Vacinação: grávidas relatam como foi ser imunizada contra a covid-19
Cada uma das entrevistadas foi vacinada com um dos três imunizantes disponíveis no Brasil e contam suas reações e expectativas.
Entre os cuidados necessários para o desenvolvimento saudável da gravidez, está a necessidade de manter a carteirinha de vacinação em dia, com imunizantes liberados e indicados às grávidas – como o contra a Influenza. Entretanto, desde 2020, este grupo tem enfrentado a dura realidade de gerar uma vida em plena pandemia da covid-19, sem acesso às poucas vacinas disponíveis no país.
De um lado, há o caos governamental diante da área da saúde, especialmente em relação a compra tardia dos imunizantes e o baixo investimento no campo de pesquisa. Já do outro, como consequência da necessidade de vacinas serem produzidas rapidamente e à larga escala, gestantes não foram incluídas nas fases de estudos clínicos das doses.
Diante disto, ficou-se decidido por longos meses da pandemia que gestantes não receberiam nenhuma das vacinas contra covid-19, até que o cenário brasileiro começou a ficar cada dia mais grave. Assim, no dia 27 de abril, o Ministério da Saúde classificou todas as gestantes e puérperas como grupo prioritário para receber os imunizantes contra o coronavírus, com a ressalva de que a decisão final deveria ser discutida entre as grávidas e seus obstetras.
A paralisação da AstraZeneca e o medo de quem já tinha tomado
Logo ao saber da notícia, a dona de casa e empreendedora Carla Karst, de 37 anos, procurou por dois postos de saúde em Porto Alegre, onde mora. Inicialmente, sua busca era pela Pfizer, vacina em que é preciso esperar apenas 21 dias para receber a segunda dose e estar completamente imunizada. Entretanto, a única opção encontrada foi a AstraZeneca/FioCruz, a qual ela tomou com 23 semanas, incentivada pela obstetra.
“Durante o dia, fiquei legal, porém, à noite, levantei para atender a minha filha de três anos e comecei a sentir calafrios e dor no corpo. Falei para o meu marido trazer o termômetro, porque achava que estava com febre e, medindo a temperatura, abri o Instagram. A primeira postagem a aparecer era da minha obstetra dizendo que a Anvisa tinha cancelado a vacinação em gestantes”, lembra Carla.
O anúncio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária aconteceu após a suspensão imediata da aplicação da AstraZeneca em grávidas de todo o país. O motivo que levou a paralisação foi o relato da própria fabricante do imunizante sobre a morte de uma gestante devido a um acidente vascular cerebral (AVC) hemorrágico, em que era preciso analisar se havia alguma relação com a vacina.
A notícia foi um baque para a dona de casa. “Ela potencializou o meu medo de morrer, porque começa com os sintomas e ainda tem uma notícia dessas… Fiquei muito apavorada. No outro dia, chorei bastante, até mesmo por empatia à gestante que morreu”, detalha Carla.
A ginecologista Cecília Roteli, presidente da Comissão Nacional Especializada de Vacinas da Febrasgo, explica que a medida adotada pela Anvisa foi apenas uma atitude de precaução devido ao evento adverso casado com o período após a vacina, sem a necessidade de pânico entre as 15 mil grávidas que receberam a primeira dose da AstraZeneca.
Cecília pontua que o imunizante usa a conhecida técnica de vetor viral – em que utiliza-se um vírus do chimpanzé, sem o seu DNA para não causar a doença, e implanta-se um pedaço do DNA do coronavírus a fim de produzir a vacina –, segura para a obtenção de imunizantes de outras doenças. Além de defender que dificilmente a Síndrome Trombocitopenia é associada à vacinas, especialmente quando aplicadas em gestantes jovens.
Ainda assim, para ganhar mais tempo para analisar o ocorrido, o Ministério da Saúde determinou que a segunda dose da AstraZeneca só deve ser aplicada 45 dias após o parto e a gestante deve atentar-se a possíveis reações que demandam acompanhamento médico, como dor de cabeça persistente, febre, dor no peito e mal-estar entre o 4º e 28º dia após a vacina.
Sem reações graves
Também ficou decidido que apenas gestantes com comorbidades passariam a integrar o grupo prioritário da vacina contra covid-19 e receberiam somente doses da CoronaVac/Butantan e Pfizer/BioNTech. Foi assim que a advogada Isabel Mendes, de 35 anos, conseguiu tomar a primeira dose do imunizante, com 31 semanas de gestação.
Asmática crônica desde os nove anos de idade, ela foi vacinada com a Pfizer e a segunda dose está prevista para o dia 20 de agosto, quando já estará no puerpério. “Desde o começo da pandemia, fiquei muito preocupada em pegar a doença e assim que a surgiu a possibilidade de receber a vacina, já fiquei bastante esperançosa em tomá-la durante a gestação. Então, em uma consulta com a minha médica, quando ela perguntou sobre a vacinação, de prontidão, disse que sim”, conta Isabel. Para que chegasse a conscientização de que a vacina era uma boa decisão, a advogada explica que acompanhou as notícias sobre a imunização fora do país.
Em relação à comorbidade vivida desde muito cedo, Isabel comenta que este foi o motivo que fez com que ela fosse aprovada com mais facilidade. “Eu tomo corticoide há muito tempo e faço acompanhamento anual com pneumologista. Então, levei duas receitas, uma de 2015 e outra de novembro de 2020, e o meu cartão de vacinação que comprova que eu tomo a vacina da gripe anualmente por causa da asma”, detalha a advogada.
Já a nutricionista Carla Oliveira, de 35 anos, recebeu a primeira dose da CoronaVac por ter desenvolvimento diabetes gestacional. Entretanto, ao conseguir controlar a condição por meio da alimentação, ela não possuía nenhuma receita de medicação em mãos e foi preciso ir por outro caminho para conseguir ser vacinada.
“Eu fui diagnosticada com a diabetes por uma ginecologista que me encaminhou para uma obstetra de gestação de alto risco por meio de uma carta, em que ela descrevia meus exames e a comorbidade. Eu entreguei esse papel e, por ter o carimbo e assinatura dela, eu consegui me vacinar”, relata Carla.
E enquanto a sua segunda dose, que está prevista para o dia 10 de junho, a nutricionista aguarda ansiosa. “Até mesmo pela minha filha, porque estudos mostram que alguns bebês nascem com anticorpos contra covid-19. Isso dá um certo alívio para as mães”, detalha.
Tanto Isabel quanto Carla tiveram reações às vacinas consideradas normais e iguais a de mulheres não gestantes, como relata a Dra. Cecília. “Você pode ter dor muscular, um pouco de inchaço e vermelhidão no local, mas devem passar em até seis dias após aplicação”, pontua a especialista. Caso contrário, é importante que a grávida entre em contato com sua obstetra.