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Quando e como começar a falar sobre bullying com as crianças?

Em tempos de discurso de ódio e tanta violência, conversar com os filhos é essencial. Saiba de que forma abrir esse espaço de diálogo

Por Carla Leonardi
18 abr 2023, 14h35

Bullying não existia na minha época”, escuta-se com frequência por aí. Bem, talvez não fosse nomeado dessa forma, mas certamente você se lembra de coleguinhas de escola excluídos, zombados e até agredidos por características físicas, comportamentais ou outros motivos banais. E ainda que esse tipo de prática não fosse tratado da forma como é hoje, seus efeitos são inegáveis. Quantos traumas relacionados à sociabilidade, a falar em público, ao modo de se vestir, ao próprio corpo, entre tantos outros, não repercutiram depois, na vida adulta? Quantas reações violentas e trágicas não foram consequência do bullying?

Hoje em dia, que sabemos tão bem o que ele é e o que pode acarretar, é de vital importância conversarmos sobre o assunto não só na escola, mas também dentro de casa, afinal, é de lá que vêm os primeiros ensinamentos. Você já deve ter se cansado de ouvir que o exemplo dos pais faz toda a diferença na educação. E não é para menos: desde pequenas, as crianças copiam os mais velhos, sejam cuidadores, irmãos ou outras pessoas com as quais convivem.

“A família é nossa primeira escola e a criança aprende muito pelo exemplo”

Cecília Rocha, psicóloga e arteterapeuta especialista em Terapia Cognitiva Comportamental

“Estamos ensinando muita coisa quando tratamos todo mundo da mesma forma, com respeito e gentileza. Quando numa festa, por exemplo, não deixamos ninguém de fora. Quando não fazemos piadinhas com o corpo nem a personalidade de ninguém”, explica a psicóloga e arteterapeuta Cecília Rocha, especialista em Terapia Cognitiva Comportamental pela FMUSP.

piruliltos coloridos com carinhas representando crianças. Há um pirulito vermelho com a carinha triste, separado dos demais
(Carmen Martínez Torrón/Getty Images)

Quando a criança começa a entender o que é bullying?

É possível explicar a questão de forma concreta a partir dos 7 ou 8 anos. Nessa faixa etária, pode-se nomear a prática e conversar de maneira mais direta com a criança, deixando um espaço de diálogo aberto até para que ela mesma conte o que acontece na escola, se algum amiguinho sofre com outros colegas, se ela mesma é vítima ou até se já teve um comportamento do qual se arrepende.

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Ainda assim, Cecília alerta que, mesmo que não entendam, os pequenos podem praticar ou sofrer bullying antes dessa idade. Da mesma forma, eles são plenamente capazes de aprender a tratar os outros com respeito e de maneira igualitária desde cedo – e essa é a principal chave.

“Costumo ressaltar dois pontos como pano de fundo: a não aceitação das diferenças e a busca pela sensação de poder. Esses temas podem ser trabalhados com as crianças desde muito pequenas, mesmo sem usarmos a palavra ‘bullying’, ressalta a especialista. Segundo ela, é importante destacar desde sempre que as diferenças fazem parte da vida e que elas são saudáveis, “que cada um de nós é um ser único, singular e especial do jeito que é”, orienta.

Na primeira infância, a linguagem lúdica é uma grande aliada, então lance mão de livrinhos e filmes que tratem da diversidade. Cecília lembra ainda da natureza como ótima fonte de exemplos: “Ela nos ensina a importância e a beleza de ter vários tipos de flores, pássaros, plantas…”. Já sobre a questão do poder, a psicóloga reforça a necessidade de oferecer às crianças um pensamento cooperativo.

“Pais e cuidadores podem trazer para a criança a ideia de cooperação, de que não precisamos competir. Cada um tem seu espaço e ninguém vai ocupar o lugar do outro, pois o lugar do outro já está garantido. No bullying, percebemos que muitos dos ‘agressores’ buscam essa sensação de poder, controle e superioridade, pois justamente se sentem inseguros”, explica.

Menina cobrindo o rosto sob colagem
(Arte: Bebê.com.br / Foto: Caleb Woods/Unsplash)

Construindo as bases para a adolescência e a vida adulta

De acordo com Cecília, a prática do bullying se intensifica a partir dos 10 ou 11 anos de idade, quando as alterações fisiológicas das crianças são mais intensas e as famosas panelinhas começam a se solidificar (sabemos, porém, que pode acontecer muito antes disso). No caminho para a adolescência, os aprendizados da infância vão se concretizando – tanto para o bem, quanto para o mal

É por isso que oferecer à criança uma base sólida, com bons exemplos e diálogo aberto é tão importante.

“A adolescência é o momento em que nossos filhos vão para o mundo e em que o social ganha força”, alerta a psicóloga. E é aí que todo o aprendizado sai, de fato, das nossas quatro paredes. “Trabalhando esses temas que são pano de fundo do bullying [não aceitação das diferenças e busca por poder] desde pequenos, podemos morar na nossa casa maior, que é a sociedade, de uma forma mais tranquila, respeitosa e cooperativa”, pondera.

Precisamos lembrar que, se queremos um mundo melhor, é pela base que as mudanças devem começar a acontecer. Tudo isso “para que a gente possa caminhar rumo a uma sociedade mais amorosa, respeitosa e pacífica, onde a solidariedade e a igualdade façam morada“, finaliza Cecília Rocha.

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