Crianças portadoras de discalculia apresentam dificuldade ou incapacidade de entender conceitos relacionados aos números. Símbolos, operações matemáticas, valores de moeda e sequências numéricas são confusos para o indivíduo. “Isso o afeta tanto no ambiente escolar quanto no cotidiano”, diz a psicóloga clínica Vanessa Gebrim.
O transtorno prejudica o raciocínio lógico, bem como o processamento de informações. Naturalmente, a criança enfrentará obstáculos para se adaptar a estímulos considerados “normais” do aprendizado, sentindo-se diferente dos colegas de turma. “Pode resultar em um maior isolamento, dificuldade de socialização, sensação de vergonha ou culpa”, conta a médica psiquiatra Jessica Martani.
Inseguranças durante a principal fase de formação da personalidade são bastante prejudiciais. Estimulam a construção de um indivíduo com a autoimagem e a autoestima fragilizadas, capaz de desenvolver doenças como ansiedade e depressão. “Quanto mais precoce o diagnóstico da discalculia, melhor o prognóstico (o provável resultado do tratamento)”, diz Jéssica.
A seguir, reunimos informações fundamentais sobre o transtorno e ferramentas para que a criança consiga se adaptar.
O que é discalculia?
A discalculia é um transtorno que causa prejuízo na aprendizagem da matemática. A criança tem dificuldade em pensar, refletir, avaliar e raciocinar diante de atividades relacionadas ao senso numérico. Tal como memorização de fatos aritméticos, precisão e fluência do cálculo. “O desenvolvimento matemático de quem tem discalculia é significativamente menor do que o esperado”, explica Sueli Conte, psicóloga, mestre em educação e neurociências e terapeuta de Barras de Acess.
O transtorno de aprendizagem geralmente se manifesta em crianças, pois elas estão em idade escolar. Os sintomas começam a aparecer entre 4 e 5 anos de idade, ainda na educação infantil. No entanto, o diagnóstico costuma ser feito por volta dos 7 anos. “É quando ela é apresentada a conceitos mais complexos de matemática”, diz Vanessa.
Os tipos de discalculia
É possível classificar a discalculia como leve, moderada ou grave, e em tipos diferentes. “Os profissionais fazem o diagnóstico de acordo com a intensidade do transtorno e a facilidade de avanço no tratamento”, explica a psicóloga.
- Discalculia Verbal: a criança tem dificuldade para entender os conceitos matemáticos que são falados
- Discalculia Practognóstica: a criança tem dificuldade para enumerar, comparar e quantificar
- Discalculia Léxica: a criança tem dificuldade em ler números e símbolos
- Discalculia Gráfica: a criança tem dificuldade em escrever, copiar ou reproduzir símbolos matemáticos
- Discalculia Ideognóstica: a criança tem dificuldade em fazer cálculos mentais e a relação entre os algarismos
- Discalculia Operacional: a criança tem dificuldade em realizar as operações matemáticas
O que causa a discalculia?
Crianças com discalculia apresentam disfunções em conexões neurais específicas, que as impossibilitam de acessar informações numéricas e fazer a representação mental dos números. “Suas redes de conexão neural usam rotas alternativas que uma pessoa sem o transtorno não utiliza”, explica Vanessa. A decodificação numérica se torna mais difícil e afeta a compreensão de tarefas ou problemas de matemática.
Existem outras possíveis causas relacionadas a distúrbios cerebrais de desenvolvimento e problemas na maturação das estruturas do cérebro. “Isso pode ocorrer devido a doenças durante a gestação ou mesmo ao uso de medicamentos e álcool no período da gravidez”, complementa Jessica.
Como a discalculia afeta a criança na escola?
São várias as maneiras como a discalculia prejudica o aprendizado. “E isso se transforma à medida que a criança cresce”, explica Sueli. Durante a Educação Infantil, ela pode apresentar dificuldade para aprender a contar (especialmente de trás para a frente), reconhecer padrões simples, distinguir qual é o número maior, entender o significado dos numerais e o conceito de numeração.
No Ensino Fundamental, a dificuldade se estende para aprender e recordar as expressões numéricas, para lembrar o placar de jogos, calcular o preço total de itens, entender ou associar um número com uma palavra (por exemplo, 3 e três), além do uso excessivo dos dedos para contar.
Por fim, no Ensino Médio, informações de tabelas e gráficos podem ser difíceis de se compreender, assim como a contagem do troco ou de gorjetas, a quantidade de ingredientes de uma receita e os cálculos de velocidade, distância e direção. “O adolescente acaba evitando situações que necessitam da compreensão de números e atividades que envolvem a matemática”, diz Vanessa.
Como saber se meu filho tem discalculia?
Os pais devem acompanhar o desenvolvimento do filho na escola e perceber se há grandes dificuldades em aprender matemática. Enquanto isso, o professor precisa observar e comunicar se a criança apresenta resistência em aprender a contar, por exemplo. “Sofrimento ao entender a matéria e desestímulo para fazer as atividades em casa podem ser sinais de discalculia”, afirma Sueli.
Diagnóstico da discalculia
O diagnóstico da discalculia é clínico e feito mediante a avaliação e caracterização dos sintomas que aparecem na vida da criança. Como o transtorno pode estar ligado a outros, a análise de psicopedagogos, neuropediatras e psicólogos é imprescindível para definir quais avaliações devem ser aplicadas.
“É o conjunto de testes direcionados que levarão ao diagnóstico correto”, explica a psicóloga. O processo exige paciência. Com o suporte adequado, a criança poderá enfrentar as dificuldades.
Tratamento para discalculia
A discalculia não tem cura. Mas com o tratamento adequado é possível melhorar o quadro. A intervenção é feita com exercícios e atividades que ajudam a estimular o processamento da linguagem numérica. “A Neurociência desenvolveu vários jogos que permitem avaliar os déficits de atenção”, conta Sueli.
Cada criança deve ser analisada para que os profissionais iniciem o tratamento com participações interativas, jogos e brincadeiras. “Por isso, o diagnóstico precoce é tão importante. Para que haja um trabalho eficaz e concentrado nas áreas de aprendizagem”, complementa.