Para quem já convive com a endometriose ou está em fase de investigação, não é novidade ouvir que a doença é rodeada por complicações na hora de se obter o diagnóstico preciso e dar início a um tratamento – o que também acontece com o ovário polícístico, por exemplo, outro distúrbio ginecológico comum entre mulheres na idade reprodutiva. Por isso, é sempre uma boa notícia quando novos estudos trazem descobertas que podem facilitar o reconhecimento e mapeamento desta doença silenciosa e dolorida.
Primeiro, é preciso entender que a endometriose, por definição, se caracteriza pelo crescimento do tecido do endométrio – que deveria revestir a parte interna do útero – fora da cavidade uterina. Assim, podem ser encontrados partes do tecido nos ovários, trompas e até intestino da paciente. Por estarem alocados em locais inapropriados, estes “pedaços” do endométrio irão influenciar diretamente na formação de cistos, inflamações e tecidos cicatriciais pelos demais órgãos da região.
O que os estudos encontraram até agora
Em janeiro de 2022, o estudo francês “Salivary MicroRNA Signature for Diagnosis of Endometriosis” publicado no Journal of Clinical Medicine constatou novas descobertas para o diagnóstico da endometriose. Através da saliva de 200 pacientes com relatos de sintomas da doença, os pesquisadores puderam relacionar uma “assinatura” de diagnóstico para a endometriose baseada nas amostras.
Apesar de ainda estarem em desenvolvimento, os resultados das análises apontam caminhos promissores para o tratamento e identificação da doença. “Isso poderia contribuir para melhorar o diagnóstico precoce por meio de uma ferramenta não invasiva facilmente disponível em qualquer sistema de saúde”, apontou a pesquisa francesa.
Outra pesquisa de peso foi conduzida pelo Feinstein Institutes for Medical Research através do projeto Research OutSmarts Endometriosis (ROSE). “Atualmente, o diagnóstico requer cirurgia invasiva e normalmente leva de seis a dez anos desde o início dos sintomas até o reconhecimento da doença. Esse atraso é caro para as mulheres em muitos níveis, incluindo perda de qualidade de vida, uso extenso de serviços médicos e aumento da infertilidade”, revela parte do projeto ROSE, publicado na revista científica Frontiers, que começou em 2017 e segue em andamento, aceitando amostras em seu site oficial.
A fim de desenvolver um diagnóstico não invasivo para a endometriose, a pesquisa avaliou as diferenças de efluentes menstruais (parte do tecido que se desprende do útero durante a menstruação) recolhidos de mulheres com e sem a doença entre 29 e 49 anos. A partir daí, observou-se que o efluente das que possuem endometriose apresentava uma diferença significativa em comparação aos das pacientes saudáveis.
“A endometriose é uma doença comum, heterogênea e enigmática que apresenta enormes desafios para a compreensão e manejo clínico. A análise de efluentes pode fornecer um diagnóstico preciso, rápido e não invasivo para endometriose e insights sobre a patogênese da doença. Além disso, pode eventualmente levar a novos tratamentos mais eficazes”, concluiu o estudo.
A dificuldade do diagnóstico
Mesmo que cerca de 10% das mulheres em idade fértil sejam afetadas pela doença, segundo a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), a sua complexidade vai desde a busca por um diagnóstico confiável e não invasivo até a normalização de seus sintomas por especialistas e até pelas próprias pacientes, que relatam cólicas menstruais intensas, dores na região do abdômen e da pelve e, em alguns casos, infertilidade.
O diagnóstico, que pode demorar porque os sintomas podem ser confundidos com o de outras doenças, deve começar com uma conversa com o ginecologista para avaliação dos sintomas. Geralmente, só o exame físico de rotina no consultório não é suficiente para identificação da doença e podem ser requisitados testes de imagem – ultrassonografias e ressonâncias – e procedimentos cirúrgicos, que darão a certeza da presença de endometriose. Por isso mesmo que o reconhecimento da doença acaba, muitas vezes sendo tardio e bastante agressivo.
E por se tratar de uma doença crônica, ou seja, que não põe em risco a vida da paciente a curto prazo, ela exige tratamento contínuo e atenção constante de quem a possui, por isso, quanto mais cedo for descoberta, melhor é o prognóstico do tratamento.