Estamos chegando ao final de março, Mês das Mulheres. Senti que em 2021 as comemorações tiveram um outro peso. Entre uma correria aqui e outra ali, li muitos artigos e acompanhei alguns debates virtuais com reflexões e temas relevantes. Também acompanhei postagens contextualizando o período e reivindicando ações urgentes. A sensação é que conseguimos nos apropriar do 8 de março dando o valor necessário à data. Falta muito, claro, mas houve um certo amadurecimento.
E não poderia ser diferente. A pandemia não deu trégua a ninguém, mas foi especialmente sacrificante para as mulheres, especialmente para as mães solo e as mais vulneráveis. Estamos exaustas e, de fato, vivendo um retrocesso que, por suas características de gênero, foi batizado de shecession. Não são poucos os dados colhidos ao longo de um ano que confirmam a crise feminina.
Selecionei alguns que reuni ao longo desse mês:
- No terceiro trimestre de 2020, o Brasil registrou 8,5 milhões de mulheres a menos na força de trabalho em comparação com o mesmo período do ano anterior, segundo dados do IBGE.
- De acordo com o estudo da ONG Gênero e Número, mais da metade das mulheres precisou cuidar de mais alguém da família nesse período.
- Em outubro de 2020 havia 7,1 milhões de mulheres em busca de trabalho no Brasil, sendo que 4,4 milhões delas eram negras.
- Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina aponta que o tempo gasto com atividades domésticas como cozinhar e limpar a casa aumentou para todos, mas ainda mais para as mulheres. Um exemplo: somente 36% dos homens disseram que lavam e passam as roupas em casa, contra 74% das mulheres.
Do lado de dentro da nossa casa…
O que me chamou a atenção é que em praticamente todas as reportagens e análises, especialistas e pesquisadores apontaram a sobrecarga como uma das causas da crise. Foi o acúmulo de responsabilidades que fez muitas mulheres não enxergarem outra opção senão desistirem de seus empregos, serem demitidas ou preteridas em promoções, por exemplo.
A exaustão trouxe consequências para sua produtividade e saúde física e mental. O cenário é triste, mas colocarmos a discussão da carga mental feminina na manchete dos jornais tem seu lado positivo.
Essa incumbência compulsória é estrutural. Historicamente o trabalho de cuidado do outro fica a cargo das mulheres, independente se ela também traz o sustento para casa ou não. O problema é que, como vemos, esse modelo afeta o desenvolvimento e a saúde das mulheres.
Para alcançarmos a equidade de gênero, precisamos falar sobre o que acontece do lado de dentro das nossas casas. Se não começarmos a dividir as atividades de cuidado – do lar, da casa, da família, dos parentes – não teremos o que comemorar.
Torço para que as conversas puxadas nesse mês sigam ao longo do ano. Precisamos ir em busca de soluções e isso envolve o poder público e a iniciativa privada. Mas no nosso microcosmo podemos também implementar mudanças.
Aqui em casa eu refiz alguns pactos, chamei para a conversa, descentralizei, redistribuí tarefas, quebrei alguns pratos. É um exercício para abrir espaço para que eu possa gastar meu tempo com outras coisas: minha carreira, meu descanso e, por que não, meu propósito de, por meio do Fatigatis, ajudar outras mulheres a aliviar a carga mental.