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Solidão infantil na quarentena: Entenda o que é e como ajudar o seu filho

Depois de meses em isolamento social, os pequenos podem demonstrar a carência de interações com colegas e familiares de forma diferente dos adultos.

Por Flávia Antunes
9 set 2020, 17h46

Sabemos bem que sentir-se só não é algo típico de apenas uma faixa etária. Crianças, jovens, adultos, idosos… Todos nós vivenciamos momentos em que, mesmo acompanhados de pessoas, sentimos em maior ou menor nível a solidão – a diferença é que, conforme crescemos, ganhamos ferramentas para lidar com esta sensação que os pequenos ainda não possuem.

Mas além do fator faixa etária, temos agora um agravante que pegou a todos nós desprevenidos: o isolamento social. Meses longe da escola e do convívio com os colegas por conta da pandemia do novo coronavírus, os menores podem experimentar uma solidão inédita, que apenas o relacionamento com os pais não é capaz de suprir.

“Independente da configuração familiar em que vive, a criança sofre um empobrecimento das suas experiências por ter menos contato com o mundo do que tinha meses atrás”, diz Desirée Cassado, psicóloga e professora da The School of Life. De acordo com ela, este período fragilizou alguns pilares importantes para a saúde mental dos pequeninos, como o sono (o reloginho “bagunçado” também chegou por aí, papais?), a alimentação e o movimento ou prática de atividades físicas.

“A solidão rouba das crianças outros modelos que podem ser sinônimo de proteção, como os professores, outros lugares para buscarem afeto e acolhimento, e a oportunidade de terem mais ambientes onde podem desenvolver outras faces da sua personalidade que não demonstram com os pais”, acrescenta a especialista.

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E se por um lado a nova realidade em que viemos pode ter aproximado os adultos de seus filhos, ela também reforçou a sobrecarga dos pais, provando o quanto é duro conciliar trabalho, afazeres do lar e cuidado com os pequenos. Entender o porquê dos cuidadores não estarem disponíveis 100% do tempo, no entanto, pode não ser fácil para os menores – e reforçar ainda mais o sentimento de estarem sozinhos.

“A criança pequena não tem a compreensão moral das regras e de falas como ‘estou trabalhando, não posso agora’. Ela entende como falta de aceitação, como rejeição e como abandono, e incorpora esta sensação”, explica Elizabeth Monteiro, psicóloga, psicopedagoga e autora do livro “Criando filhos em tempos difíceis”.

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Sinais que merecem atenção

Ainda incapazes de verbalizar de forma clara o que estão sentindo, os pequenos podem manifestar a solidão de outras formas, como pelas alterações de humor, apatia e tentativa de se esquivar de tarefas ou atividades cotidianas. “As crianças podem apresentar também sintomas psicossomáticos – como dores de cabeça e de barriga, náuseas, disfunções gastrointestinais, problemas para dormir e para socializar em situações seguras, medo excessivo e ansiedade”, diz Desirée. Entenda se o seu filho está com tédio ou ficando ansioso na quarentena.

A professora da The School of Life ressalta que estas queixas de dores aleatórias e mudanças no padrão de comportamento são sinais de alerta para os pais ficarem atentos e, eventualmente, buscarem ajuda profissional. “A criança tem sintomas difusos, o que torna difícil de identificar um transtorno ou um problema emocional”, complementa ela.

A solidão também vale para crianças com irmãos?

Como afirma Elizabeth, ter alguém de faixa etária parecida dentro de casa com quem se relacionar e compartilhar experiências pode ajudar a amenizar os impactos do isolamento social. “As crianças que têm a oportunidade de conviver e brincar com outras crianças podem estar sofrendo menos prejuízos em seu desenvolvimento psicoafetivo e cognitivo, até porque os pequenos aprendem por imitação e no convívio com os pares”, esclarece a psicopedagoga.

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Mas isto não é decisivo. Afinal, configurações familiares maiores não significam necessariamente que as interações entre os pequenos serão positivas. “O fato de ter um irmão em casa não garante que você terá uma relação de troca saudável – pode ser até um fator de maior estresse”, pontua Desirée.

“Claro que ele pode ser um parceiro de brincadeiras e que force a criança a continuar exercitando o dividir, o estar em sociedade e o lidar com conflitos, mas também pode ser responsável por promover mais solidão e afastamento do que amizade e práticas de habilidades sociais”, acrescenta.

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Além disso, não podemos deixar de mencionar que, embora ter um único filho ainda seja um assunto rodeado de tabus, o brincar sozinho tem lá os seus benefícios: ajudar no desenvolvimento das funções executivas – como planejamento e tomada de decisão -, fortalecer a autoestima, incentivar a criatividade e inclusive auxiliar a lidar positivamente com a solidão são alguns dos citados por Ary Maoski, psicólogo da Terapia AMI.

“As brincadeiras realizadas sozinhas são principalmente as de fantasia, onde o pequeno imagina e reproduz o que vivencia em casa, seus conflitos e suas angústias”, exemplifica Elizabeth.

Alternativas para “driblar” a solidão das crianças

Carentes que estão de relações sociais, os pequenos podem até se contentar parcialmente brincando sozinhos ou com os pais, mas sabemos que nada substitui o contato com os colegas e familiares de mesma idade ou de faixa etária parecida. Neste momento em que o melhor ainda é permanecer em casa o máximo possível, Desirée sugere que os pais sejam criativos nas formas de criar interações.

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“As plataformas de interação e vídeo estão proporcionando com que as crianças reproduzam muitos dos comportamentos que vivenciam no ambiente físico: que interajam, brinquem, assumam a liderança e até briguem”, afirma a psicóloga e professora. “Os pais precisam estar mais abertos a estas possibilidades, desde que supervisionando seus filhos e mantendo um ambiente seguro”, aponta ela.

Mas se encontrar os amigos sem a mediação das telinhas for extremamente necessário para a saúde mental da família, a dica de Elizabeth é escolher lugares abertos, tomando todos os cuidados de higiene necessários (inclusive o uso de máscaras se os pequenos forem maiores de dois anos, ou ‘face shield’ se forem menores) e manter uma distância segura. “Sugiro que levem os filhos a um parque aberto, onde possam correr com outras crianças – deixando claro que não podem se abraçar e ficando de olho”, alerta ela.

Descer no prédio e se relacionar à distância com outras crianças e encontrar os priminhos no portão de casa são outras possibilidades levantadas pela psicóloga, assim como investir em brincadeiras que permitam que os pequenos fiquem a um espaço seguro um dos outros, como pular amarelinha ou brincar de “o mestre mandou”. “Mas, por enquanto, não podemos transformar isto em uma rotina diária”, enfatiza a especialista. Apesar das opções citadas, vale lembrar que é muito difícil controlar o contato que a criança vai ter com os outros e o ambiente, sendo mais seguro sempre manter o distanciamento social.

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(Juliana Pereira/Bebê.com.br)
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