Setembro amarelo: 5 frases para não dizer a uma mãe com depressão
Ainda que elas sejam ditas com boas intenções, essas frases podem acabar invalidando os sentimentos da figura materna e trazendo ainda mais culpa.
Descobrir que um bebê está a caminho e poder segurá-lo pela primeira vez são momentos carregados de emoções singulares para cada mãe. Só que a romantização que ainda existe sobre a maternidade acaba fazendo com que as mulheres não se sintam confortáveis para conversar sobre sentimentos conflitantes que o período traz. Junto a outras questões emocionais, o resultado pode ser o desenvolvimento de um quadro de depressão.
Como explica a psiquiatra Denise Gobo, membro da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), mães podem ser acometidas pelo quadro que é chamado de depressão puerperal. Ele recebe este nome por englobar episódios da doença durante e após a gestação, como o baby blues e a depressão pós-parto (que sim, são diferentes. Entenda aqui!).
O baby blues é um transtorno que pode se mostrar presente a partir do primeiro dia após o nascimento do bebê estendendo-se até quatro ou seis semanas depois do parto. “A mãe entra em um estado de melancolia, tristeza, e com grandes oscilações de humor. Ele acomete até 80% das mulheres e está relacionado a esta fase de adaptação física e emocional”.
Caso esse quadro não melhore, Denise pontua que mãe pode vir a desenvolver a depressão pós-parto, que normalmente se inicia um mês após o nascimento do bebê e pode durar de um até dois anos. “Junto com os sintomas do baby blues, a paciente apresenta choro fácil, ansiedade, desinteresse pelo bebê, vontade de fazer mal a ele, irritabilidade, perda ou aumento significativo de peso, cansaço extremo e insônia”.
Ao perceber-se imersa em tais emoções, mães podem ser atingidas em cheio pela culpa avassaladora de que estão sendo ingratas ou completamente diferentes do restante do mundo por não sentirem a felicidade que a sociedade insiste em dizer que elas deveriam viver. Neste cenário, é essencial que a mulher se sinta acolhida e validada perante as próprias emoções para que ela consiga buscar por ajuda profissional.
Para que esse auto julgamento possa dar lugar à empatia e ao autoconhecimento, é necessário que a rede de apoio e outras pessoas que estão no entorno desta mulher fiquem atentas ao que estão repercutindo para que o quadro não piore. Por isso, listamos cinco frases que podem ser ditas com o intuito de ajudar a mãe, mas que acabam reforçando o julgamento e aumentando a culpa – então, evite dizer, ok?
1. “Você deveria estar feliz com o seu filho!”
Gabriela Malzyner, psicóloga e psicanalista pelo Instituto Sedes Sapientiae, reforça que a maternidade é uma experiência que traz momentos de felicidade para a mãe, mas é uma vivência que se estende para além disso.
“É verdade que nos alegramos com a maternidade, mas é verdade também que a gente se angustia, responsabiliza, culpabiliza, revive experiências afetivas anteriores primitivas, e conflitivas. Sempre que dialogamos com ideais, não estamos falando com o sujeito a nossa frente. Mas com os aspectos imaginários que nós mesmos criamos desse lugar fantasioso da maternidade”, esclarece a especialista.
Esse processo pode levar mães a lugares nunca antes visitados emocionalmente, o que pode ser extremamente desafiador. Gabriela detalha que o nascimento do bebê é marcado pelas vivências do puerpério, a tomada de consciência do que é tornar-se responsável por alguém, o rompimento das expectativas do que era ter o filho nos braços, e até mesmo a retomada das suas próprias memórias pessoais da infância.
2. “O bebê vai acabar traumatizado desse jeito”
Quando as pessoas próximas as mães repetem essa frase, Patrícia Guillon Ribeiro, professora do curso de Psicologia da PUCPR e mestre em Psicologia da Infância e Adolescência, explica que existe um motivo por trás dela.
Ao ver a mãe fragilizada pelo transtorno psicológico, não é incomum que o outro demonstre receio sobre os prejuízos para a saúde do bebê já que estamos falando de um período que a relação mãe-filho é essencial para o desenvolvimento dele. Entretanto, o que lembra a especialista é que a mulher não pode ser descartada da equação.
“Essa relação é o primeiro passo para o desenvolvimento emocional do bebê. Só que se essa mãe não consegue estar para o filho, nós precisamos olhar para ela enquanto mãe e mulher, enquanto alguém que é cuidadora, mas que também precisa de cuidados”, enfatiza Patrícia. Portanto, é essencial que esta pessoa seja acolhida para que, com a melhora do quadro, ela também possa atender as necessidades do filho.
3. “Você não precisa de ajuda profissional. É só se distrair!”
Ao demonstrar sinais como vontade constante de ficar na cama, por faltar forças para conseguir fazer o mínimo por si e pelo filho, as pessoas têm em seu imaginário pessoal que o problema seria facilmente resolvido com uma boa dose de diversão. Mas não é assim que funciona com a depressão.
“O distrair-se é uma coisa muito momentânea, e essa emoção da depressão é uma tristeza profunda, sentida como algo muito maior do que ela mesma. A mulher com depressão não consegue nem sequer pensar em levantar da cama, tomar um banho, e se arrumar para se distrair. Ela pode até tentar, mas ela não vai ver graça. Porque a depressão pinta a realidade de preto e branco”, explica Patrícia.
A especialista cita o exemplo de quando a mãe é convidada pelo parceiro para sair para jantar. Ela até mesmo tenta ir, fazendo o básico para que a noite seja agradável. Mas dentro de si, não sente nenhum prazer e não consegue de fato se distrair. Isso acaba retornando à mulher como uma avalanche de culpa.
Esse tipo de frase também é prejudicial por subestimar a importância de procurar por ajuda especializada, como terapeutas e psiquiatras. “Essa mulher precisa ser ouvida na sua intimidade, nos aspectos que estão mobilizados, nas suas angústias, tristezas, alegrias, e dar voz às suas emoções, porque é nessa possibilidade de dizer de si mesma, que vamos nos deparando com os elementos que acarretam ou desenvolvem os mal-estares persistentes”, explica Gabriela.
4. “Isso que você está sentindo é falta de Deus”
Em um país majoritariamente cristão, não é incomum que as pessoas associem os sintomas dos transtornos psicológicos com demonstrações de que a religiosidade da mulher não está fortalecida. Entretanto, como lembra Gabriela, a própria desesperança é um sinal da depressão.
Por isso, é importante que haja acolhimento quando a mãe sinaliza que está sem esperança sobre o futuro. “Dizer que alguém está sem esperança não é uma acusação. É um reconhecimento de um lugar de que tem um pedido de ajuda posto e nós precisamos ouvi-lo, valorizá-lo, incentivá-lo para que ele aconteça e que façamos um direcionamento adequado”, reforça a especialista.
Patrícia também pontua que caso a mulher ouça essa frase de um líder religioso, a tendência é que ela deixe de frequentar a comunidade por se sentir envergonhada e até mesmo culpada. E esse isolamento tende a ser mais um agravante do quadro depressivo.
5. “Já tive filhos e isso nunca aconteceu comigo”
A comparação nunca é um caminho saudável para lidar com qualquer emoção que seja, especialmente em casos de transtornos psicológicos. Ela acaba invalidando os sentimentos das mães e resultam em mais culpa, já que a própria mulher não gostaria de estar naquela situação.
Por isso, o reforço é de que o caminho para ajudá-la precisa ser o oposto. “As mulheres nessa fase precisam ser acolhidas e validadas. Elas precisam que alguém reconheça a emoção estão sentindo naquele período como autêntica e diga que elas estão precisando de ajuda”, detalha Patrícia.
Neste cenário, Denise pontua que é necessário que a rede de apoio seja proativa com esta mãe. Mais do que perguntar se ela precisa de ajuda, é importante partir para como essa mulher quer ser ajudada. Além de dividir as tarefas domésticas e os cuidados com o bebê, pais precisam ser escutas ativas de como a parceira está se sentindo e até mesmo um meio de campo para marcar consultas com profissionais da saúde a fim de que a mãe receba ajuda adequada.