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OMS: Estudo aponta como propagandas de fórmula infantil influenciam pais

Um relatório divulgado pela Organização Mundial da Saúde analisou como práticas da indústria alimentícia infantil afetam a amamentação.

Por Isabelle Aradzenka
Atualizado em 23 fev 2022, 14h58 - Publicado em 23 fev 2022, 14h47

Podemos encontrá-las nas prateleiras dos mercados e farmácias, em anúncios pela internet e agora até em desafios do TikTok que viralizaram pelas redes sociais: as fórmulas infantis estão tão presentes no dia a dia dos pais – mesmo para aqueles que mantém a amamentação materna exclusiva – que só de mencionar o seu nome, a imagem da clássica latinha já surge à mente.

A forte presença do produto no nosso imaginário pode parecer uma simples eventualidade, mas não é exatamente isto que aponta um novo estudo divulgado, na quarta (23), pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em conjunto com o Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).

O relatório “Como o Marketing das Fórmulas Infantis Influencia nossas Decisões sobre Alimentação” entrevistou mais de 8.500 mães, pais e gestantes, além de profissionais da saúde, em 8 países diferentes (África do Sul, Bangladesh, China, Marrocos, México, Nigéria, Reino Unido e Vietnã) para avaliar de que maneira o marketing das empresas fabricantes de fórmulas infantis influencia diretamente no poder de escolha dos pais sobre a alimentação de seus filhos.

A pesquisa observou como a indústria de alimentos para bebês se vale de estratégias de promoção “antiéticas” e que infringem o Código Internacional de Comercialização de Substitutos do Leite Materno, de 1981, para difundir e potencializar o consumo de seus produtos. Hoje, este tipo de regulamentação promovida pelo Código da OMS existe apenas para o marketing de dois produtos: as fórmulas infantis e o tabaco.

“Este relatório mostra muito claramente que a comercialização de fórmulas infantis continua inaceitavelmente difundida, enganosa e agressiva. A regulamentação sobre marketing abusivo deve ser urgentemente adotada e aplicada para proteger a saúde das crianças”, afirmou Tedros Adhanom, diretor-geral da OMS em nota.

Ser um alvo da indústria é mais comum do que parece…

Você já passou por uma consulta com o pediatra e acabou recebendo amostras grátis, brindes e até recomendações específicas de marcas de fórmula infantil? Pois é, o relatório da OMS concluiu que mais de um terço das mães entrevistadas passaram por situações deste tipo e esta é apenas uma das inúmeras estratégias, estimadas em cerca de 55 bilhões de dólares, que foram adotadas pelo marketing das fabricantes.

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“O relatório observa que um grande número de profissionais de saúde em todos os países foi abordado pela indústria de fórmula e alimentação infantil para influenciar suas recomendações às novas mães com até mesmo comissões de vendas, impactando diretamente as escolhas de pais em relação à alimentação de seus filhos e filhas”, explica a OMS em nota.

Além disso, mais da metade dos entrevistados (51%) admite ter sido alvo das demais práticas enganosas adotadas pela indústria, bem como direcionamento online invasivo, promoção de redes de aconselhamento e linhas de ajuda patrocinadas, descontos, brindes gratuitos e difusão de mensagens falsas.

“Um fluxo contínuo de mensagens de marketing enganosa está reforçando mitos sobre amamentação e leite materno. Esses mitos incluem a necessidade da fórmula nos primeiros dias após o nascimento, que ingredientes específicos da fórmula infantil são comprovadamente capazes de melhorar o desenvolvimento ou a imunidade da criança, a percepção de que a fórmula mantém os bebês satisfeitos por mais tempo ou que a qualidade do leite materno diminui com o tempo”, detalha a OMS.

Amamentação x fórmula

latra de leite em pó
(Towfiqu Photography/Getty Images)

A preocupação das entidades com o marketing agressivo da indústria de alimentação infantil não é à toa. De acordo com o estudo, as taxas de venda de fórmula infantil no mundo mais que dobraram nos últimos 20 anos, enquanto as de aleitamento exclusivo cresceram quase que insignificantemente.

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“Não é surpresa que tenhamos que ter uma divulgação sobre estes produtos, mas tem algo que é diferente quando falamos das fórmulas. Antes de tudo, o marketing das fórmulas infantis tem um impacto direto na sobrevivência e na saúde das crianças e das mulheres. Ele afeta o acesso ao suporte e à informação adequada para que os pais tomem as suas decisões e explora as vulnerabilidades das crianças nos primeiros anos de vida para ganhos comerciais”, pontuou Nigel Rollins, pediatra pela OMS, em coletiva à imprensa, na quarta (23).

Além disso, a chefe de Saúde e Desenvolvimento Infantil da UNICEF China, Anuradha Narayan, também reforçou na coletiva que as mulheres são o alvo principal da indústria de fórmulas infantis e têm sido há décadas. “Este e outros estudos mostraram que muitas mulheres têm um grande desejo de amamentar, mas acabam não encontrando suporte adequado e se deparando com um marketing implacável. É nosso papel fazer com que elas encontrem informações corretas e ‘não compráveis’ para que possam tomar as suas próprias decisões”, afirmou.

Em vista disso, a Organização reforça no relatório que a amamentação na primeira hora após o nascimento, seguido do aleitamento exclusivo até os seis meses de idade e contínuo por até dois anos oferece inúmeros benefícios. Entre eles, uma poderosa linha de defesa contra todas as formas de má nutrição infantil, incluindo a desnutrição e a obesidade; atuação como uma primeira vacina para os bebês; e redução do risco futuro de a mulher desenvolver diabetes, obesidade e algumas formas de câncer.

Em conjunto com a UNICEF, A OMS utilizou os dados obtidos pela pesquisa para lançar um apelo aos órgãos governamentais responsáveis para que haja a fiscalização adequada das estratégias de marketing promovidas pela indústria de fórmulas infantis. Entre o pedido, podemos ressaltar:

  • “Proibição de alegações nutricionais e de saúde feitas pela indústria de fórmula infantil”;
  • “Proibir os profissionais de saúde de aceitar patrocínio de empresas que comercializam alimentos para bebês e crianças pequenas para bolsas de estudo, prêmios, subsídios, reuniões ou eventos”;
  • “Investimento em políticas públicas e programas de apoio ao aleitamento materno, incluindo licenças parentais remuneradas adequadas;
  • “Solicitar que a indústria se comprometa publicamente a cumprir integralmente o Código Internacional de Comercialização de Substitutos do Leite Materno”.
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