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Maternatípica

Poliana é mestranda em comportamento infantil, autora do instablog @meubebeeoautismo e mãe atípica de Soph e João.
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É na aceitação da vulnerabilidade que nos tornamos fortes

A geração smartphone é ensinada a buscar uma vida perfeita. Mas quais os impactos de se acreditar que é sempre possível ser lindo, incrível e vencedor?

Por Poliana Martins
24 jul 2022, 14h00
criança de braços esticados segura um coração. Um adulto está com a mão embaixo da dela
 (manusapon kasosod/Getty Images)
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A vida me presenteou com duas maternidades completamente opostas, quase que paradoxais, em diversos sentidos. Sou mãe de um menino autista de 5 anos, que precisa de suporte para aprendizagem, tem atraso de fala, de coordenação motora, poucas habilidades sociais e problemas para brincar. Sou também mãe de uma menina superdotada de 13 anos, que tem desempenho muito acima da média em tudo o que faz: canta, dança, luta, desenha, colore, pinta, interpreta, discursa, e tem resultados acadêmicos impressionantes.

João aprendeu desde os primeiros meses que a vida seria um pouco mais difícil e foi valente em enfrentar diversos desafios, pequenos e grandes, para chegar onde está. Para Soph, as coisas foram um tanto quanto mais fáceis. Ela sempre foi destaque em tudo que fez, andou, falou e leu muito cedo, enfrentando os aprendizados com alguma tranquilidade, o que fez com que não se acostumasse com a falha, o erro, o desconforto de não ter todas as respostas.

Não raramente situações curiosas se chocam: recentemente, Soph foi eleita a melhor esportista da escola. No dia seguinte, o professor do João pediu treinos extras de chute, porque meu pequeno ainda não consegue acertar a bola de futebol.

Quem olha pra de fora para a trajetória dos meus filhos pode pensar, equivocadamente, que Soph é mais feliz ou mais realizada que João. Se enganam. João aprendeu uma coisa que poucas pessoas, mesmo depois de adultas, sabem: a não depender dos seus resultados para valorizar as experiências. É muito curioso como ele se diverte no futebol enquanto cai, tropeça, pisa na bola e desliza pra dentro do gol – corpo, bola, gargalhadas – entrelaçados no meio do caos. É bonito perceber como ele sabe que falha, mas continua, ainda que frustre as expectativas dos demais meninos do time. Como é potente viver em busca de não ser o melhor sempre, como é grandioso reconhecer seu fracasso e mesmo assim escolher permanecer.

É um dos sintomas da superdotação a busca constante por resultados perfeitos e faz parte do trabalho terapêutico desconstruir esse ideal tão frágil de que é possível ser humano sem errar e sofrer (e muito). Mas, indo um pouco além da minha própria vivência, acredito que perseguir padrões de perfeição também é uma característica do nosso tempo. Os 15 segundos de duração de um story, os 280 caracteres de um tweet ou um minuto de um vídeo no Tiktok criam uma realidade paralela em que é possível existir sem falhas, escondendo os diversos cortes, ajustes e filtros em bastidores invisíveis. Esse é o mundo em que criamos nossas crianças e em que elas aprendem a lidar consigo mesmas.

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A geração smartphone é ensinada a perseguir uma vida perfeita de aparências. Mas quais os impactos de se acreditar que realmente é possível ser sempre lindo, incrível e vencedor? Infelizmente isso só existe nos 15 segundos de realidade virtual do Instagram.

“Ao abraçar o caos da vida e entender que vamos errar, nos envergonhar, tropeçar na bola e fazer gol contra, também passamos a ser mais gentis com nossos desacertos”

Quando as telas desligam e os filtros se vão, temos que lidar com a dureza que é ser humano e vulnerável. E, embora haja, sim, beleza neste aprendizado, há dor. E muita. É preciso ser resiliente e encarar as próprias falhas – e as dos outros – como parte indissociável do processo. É na aceitação da vulnerabilidade que nos tornamos fortes. Porque entendemos que não é preciso desistir, já que o erro é parte intrínseca do processo de acerto.

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Por aqui enfrento o desafio de ajudar a minha adolescente a caminhar na insegurança de ser humana. Superdotados ou não, todos nos esquivamos do sofrimento. E como mãe, por mais que eu queira colocá-la na bolha do amor, preciso fazer com que ela se torne capaz de encarar as próprias vulnerabilidades. E persistir.

Gostaria de ter as respostas ou os caminhos prontos para deixar um link clicável de receita para vocês, mas não tenho. Parece que também preciso encarar minhas próprias angústias e falhas neste processo.

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