. Provavelmente esses eventos marcarão a vida delas, que podem se tornar adultos com medo de viver em diversas situações. Por isso, é essencial ressaltar que não se deve reforçar que os pequenos desenvolvam medos ou receios capazes de extrapolar o limite do saudável”, explica a psicóloga.

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Falar a verdade, explicando o motivo da sua ausência, mostrar segurança frente à separação, mediante atitudes positivas durante despedidas, e dar tempo para que seu filho se adapte às mudanças, falam as especialistas, é igualmente relevante.

Se isso não adiantar, tente conversar com o colégio para implementar uma retomada gradual, talvez com dias ou horários alternados que vão auxiliar no processo de adaptação. Já se a mudança de comportamento perdurar ou passar a prejudicar o pequeno em larga escala, é essencial que a família procure por ajuda de um bom profissional focado em saúde mental. Além de causar sofrimento, a ansiedade de separação pode desencadear outros transtornos sérios, como depressão e síndrome do pânico.

Entenda que o vínculo não será perdido

Não são apenas as crianças que podem apresentar medo e ansiedade mediante à volta às aulas nesta fase da pandemia: adultos também tendem a ver a separação como desafio, seja pelo receio da contaminação ainda presente, seja pela ilusão de que o vínculo afetivo construído durante o isolamento social será perdido.

Para lidar com as aflições que, segundo Tainara, fazem total sentido, é preciso considerar todos os recortes da realidade existentes, para que possamos refletir sobre a situação da criança voltar à escola. O risco do contágio, não dá para negar, ainda vai existir – mas desta vez de maneira muito mais controlada.

Ela pontua, ainda, que a proximidade com os filhos não tem necessariamente a ver com as horas que se passam juntos, mas sim com a qualidade desse tempo. Os pais devem ter em mente, portanto, que uma relação saudável sempre foi possível sem o isolamento social, e que esses pensamentos que geram medo podem dizer muito mais sobre a ansiedade em enfrentar uma nova situação do que, de fato, sobre a perda da proximidade.

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“É importante aceitar que a mudança já aconteceu, e o que nos resta é lidar com ela: a intimidade não será necessariamente perdida, mas pode ser adaptada para as outras demandas da rotina”, afirma.

De maneira mais palpável, Aline sugere atenção especial para que o tempo livre que os pais tiverem com os filhos seja melhor aproveitado, seja nos finais de semana ou no dia a dia, como durante as refeições, hora do banho ou de dormir. Criar eventos e ocasiões especiais em datas “comuns”, na intenção de tornar esses momentos memórias afetivas, além de controlar o tempo de exposição às telas – dos adultos e das crianças – costuma ser um bom ponto de partida.

No mais, lembre-se de que o período de volta às aulas é capaz de proporcionar aos pais uma boa oportunidade para que desfrutem da própria individualidade e independência, desempenhando atividades que não estão ligadas à parentalidade. Já para os pequenos, a escola é o espaço responsável pelo desenvolvimento das habilidades sociais, cognitivas e emocionais, e isso deve ser sempre valorizado.

Aceite o “luto” da separação e transforme a rotina

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(Morsa Images/Getty Images)

Na opinião das especialistas, para que os pais possam passar pelo momento de ruptura de forma mais branda, é essencial entender que eles talvez vivenciem uma espécie de “luto” pelo final desta fase de maior contato familiar, o que pode levar a sentimentos de negação, raiva ou tristeza. Esse processo, apesar de complicado, é natural e esperado, e todas essas emoções devem ser abraçadas, desde que não persistam por muitas semanas ou em uma intensidade que prejudique a convivência familiar – nesse caso, é preciso procurar ajuda.

Para pais de filhos pequenos que acompanharam de perto o desenvolvimento do bebê ou da criança, por exemplo, o momento pós-pandemia, levando em conta aspectos positivos, os torna capazes de entenderem melhor quais estímulos que funcionam para seus rebentos, bem como quais dificuldades elas podem apresentar no futuro. Já os maiores, graças à volta à normalidade, agora poderão explorar o mundo fora de casa, sem que se esqueçam ou desvalorizem o que vivenciaram durante o isolamento ao lado da família.

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A partir de conversas e acordos com as crianças, é possível que pais estabeleçam uma rotina familiar, útil não apenas para preservar a proximidade já consolidada, mas também para organizar o dia a dia familiar de maneira geral, sugere Tainara.

“Por um olhar mais otimista, podemos refletir que para nós, adultos, essa situação é nova porque sabemos que não costuma ser assim que vivenciamos a escola. Porém, para as crianças, o normal é o que elas estão vivendo nesse momento. Claro que existem muitos pontos adversos e dificuldades que precisam ser cuidadas de perto pelos pais, profissionais da educação, saúde e sociedade em geral, mas muitas vezes subestimamos a capacidade de adaptação dos pequenos. O que se pode fazer, em suma, é buscar cuidar da saúde mental, flexibilizar-se em maneiras de passar por essas mudanças e se preparar para o novo”, finaliza ela.

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