Se em 2020, tivemos que repensar a maneira dos pequenos interagirem com o Papai Noel, neste ano, eles estão podendo se reaproximar do bom velhinho em encontros presenciais em shoppings e eventos. Só que é preciso cuidado com a expectativa dos pais diante da situação para que não se atropele a vontade dos pequenos e o momento torne-se desconfortável ou até mesmo traumático.
“Essa é uma circunstância que os pais não devem forçar. É importante que a criança queira ir ao encontro do Papai Noel, conhecê-lo, mas não obrigá-lo a tirar aquela tradicional foto, por exemplo. Como estamos muito vinculados hoje em dia a poder publicar uma imagem na internet, isso acaba sendo mais importante do que o momento em si para própria criança”, alerta a psicóloga Karin Kenzler, pós-graduada em psicopedagogia.
Além deste desejo inconsciente ligado às redes sociais, impor que a criança tenha contato com o bom velhinho esconde possíveis expectativas dos pais de que o filho viva aquela situação e quem explica isso é a psicóloga Alessandra Augusto, pós-graduada em neuropsicopedagogia.
“A tentativa forçada de que a criança se aproxime do Papai Noel, mesmo se negando, chorando, não é para ensinar algo ruim a ela. Mas é um meio dos pais saciarem a vontade própria dessa proximidade, que acaba sendo projetada no filho”, esclarece a especialista.
Obrigar a criança pode prejudicar sua autoestima
A imposição dos desejos dos adultos acima daqueles que são da criança podem acarretar em uma série de consequências negativas para a sua autoestima. A primeira está relacionada a sensação ou até mesmo crença negativa de que suas decisões não são tão importantes ou válidas diante das dos outros.
“Quando obrigo esse contato com um estranho, posso estar gerando um trauma na criança. Primeiro pela imposição de fazer algo que pode estar trazendo um sentimento de pavor, segundo por essa obrigação estar sendo feita por aquele que cuida dela, o que é muito conflitante na cabeça da criança”, pontua Alessandra.
Vale sempre lembrar que isso não significa fazer apenas as vontades das crianças, mas não anular as percepções daquele ser humano que está em formação. “É preciso que ela entenda que está sob o comando dos pais ou daqueles que estão cuidando dela, mas é necessário respeitar os desejos da criança para que ela não se sinta impotente diante das investidas do responsável“, completa a especialista.
Aproveite a situação para falar de consentimento
Além dos beijos e abraços, também é comum que os pais incentivem que os filhos sentem no colo do Papai Noel para fazer a famosa foto símbolo do Natal. Mas este tipo de encorajamento pode acabar colocando os pequenos em situações desconfortáveis.
“Esperamos comportamentos das crianças que não temos como adultos. Ninguém força outro adulto a sentar no colo de alguém, por exemplo. Então por que fazemos isso com os pequenos?”, questiona a psicoterapeuta Helen Mavichian, especializada em crianças e adolescentes.
Por isso, o momento pode ser bom também para ensinar sobre consentimento aos filhos, afinal, ninguém deve exigir que eles abracem, beijem ou tenham qualquer interação que não queiram. “Jamais force a criança a sentar no colo do Papai Noel. Por mais que ele represente esta figura mítica, bondosa, para a criança ainda é um homem estranho, que ela nunca viu. Esse não é um aprendizado que queremos passar para os nossos filhos”, enfatiza Karin.
Então, o que fazer nesta situação?
Se ao mesmo tempo que você tem receio do pequeno perder a experiência natalina, mas não quer desrespeitá-lo, a saída é prática: pergunte a ele se quer falar com o Papai Noel e valide a resposta, sem querer impor a sua vontade sobre a dele. “Não há necessidade desta interação para o desenvolvimento infantil. É suficiente que a figura exista apenas no imaginário da criança”, explica Karin.
No entanto, o que lembra as especialistas é que vale a pena tentar descobrir o porquê do pequeno não querer interagir com o Papai Noel. “O intuito não é colocar alguma culpa, como se ele devesse querer, mas porque pode haver a possibilidade dele estar se sentindo culpado por não ter sido uma boa criança ao longo do ano ou temer algum tipo de castigo”, completa a especialista.
Desta forma, será possível acessar o imaginário infantil que está confabulando situações que não são reais, e trazê-lo para mais perto, enfatizando que está tudo bem ele não querer fazer o que os outros estão fazendo. Helen ainda pontua que este momento é importante para a criança começar a mostrar sua personalidade e os pais conseguirem incentivá-la a ser quem realmente é.