Entenda para que serve o exame de ecocardiografia fetal na gravidez
O exame, que divide a opinião dos médicos sobre a importância de ser obrigatório ou não, é capaz de detectar cardiopatias congênitas no feto.
O pré-natal reúne uma série de exames importantes para acompanhamento da saúde do bebê que ainda vai nascer! Mas uma destas avaliações acaba não sendo realizada por todas as gestantes: a ecocardiografia fetal, ultrassonografia que analisa especificamente o coração do feto.
Ela não é obrigatória durante este período, sendo indicado só em casos específicos, em que se conheça algum fator de risco. “No entanto, em 90% das vezes, as cardiopatias congênitas ocorrem em gestações sem nenhum fator de risco. Acabamos precisando da identificação da cardiopatia no ultrassom obstétrico, o que varia muito já que depende da expertise do médico que realiza o exame, do equipamento e da posição do feto”, pondera a cardiologista e ecocardiografista Marina Zamith, coordenadora do curso de Pós-Graduação em Ecocardiografia Fetal do Cetrus e coordenadora da área de Ecocardiografia e Cardiologia Fetal do Hospital e Maternidade Santa Joana.
Há uma ampla discussão de que ele deveria ser feito por toda gestante, por ser uma análise simples e não-invasiva, feita por ultrassom que dura cerca de 30 minutos. Tanto que, desde janeiro de 2020, o Projeto de Lei (PL) nº 282/2020, da deputada Mayara Pinheiro, o tornou obrigatório no estado do Amazonas. Mas especialistas trazem outros pontos de vista.
“É importante salientar as dificuldades encontradas para realização do exame e, dentro deste contexto, vem a importância do rastreamento do coração que deve sempre ser realizado durante o ultrassom morfológico”, frisa Claudia Regina Pinheiro de Castro, coordenadora da Ecocardiografia Fetal e Infantil do Grupo Fleury.
Com a consultoria dos especialistas, explicamos como o exame é feito, o que pode diagnosticar e se há alguma contraindicação.
Para que serve a ecocardiografia fetal?
“Neste exame podem ser identificadas cardiopatias congênitas, arritmias cardíacas, e alterações no músculo do coração que podem afetar o desenvolvimento do bebê ainda na barriga da mãe ou após o nascimento, o que ajuda no planejamento do parto e cuidados”, resume a cardiologista pediátrica Melina Tertulino de Lima, da Maternidade Escola Januário Cicco na UFRN.
Entre as doenças que a ecocardiografia fetal pode detectar, temos:
- Tetralogia de Fallot: quando há quatro problemas estruturais que atrapalham o fluxo de sangue do coração para os pulmões;
- Transposição das Grandes Artérias: nome dado para quando as artérias principais do coração estão invertidas;
- Anomalia de Ebstein: defeito na valva tricúspide;
- Defeito do Septo Atrioventricular: esta condição atrapalha o fluxo do sangue dentro do coração;
- Síndrome do Ventrículo Esquerdo Hipoplásico: mau desenvolvimento das estruturas do lado esquerdo do coração;
- Arritmias cardíacas: irregularidades no ciclo cardíaco que podem acelerar ou fazer com que os batimentos cardíacos fiquem mais lentos (taquiarritmia e bradiarritmia, respectivamente).
“É importante explicar à gestante que, devido as características da circulação do feto, algumas cardiopatias congênitas podem não ser identificadas durante a gestação, tais como comunicação interatrial, coarctação da aorta e defeitos cardíacos pequenos”, reforça Claudia.
As alterações cardíacas podem trazer prejuízos ao bebê ainda dentro do útero ou logo depois do nascimento, tanto que, entre 1996 e 2019, uma média de 2.700 crianças morreu por ano em decorrência destas má formações no órgão, de acordo com as Estatísticas Vitais do DataSUS. Não por acaso, detectá-las previamente é muito benéfico.
“O diagnóstico precoce auxilia principalmente na programação para o nascimento, como a escolha de uma maternidade especializada em intervenção cardíaca neonatal, com toda equipe ciente e preparada para o recém-nascido desde a sala de parto até a UTI neonatal. Medicações, exames e intervenções podem ser necessários desde os primeiros minutos de vida em alguns casos”, pontua Marina.
A especialista ainda ressalta a importância de preparar os pais ao longo da gravidez para isso, já que a experiência de internar o filho tão precocemente não é fácil. “Com o resultado, eles têm tempo para assimilar todas as questões relacionadas à cardiopatia e aos acontecimentos que virão após o nascimento”, acrescenta.
Fora que existem patologias que podem ser tratadas ainda no útero. “As arritmias mais graves, quando o coração apresenta acima de 200 batimentos por minuto, precisam de intervenção antes do nascimento, pois os bebês correm o risco de ter insuficiência cardíaca e vir a óbito”, exemplifica a ecocardiografista.
“Já as obstruções mais graves da válvula aórtica e pulmonar podem ter indicação de dilatação antes do nascimento, para que os ventrículos ligados a estas artérias não sofram uma deterioração irreversível antes do nascimento”, completa Marina.
Quando a ecocardiografia fetal é indicada?
Normalmente a ecocardiografia fetal é feita entre 22 a 28 semanas de gestação, “podendo ser realizada a partir de 18 semanas via transabdominal se houver necessidade”, conta Melina.
Antes disso, o exame pode ser indicado quando alterações são encontradas no ultrassom morfológico ainda no primeiro trimestre. “Nestes casos, é mandatório o controle ecocardiográfico ao longo da gestação”, ressalta Claudia.
Depois do período indicado, por mais que o exame ainda possa ser feito, a sua precisão pode ficar comprometida. “A medida que a gestação avança pode haver mais dificuldade técnica, devido ao tamanho do feto, posição e sombra acústica, prejudicando a aquisição das imagens e os diagnósticos mais precisos”, enumera Melina.
– Diabetes mellitus pré-gestacional ou diabetes gestacional no primeiro trimestre;
– Gravidez que é fruto de métodos de reprodução assistida, como a fertilização in vitro;
– Alteração de marcadores de ultrassom morfológico no primeiro trimestre, como a translucência nucal – aumentada;
– Doenças reumatológicas maternas, como Lúpus;
– Uso de certos medicamentos no primeiro trimestre de gestação, como ácido retinóico;
– História de cardiopatia congênita em gestação anterior ou parente de primeiro grau;
– Gestações gemelares monocoriônicas (em que os fetos compartilham a placenta);
– Rubéola materna no primeiro trimestre.
.Além disso, é um exame indicado quando o médico que faz o ultrassom de rotina do pré-natal percebe alguma possível alteração, que será melhor avaliada por um especialista em ecocardiografia fetal.
Como é realizada a ecocardiografia fetal?
O exame é um ultrassom do coração do feto, feito em centros especializados de ultrassonografia e o ideal é realizá-lo com um médico da área.
Na prática, o profissional irá posicionar o transdutor na barriga da gestante com o auxílio de um gel e, por meio de ondas do aparelho, conseguirá imagens do bebê ali dentro, observando principalmente seu coração.
O exame também utiliza um recurso chamado Doppler, em que é possível ver o fluxo sanguíneo dentro do órgão com diferentes cores (sem ele, tudo fica apenas em tons de cinza). “Ele permite avaliar a dinâmica de funcionamento das válvulas cardíacas, artérias e veias, contribuindo na compreensão do estado hemodinâmico e bem-estar do feto”, reforça Melina.
Outros exames que podem ser pedidos
Dependendo do que a ecocardiografia fetal detectar, pode ser preciso investigar condições genéticas, “que possam porventura estar associadas a determinadas patologias fetais, com exames colhidos através do sangue da mãe ou mais específicos por meio do líquido amniótico, por exemplo”, considera a cardiologista pediátrica.
Além disso, ultrassons mais detalhados e novos ecocardiogramas podem ser necessários, se a cardiopatia apresenta tendência a evoluir, conforme ressalta Marina.