Depois de uma piora significativa nos índices da pandemia causada pela Covid-19, em decorrência da variante ômicron, o cenário começa a ser rediscutido com o avanço da vacinação tanto de adultos quanto de crianças e, consequentemente, da redução dos casos de contaminação. É o que mostra a decisão de não ser mais obrigatório o uso de máscaras em lugares abertos em São Paulo, a partir do dia 9 de março, o que também já está vigorando no Rio de Janeiro.
Com a soma de mais de dois anos convivendo com a doença pandêmica, é difícil não se perguntar se a medida é segura ou não, especialmente para a população infantil que está vacinada apenas com a primeira dose (caminhando para a segunda) e sem a imunização disponível para os menores de cinco anos, por exemplo.
Para o pediatra Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), estas variantes evidenciam que a suspensão do dispositivo de proteção ainda poderia esperar. “Acredito que as máscaras deveriam ser as últimas coisas a serem tiradas porque não há um ganho em deixar de usá-las. É uma medida que pode ter impacto negativo e o benefício da sua suspensão é muito pequeno ao meu ver”, esclarece o especialista.
Ele, inclusive, defende que a não obrigatoriedade do dispositivo de proteção está mais relacionada ao conforto ou não de usá-la do que as reais vantagens da suspensão. “Podíamos ficar de máscara mais um tempo porque tem outras doenças de transmissão respiratória que são prevenidas, crianças ainda não vacinadas, idosos que não respondem à imunização, além de existir infecções leves que se traduzem por Covid longa mesmo assim. Portanto, é uma medida que, ao meu ver, poderia ter ficado mais para frente”, justifica o pediatra.
Por que parar de usar máscara agora?
Já para o infectologista pediátrico André Ricardo Araújo da Silva, do Grupo Prontobaby e professor da Universidade Federal Fluminense, a decisão de suspender as máscaras também em ambientes fechados, no Rio de Janeiro, é uma medida que cabe ao estado pela soma de fatores que levaram a ela.
“Foi estudada a circulação do vírus, como ele está se comportando no local, além de verificar a cobertura vacinal, que está elevada, com grande parte da população imunizada. Inclusive, essa medida de retirada das máscaras em espaços fechados não é exclusiva do Brasil, em países europeus já tem sido adotada”, defende o especialista.
Em relação ao público infantil, ele lembra que a doença pandêmica tende a evoluir de um jeito diferente entre os menores. Diante das estatísticas gerais a respeito do coronavírus, o infectologista pediátrico pontua que as mortes infantis causadas pelo vírus representam menos de 1% dos óbitos totais.
“Não podemos subestimar a doença e pensar que, por terem sido relativamente poucas mortes, está tudo bem. No entanto, o comportamento de forma geral da Covid-19 sempre foi de causar uma versão leve ou assintomática em crianças. Neste sentido, temos a possibilidade delas terem uma certa proteção em relação ao coronavírus, fazendo com que seja mais um vírus respiratório que as acometem, além dos que já conhecemos“, pontua André.
Só que esta menor suscetibilidade ao vírus não anula a importância da vacinação infantil contra a doença, inclusive porque ainda temos uma parcela deste grupo que não está sendo imunizada: os menores de cinco anos. Neste caso, o infectologista pediátrico comenta sobre a proteção deles ocorrer como um efeito dominó, reforçando que a imunização é uma decisão de influência comunitária. “Estando a circulação do vírus baixa, este grupo acaba protegido pela imunidade coletiva que é gerada”, detalha o médico.
Logo, ainda é preciso que seja uma soma de fatores!
Assim, o que os especialistas concordam é que é necessário que a liberação das máscaras seja analisada estado por estado – uma vez que cada um apresenta índices específicos da transmissão do vírus, internações e óbitos, além das taxas de imunização – e precisa ser aprovada conforme combinação com outras medidas de proteção já conhecidas durante a pandemia, como o distanciamento social e a lavagem das mãos. Kfouri cita, por exemplo, que a desobrigação do uso de máscara até mesmo em lugares abertos pode se tornar mais perigosa caso estejamos falando de famílias e crianças ao ar livre, aglomeradas.
Portanto, cada circunstância precisa de atenção individual para que se entenda se aquele local é adequado para suspender a utilização do dispositivo de proteção. “Afinal, não é porque um estado desobrigou usar a máscara ao ar livre que você não deve utilizá-la ou entender que isso significa que algumas situações de risco não a exigem, especialmente diante de indivíduos mais vulneráveis“, finaliza o pediatra.