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Relato de mãe: “Me senti muito culpada ao ter complicações no pós da lipo”

A mãe Débora Côrrea conta sobre a culpa que sente ao ter decidido fazer uma cirurgia plástica com graves complicações na recuperação.

Por Alice Arnoldi
28 jan 2021, 19h20

No domingo (24), a internet mobilizou-se com o caso da influenciadora digital Liliane Amorim, de 26 anos, que faleceu após complicações em uma lipoaspiração. O acontecimento trouxe à tona a discussão sobre a busca de um padrão estético que atinge mulheres de diferentes biotipos e, junto a isso, depoimentos importantes que refletem que a morte desta jovem não é um caso isolado.

Um destes relatos é o de Débora Côrrea, de 36 anos, que atualmente trabalha com marketing e está em processo de formação como doula. Após engravidar do seu primogênito Guilherme, hoje com seis anos, e a chegada dos 30, ela cogitou passar por uma cirurgia plástica para fazer a redução das mamas, pois o seu volume prejudicava a coluna e também a incomodava esteticamente.

Ao procurar por diferentes opiniões médicas, Débora era sempre alertada que a mudança física ficaria mais harmônica se ela unisse a diminuição dos seios com uma lipoaspiração de regiões como coxas, flancos, laterais e também do abdômen. Depois de pensar por anos, ela optou passar pelo procedimento em 2020.

A cirurgia, que demorou quatro horas e foi dada como um processo bem sucedido, trouxe uma recuperação complicada, que chegou a colocar a vida de Débora em risco. Hoje, ela afirma que sua decisão sobre a lipoaspiração seria outra: “Se eu soubesse que iria passar por tudo isso, não faria”.

Veja a história na íntegra:

“A gestação do Guilherme não foi planejada, mas foi muito comemorada porque é o primeiro neto dos meus pais e sogros. E ainda que eu sempre tenha sido uma pessoa que gosta de se envolver em diversos assuntos, a maternidade não era um deles. Nunca sonhei em ser mãe, mas ela aconteceu na minha vida.

Em 2015, em Curitiba, o Guilherme nasceu de uma cesárea, em que sofri violência obstétrica e não tive informações necessárias para uma pessoa que está tendo o primeiro filho. Isso fez com que eu e meu marido nos víssemos sozinhos, com uma criança, sem saber o que fazer.

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Foi um puerpério muito sofrido, em que tive baby blues, sendo eu e o Guilherme sozinhos o dia inteiro, já que meu marido trabalhava. Quando ele chegava em casa a tarde, ficava com o bebê para que eu pudesse tomar banho, mas logo eu já tinha que amamentar. Nesse meio tempo, ele também fazia janta para deixar para o outro dia, principalmente porque o Guilherme era bastante agitado, dormia pouco e não sobrava tempo.

Lembro que meu médico nunca mencionou a palavra puerpério e também não tive a rede de apoio devida. Então, foi um início de maternidade bem conturbado, o que me impulsionou a buscar minha formação de doula. Este ano, estou concluindo meu segundo curso e vou me especializar em pós-parto, porque eu realmente quero trabalhar com mulheres puérperas, que se veem na neblina que é a exterogestação”.

Os limites do próprio corpo ao voltar a estudar

“Por morarmos sozinhos em Curitiba, tivemos que encarar muita coisa. Meu marido trabalhava muito no banco, que era um bom serviço com um salário estável, o que me deu condições de ficar em casa com o Guilherme por um ano. Depois, ele foi para a escolinha e eu decidi estudar para concurso público na polícia.

Só que quando eu comecei a me preparar para o teste físico enquanto estudava, foi quando eu percebi que o volume dos meus seios estava me atrapalhando. Por exemplo, eu queria correr e me machucava. Para se ter noção, saltei de um sutiã 44 para 52 quando estava amamentando. E, depois do aleitamento materno, voltei para um 48. Eu tinha a sensação de que em todas as roupas que eu colocava, meu peito chegava antes de mim.

Acabei não passando por pouco e desenvolvi um transtorno pós-traumático. Não consegui mais estudar para concurso, fiz tratamento, mas coloquei este meu sonho em uma caixinha para, quem sabe, vivê-lo em uma outra vida.

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Os anos foram passando, eu fui ficando mais triste com as circunstâncias e comecei a pensar em fazer uma cirurgia plástica. Inclusive, a minha mãe fez diminuição de mamas e a vida dela mudou. Isso porque ela já tinha um desgaste muito grande na coluna cervical e estava prejudicando a saúde dela. Então, comecei a planejar a minha”.

O estopim para a decisão de operar

“Sempre fui muito bem resolvida com o meu corpo, e amava quem eu era. Assim, a primeira vontade que eu tive de fazer a cirurgia plástica não foi por estética, foi por qualidade de vida. Só que não foi um ‘eu preciso, eu preciso, eu preciso!’. Veio a vontade, e eu comecei a trabalhar isso dentro de mim.

Mas nunca chegava o momento perfeito e nunca teria, afinal, sempre existem outras prioridades. Só que eu comecei a falar com algumas pessoas e elas começaram a me encorajar, como a minha cunhada.

Neste meio tempo, fomos a Florianópolis visitá-los no ano passado. Quando estávamos nos preparando para ir à praia e fui colocar um biquíni, ele simplesmente não entrou em mim. Ali, eu chorei muito e decidi que iria atrás da cirurgia plástica.

Ao voltar para Curitiba, marquei alguns médicos e eles tinham sempre a mesma opinião: o resultado ficaria mais harmonioso se eu fizesse uma lipoaspiração. Sim, o meu interesse inicial era apenas diminuir os seios, mas aí você já começa a pensar ‘por que não fazer a outra cirurgia também?’.

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Só que nós não temos a real dimensão do que é uma lipo. As pessoas não sabem o que acontece, como é processo, e nenhum médico me falou isso. O meu me deixou muito segura sobre a prótese, que eu não queria colocar e sabia que existiam técnicas que a dispensavam. Mas acabei optando por fazer a lipo e a diminuição do meu peito no mesmo processo”.

As complicações na recuperação

“Fiz todos os exames e estavam todos ok. No dia da cirurgia, também deu tudo certo. Eles me avisaram onde haviam feito a lipo, que tinha sido grande (tiraram cinco litros de gordura), e que eu tinha perdido bastante sangue no processo. Ela foi feita pela manhã e, como não era uma abdominoplastia, não precisaria dormir no hospital. Só que quando meu marido foi me buscar, eu estava muito debilitada, fraca, tonta. Por isso, os médicos acharam melhor eu ficar aquela noite no hospital.

Na manhã seguinte, vim para casa. Só que eu sentia muita dor, era insuportável. O meu peito não incomodava nada, mas a lipo… Eu nem lembro direito porque o nosso organismo tem o mecanismo de nos fazer esquecer para não ficar sofrendo. Eu só sei que era muita dor, mas não consigo dimensionar isso agora.

Já na outra semana, em uma segunda-feira, fiz a primeira sessão de drenagem e foi tudo dentro dos conformes. Só que eu comecei a sentir uma dificuldade para engolir, igual quando você toma um comprimido e parece que ele fica entalado, sabe?

Essa sensação permaneceu na segunda, na terça e quando foi quarta-feira, eu comecei a sentir meu coração pulsando acelerado. Quando a fisioterapeuta chegou para fazer drenagem, eu disse que estava me sentindo muito fraca e com a impressão de estar com taquicardia. Ela verificou meu pulso e viu que realmente estava.

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Na mesma hora, ela achou estranho porque eu estava em repouso e tentou contato com o meu médico, mas ele estava viajando. Então, ela falou com o anestesista da equipe médica, que também ficou preocupado, e orientou que eu fosse direto para o hospital porque podia estar passando por um processo de trombo.

No hospital, fiz o exame de trombo e hemograma. O primeiro deu OK, mas o segundo já acusava anemia – minha hemoglobina estava em cinco. Só que eu fiquei quatro horas no hospital para esperar os resultados, estava com muita dor, não conseguia ir no banheiro sozinha. Então, a única coisa que eu queria era ir embora e eles me liberaram. Falaram com o meu médico, ele disse que era um processo normal ter uma baixa nas hemácias depois de uma lipo grande, como foi a minha, e que poderiam me mandar para casa”.

A dor da culpa

“Na quinta-feira, eu tinha o retorno com o meu médico, mas acabei atendida por um auxiliar. Ele me achou muito pálida e a anestesista, uma das donas do local, assim que me viu falou que eu deveria ir imediatamente para o hospital fazer uma transfusão de sangue. Ao ver um ligando para o outro e um desespero formando-se a minha volta, comecei a entender que a situação era mais grave do que imaginava.

Nunca pensei que isso aconteceria comigo. Antes da cirurgia, o que eu tinha medo era da anestesia, mas tive uma consulta pré-anestésica que me deixou tranquila, e fui pra mesa de cirurgia com medo claro, mas segura. Só que quando eu me vi naquela situação, de ter que fazer uma transfusão de sangue, foi muito difícil.

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Eles queriam que eu fosse direto pro hospital, mas precisava pegar minhas coisas para ficar internada, então fui pra casa. Quando tive que falar para o meu filho que eu precisaria voltar ao hospital de novo… foi muito difícil.

Ali, eu fiquei questionando o que eu tinha feito, qual era a necessidade. Eu estava com a saúde perfeita, e agora estava indo para um hospital. Eu desejava que ficasse tudo bem, mas e se não ficasse? E o meu filho? Eu me senti muito vulnerável.

Eu não chorei na frente dele. Mas ele ficou chorando em casa, pedindo para eu ficar. Então quando eu bati a porta, desmoronei. Meu marido me abraçou, me acalmou, mas eu disse para ele que estava me sentindo muito culpada. Eu não precisava ter feito tudo isso e fiz”.

Hoje, a decisão seria outra

“No hospital, fiz a transfusão de um litro de sangue, e a minha hemoglobina de cinco foi para onze. Foi muito assustador. Hoje, fora do olho do furacão, a gente começa a pensar até que ponto precisamos disso. Estou feliz, satisfeita. Mas em nenhum momento eu parei de pensar ainda se eu precisava ter feito tudo isso, ter corrido este risco.

Eu não sou contra a cirurgia. Mas se eu soubesse que iria passar por tudo isso, eu não faria. Só que eu não tinha como saber. O que eu não concordo é com a banalização, em que a pessoa é aparentemente magra e quer tirar quatro litros de gordura de um corpo que não tem.

Se optar pela cirurgia, é importante procurar um bom profissional, uma boa equipe médica e estar bem amparado. No meu caso, se não fosse a equipe médica perceber que eu não estava bem, a complicação seria maior. Me sinto culpada por ter colocado meu marido e meu filho, juntamente com quem estava me dando apoio, que era minha sogra e minha mãe, nessa situação de estresse e preocupação. Me sinto muito culpada por isso”.

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