Volta às aulas: por que ainda não é momento de flexibilizar os protocolos
Mesmo com pais e professores vacinados, pediatras reforçam que medidas de segurança precisam ser mantidas, assim como atenção aos possíveis sintomas.
No segundo ano consecutivo em que vivenciamos a pandemia causada pela covid-19, o retorno presencial à escola ainda divide opiniões entre os pais. Enquanto que, de um lado, adultos repensaram a volta dos pequenos já no primeiro semestre devido a perdas no aprendizado e retorno ao trabalho presencial, há quem diga que os filhos só voltarão quando houver a vacinação em massa do país. Ouvindo os especialistas, a avaliação do cenário é quase um consenso entre a comunidade médica: as instituições deveriam ter sido as primeiras a serem reabertas.
“Independente de vacinação ou não, os danos à educação das crianças são enormes. No Brasil, ficamos discutindo muito a imunização, se as escolas têm ou não condições de reabrirem – e, claro que você deve voltar aos poucos com menos alunos, distanciamento, máscara, ou seja, protocolos -, mas deveríamos ter retornado há muito tempo”, defende o pediatra Renato Kfouri, presidente do departamento de imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
O mesmo pensamento é defendido pela pediatra Isabella Ballalai, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), quem tem acompanhado de perto o funcionamento de 200 escolas no Rio de Janeiro e Niterói durante a pandemia. “O Brasil é o país que ficou mais tempo com as escolas fechadas e os malefícios disso são muito maiores do que o risco da covid-19 para nossas crianças e adolescentes. Então, desde que a escola siga os protocolos, eu recomendo que todos enviem seus filhos”, reforça a especialista.
Isabella ainda explica que a vacinação de pais, professores e da população em geral tem reflexos importantes, como diminuição nos números de óbitos e hospitalizações, mas ainda não é o momento de flexibilizar os protocolos nas escolas. Na verdade, o que os pediatras esclarecem é que o retorno presencial das aulas só é seguro com instituições e familiares seguindo com atenção as recomendações de proteção contra o coronavírus.
Qualquer sintoma é sinal de alerta!
Francisco Ivanildo Oliveira, infectologista do Sabará Hospital Infantil, pontua que o trabalho entre as escolas e os pais precisa ser em conjunto para garantir tanto a segurança dos próprios filhos quanto das outras crianças que estão frequentando as instituições.
“O papel da família é detectar o aparecimento de qualquer sintoma nas crianças ou em outra pessoa que ela tenha tido contato, comunicar a escola de forma precoce e ter um alto grau de suspensão”, alerta o especialista.
Esse processo pode ser desafiador, visto que a covid-19 em crianças pequenas pode ser confundida com outras doenças recorrentes no inverno, como gripes, viroses e bronquiolite. Isso significa que, diante de qualquer sintoma dúbio, é importante que os pais suspendam a ida dos filhos às atividades presenciais.
“Dor de garganta, coriza, sintomas gastrointestinais como diarreia ou vômito devem fazer com que a criança seja mantida em casa mesmo que o estado geral dela seja bom. Já que, na sequência, ela pode começar a desenvolver outros sinais e o quadro de coronavírus fique mais característico e ela seja diagnosticada”, detalha Francisco.
Além dos sintomas que envolvem diretamente o público infantil, o seu isolamento social também é recomendado caso os pais estejam com suspeita da doença ou a criança tenha tido contato com outra pessoa possivelmente contaminada pela covid-19. Em ambas as circunstâncias, é necessário que a escola seja alertada sobre a situação familiar.
Máscara e distanciamento continuam sendo essenciais
Já em relação ao que se deve prestar atenção na estrutura escolar, Isabella cita as regras fundamentais de, pelo menos, um metro de distância entre os alunos e a não aglomeração. Para isso, Francisco complementa que é importante as instituições terem repensado a estrutura física dos ambientes, evitarem a circulação de pessoas desnecessárias nos locais e, se possível, manterem as bolhas de estudantes.
E mesmo diante do maior número de vacinados, as máscaras continuam sendo fundamentais, inclusive para os pequenos a partir de dois anos e que tenham desenvolvimento motor para isso – se o utensílio faz com que as crianças muito pequenas levem ainda mais as mãos até o rosto, pode ser preciso repensá-lo.
Para a variante Delta, a qual já está presente no país e tem se tornado a grande preocupação mundial devido a sua capacidade maior de transmissibilidade, Isabella reforça que as máscaras continuam sendo efetivas na proteção da população. “Só que não é só usá-las, mas utilizá-las adequadamente. Principalmente nas crianças, ela tem que estar muito bem ajustada ao rosto, sem deixar nenhuma fresta”, reforça a pediatra.
“Uma dica, que é do CDC e estou adotando como recomendação para os pais, é o uso de uma máscara de cirúrgica coberta por uma de tecido, com pelo menos de duas a três camadas”, completa a pediatra. Ela ainda pontua que, atualmente, já é possível encontrar no mercado o utensílio cirúrgico específico para o público infantil e o mesmo vale para os de pano.
Se estiver inseguro, pense com calma…
Ainda que tenhamos todas as informações em mãos, decidir pelo retorno presencial dos filhos à escola pode ser desafiador. Neste momento, vale lembrar que a volta ainda é opcional e crianças que continuarem no sistema remoto devem ter a mesma qualidade de ensino garantida pelas instituições.
Só que, mais uma vez, literaturas que acompanharam a reabertura das escolas em outros países têm reforçado que a transmissão da doença dificilmente começa nas salas de aula. “Normalmente, nas epidemias domiciliares, quem começa o quadro é o adulto. Isso significa que as crianças participam muito pouco na cadeia da transmissão da doença. Não há como falar que há risco zero, mas não tem sentido shopping, praias, bares e restaurantes estarem abertos e escolas fechadas”, reforça Kfouri.
O mesmo é levantado pelo infectologista. “Estudos no Brasil e fora dele mostraram que a escola não é um fator importante no adoecimento das crianças ou ocorrência de surtos. A maior parte dos casos que acontece dentro das instituições não é de transmissão de crianças para professores ou de uma criança para outra, é mais entre funcionários adultos”, explica o infectologista.
Conforme a idade vai aumentando, o risco de contaminação também fica maior, como acontece entre adolescentes e adultos jovens. “Porque esses grupos costumam ter atividades fora da escola. É muito mais frequente que essa população já tenha uma vida social mais ativa e, nestas circunstâncias, é que ocorre a transmissão”, completa o médico.
“Quando tivermos uma boa cobertura vacinal com duas doses para a população maior de 18 anos e também tivermos um cenário melhor de controle da circulação da doença entre nós, vamos poder diminuir ou relaxar um pouco o protocolo nas escolas. Mas, infelizmente, estamos longe desse momento ainda”, pontua a pediatra.