Ansiedade em crianças: conheça os sinais e saiba como lidar com a questão
Assim como outros problemas de saúde mental, os diagnósticos de ansiedade infantil aumentaram com a pandemia
A preocupação com a saúde mental infantil já vinha aumentando, mas deu um salto durante a pandemia de Covid-19. De acordo com uma pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP), nesse período, uma a cada quatro crianças apresentou ansiedade e depressão com níveis clínicos, ou seja, a ponto de precisar da intervenção de especialistas. O crescimento da taxa está relacionado ao isolamento social, ao fechamento das escolas, ao medo da doença, ao maior tempo de uso das telas e, sobretudo, das redes sociais, entre outros fatores.
“A pandemia trouxe mudanças drásticas para a vida das crianças, que foram privadas do contato social, vivenciaram preocupações e incertezas, ficaram mais expostas às redes sociais e fizeram menos atividades físicas. Esse cenário favoreceu o aumento da ansiedade nelas e também nos adolescentes”, explica a psiquiatra Juliana Cavalsan, de São Paulo (SP).
Ansiedade infantil: o que é?
A ansiedade, segundo a especialista, é um transtorno mental caracterizado por preocupações excessivas, medos desproporcionais e pela sensação de estar sempre em alerta. É muito comum que essas emoções sejam acompanhadas também da presença de sintomas físicos, como dor de estômago, dor de cabeça, ranger de dentes e mania de roer as unhas. Pode afetar crianças de todas as idades e causar sofrimento intenso.
“Quando não há tratamento efetivo, o problema tende a piorar com o tempo”, aponta a psiquiatra. “Com isso, aumenta a chance de a criança desenvolver outros transtornos mentais, como depressão. As crianças ansiosas sem tratamento têm mais dificuldade nas interações sociais e no desempenho escolar, o que causa consequências devastadoras na autoestima”, diz.
Ansioso por quê?
A pandemia, vale lembrar, não é a única causa do problema. Afinal, antes dela, as crianças já eram impactadas por ele. As razões, de acordo com a médica, são multifatoriais, ou seja, é possível haver diversos motivos, combinados entre si ou não. “O ambiente tem um papel muito importante e pode ser tanto protetor como desencadeador para a ansiedade”, afirma. Isso explica, em grande parte, o aumento de casos na pandemia. Mas há ainda um componente genético. “É comum que os pais também sejam ansiosos. Boa parte das vezes, a ansiedade no adulto começa já na infância dele”, pontua. Ou seja, é importante olhar para si, para poder ajudar seu filho.
De ansioso, todo mundo tem um pouco
Embora a preocupação com a questão tenha crescido bastante (e isso é um sinal de que a informação tem tido um alcance maior, o que é muito bom), é preciso ponderar. Nem sempre a ansiedade significa uma doença ou tem uma necessidade de tratamento e até de medicação.
“É absolutamente normal algum grau de ansiedade para todo mundo e, com as crianças não é diferente”, afirma a psiquiatra. Você não precisa se preocupar caso seu filho tenha certa dificuldade de pegar no sono nos dias que antecedem um evento esperado, como a festa de aniversário dele ou uma viagem, a chegada do Papai Noel ou um passeio com os amigos. “A ansiedade passa a ser um problema quando há impacto negativo na vida da criança”, diz Juliana.
Os sinais de alerta surgem quando o pequeno:
- Apresenta medos e preocupações desproporcionais para a idade;
- Tende a ter maior retraimento social;
- Se recusa a ir para a escola;
- Têm queda no rendimento escolar;
- Não consegue se expor, levantar a mão e tirar dúvidas durante as aulas;
- Apresenta mais dificuldade para dormir;
- Tem alteração no apetite, passando, de repente, a comer mais ou menos;
- Fica mais irritado;
- Se queixa de dores e tonturas;
- Passa a ranger os dentes e/ou roer as unhas.
Ansiedade por idade
A ansiedade, de acordo com a psiquiatra, pode aparecer em qualquer faixa etária, de maneiras diferentes em cada fase. Nos pequenos, por exemplo, é frequente a chamada ansiedade de separação, que é quando a criança fica muito desconfortável na ausência dos pais.
“Nesta faixa etária, também acontece o mutismo seletivo, que é quando a criança não fala em certas ocasiões, em certos ambientes ou perto de certas pessoas, e fobias específicas, como o medo excessivo de agulha, de trovão e de monstros”, exemplifica Juliana.
Com o passar dos anos, o transtorno de ansiedade generalizada, a fobia social e o transtorno de pânico passam a ser mais comuns. “A ansiedade generalizada é uma preocupação excessiva, é um estado sempre de alerta, junto com a dificuldade de relaxar”, explica a especialista. Já a fobia social é o desconforto extremo em situações de interação com outras pessoas. É mais frequente no início da adolescência. “O transtorno de pânico causa sintomas físicos intensos, como taquicardia, falta de ar e a sensação de morte iminente. Também é mais comum no início da adolescência”, afirma.
Como ajudar a criança a lidar com a ansiedade?
É possível amenizar o problema com algumas atitudes no dia a dia. O principal é oferecer para a criança um ambiente seguro. Auxiliar os pequenos, desde cedo, a nomear as próprias emoções ajuda a compreendê-las e, portanto, a lidar com elas de uma maneira mais tranquila. “Você pode providenciar atividades que ajudem a acalmar, como pintura, brincadeira com massinha e exercícios de respiração”, recomenda a especialista.
E que tal estimular os exercícios de respiração de forma lúdica? Proponha a atividade no meio de uma contação de história, por exemplo, pedindo para seu filho imaginar que está assoprando uma vela para expirar ou cheirando um buquê de flores para inspirar. Outra ideia é colocar um ursinho de pelúcia sobre a barriga dele, quando estiver deitado, pedir para a criança encher e esvaziar o ar da barriga e ver o brinquedo descer e subir. Solte a imaginação!
Fora isso, é preciso ajudar o pequeno, de maneira gradual, a enfrentar seus medos, expondo-o, devagar e controladamente, às situações que causam desconforto. Ele sente ansiedade em conviver com crianças que não conhece? Leve-o a um parque e, no início, brinque junto, apresentando-o a um grupo e propondo alguma atividade. Quando ele se sentir confortável, afaste-se e observe, sinalizando que sempre estará ali. Em uma próxima ocasião, você pode incentivar seu filho a ir sozinho e ficar apenas olhando e mostrando-se disponível, porém de longe. E assim vai. “Os pais precisam reconhecer as pequenas conquistas das crianças e parabenizá-las, assim fica mais fácil enfrentar os piores medos”, diz a psiquiatra.
Quando buscar ajuda médica
Aqui, é importante ponderar se as mudanças de comportamento estão afetando, de maneira prática, a vida da criança. “O ideal é, primeiro, conversar com o pediatra do seu filho para excluir causas orgânicas que justifiquem o surgimento dos sintomas. Caso seja excluída qualquer outra doença, a criança deverá ser encaminhada para tratamento psicoterápico e para avaliação psiquiátrica”, explica Juliana.
Em algumas situações, o tratamento psicoterápico ajuda a solucionar o problema. Em outras, remédios são prescritos, o que será avaliado na consulta psiquiátrica. “O uso de medicação é necessário nos casos de maior gravidade ou quando as medidas não farmacológicas, como psicoterapia, prática de atividades físicas e mudanças nos hábitos alimentares, forem insuficientes”, aponta a médica.