Aleitamento materno é a base da vida. A frase faz ainda mais sentindo se pensarmos nos efeitos a longo prazo desse ato cheio de carinho e entrega.
“A amamentação é o alicerce para a construção de uma base sólida de saúde física e mental para a criança por toda a vida, atuando positivamente em todo o organismo ”, aponta Graciete Oliveira Vieira, pediatra do Departamento Científico de Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
Veja alguns benefícios comprovados recentemente pela ciência que se estendem por anos e até décadas depois da amamentação.
1. Cérebro turbinado
Um estudo realizado pela Universidade Federal de Pelotas, no Rio Grande do Sul, acompanhou por mais de 30 anos um grupo de 5 mil indivíduos desde o nascimento para averiguar os efeitos de longo prazo do leite materno no desempenho cerebral do filho. A principal descoberta do grupo, publicada no periódico The Lancet Global Health, foi a de que bebês que foram amamentados se saiam melhor em testes de QI na terceira década de vida.
“Cerca de 80% do cérebro da criança se desenvolve nos primeiros dois anos de vida e o leite materno possui ácidos graxos de cadeia longa, como o DHA, que desempenham um papel fundamental neste processo”, aponta Graciete. A presença constante destes nutrientes pode fazer com que o cérebro fique mais ágil e trabalhe melhor no futuro.
2. Microbiota
A amamentação tem efeito benéfico na formação da microbiota – conjunto de bactérias que vive no intestino e, hoje se sabe, atua não só no funcionamento do órgão, mas na imunidade, no metabolismo e no sistema nervoso, para citar alguns exemplos. “E a microbiota da criança que mama no peito é bem diferente da que usa fórmula, tanto que os fabricantes de fórmulas hoje em dia estudam a inserção da probióticos e prebióticos que amenizem essa diferença”, comenta Graciete.
Isso porque o leite materno tem oligossacarídeos, açúcares que servem de alimento para as bifidobactérias e lactobacilos, espécies que predominam as microbiotas saudáveis. Tanto que um estudo da Universidade de Helsinki feito com 226 crianças mostrou que aquelas que tomavam antibióticos e/ou eram amamentadas por pouco tempo tinham níveis menores de bifidobactérias na microbiota, o que indica um desequilíbrio que pode desencadear doenças sistêmicas e até abrir portas para mais infecções.
O efeito na microbiota é duradouro, uma vez que o perfil de microbiota que se formar na infância tende a prevalecer no intestino para a vida toda.
3. Peso
O mesmo grupo gaúcho que fez a descoberta sobre a inteligência dos bebês décadas depois da amamentação também publicou pesquisas no campo do sobrepeso em 2018. Os achados dos cientistas sugerem que o aleitamento tem consequências de longo prazo na composição corporal aos 30 anos de idade – e está ligado a um IMC (índice de massa corpórea) mais baixo e gordura visceral menos grossa, o que é um sinal de boa saúde.
“Os fatores do aleitamento que são responsáveis pela proteção contra a obesidade no futuro, como a constituição do leite materno e o hábito saudável geralmente associado a ele, também podem proteger a criança de doenças cardiovasculares, embora essa discussão ainda seja controversa”, aponta Graciete.
4. Diabetes e outras doenças crônicas
A amamentação exclusiva protege não só do diabetes tipo 1 na infância, mas do tipo 2 da doença, que se desenvolve principalmente a partir do consumo excessivo de açúcar, na vida adulta. Um estudo australiano acompanhou por 21 anos um grupo de pouco mais de 3.500 bebês e viu que os que foram amamentados por pelo menos 4 meses tinham um risco quase 50% menor de desenvolver diabetes aos 21 anos.
É uma idade em que a doença é mais rara, mas o aleitamento também tem efeito protetor depois disso. “Ele ajuda a prevenir o diabetes na vida adulta, além de outras doenças crônicas e até alguns tipos de câncer”, aponta Graciete. A explicação para esse efeito protetor, ainda sendo desvendado pela ciência, provavelmente esteja na microbiota.
5. Comportamento
A amamentação também é associada com uma saúde mental melhor a longo prazo. Isso tanto pela interação da microbiota intestinal (olha ela, de novo) com o cérebro – que está associada, por exemplo, a um nível maior de neurotransmissores relacionados ao bem-estar – quanto pelo vínculo criado entre mães e filhos que amamentam.
“Esse contato íntimo, olho no olho, pele com pele, interfere na formação da personalidade da criança”, aponta Graciete. E pode não só influenciar positivamente no comportamento da criança como ainda reduzir as possibilidades de uma depressão aparecer na vida adulta, como indica um pequeno estudo alemão de 2012, feito com 52 indivíduos.