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HIV na gestação: os riscos que o vírus oferece para a mãe e o bebê

Especialistas esclarecem dúvidas referentes à contaminação do bebê durante a gravidez, no parto e na amamentação.

Por Paula Montefusco (colaboradora)
Atualizado em 26 out 2016, 11h46 - Publicado em 16 Maio 2015, 16h00
pojoslaw/Thinkstock/Getty Images
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As notícias são boas: de 2013 para 2014, a taxa de detecção de aids caiu 5,5% no Brasil, baixando de 20,8 para 19,7 casos a cada 100 mil habitantes. Essa é a maior redução da epidemia nos últimos 12 anos. Os dados são do Boletim Epidemiológico de HIV e Aids de 2015, apresentado pelo Ministério da Saúde nesta terça-feira (1), em Brasília. As estimativas apontam que 781 mil brasileiros vivem com o vírus ou a síndrome da aids atualmente. O cenário também está melhor no que se refere à transmissão vertical, ou seja, quando a mãe passa a doença para o filho durante a gravidez. Segundo o ministério, entre 2013 e 2014, o diagnóstico de HIV/Aids nos menores de 5 anos de idade diminuiu 9,7% – de 3,1 para 2,8 por 100 mil habitantes. Analisando o período de 2002 a 2014, a queda nessa faixa etária foi de 58,2%.

Apesar do cenário animador, a aids ainda deve ser encarada como uma doença séria que precisa ser tratada. Até porque, com o vírus mantido sob controle, é possível levar uma vida normal. Com o tratamento adequado, ele não evolui para a síndrome que leva à perda da imunidade, causada pela queda dos linfócitos CD4, espécie de equipe de segurança do corpo. Com a defesa baixa, a infecção serve como porta de entrada para doenças oportunistas, como tuberculose, pneumonia, meningite e toxoplasmose. Até mesmo infecções normalmente inofensivas, como a candidíase, podem ser transformar em doenças perigosas no organismo do portador da aids.

Pré-natal

É obrigatório por lei que toda gestante faça o teste de HIV logo nas primeiras consultas do pré-natal. Se negativo, o teste é repetido no terceiro trimestre de gestação. “É preciso eliminar o preconceito em relação ao teste. Se o médico está pedindo é para ter certeza de que a paciente não foi exposta a ele. Não quer dizer que está desconfiado dela ou qualquer coisa do tipo”, defende o ginecologista e obstetra Fúlvio Basso Filho, responsável pela maternidade do Hospital São Luiz, em São Paulo. Assim, se ela descobrir que tem o HIV, pode ser encaminhada a um local apropriado, como uma das unidades dos Serviços de Atendimento Especializado (SAE) do Ministério da Saúde.

Tendo descoberto a presença do vírus no pré-natal ou antes dele, a gestante segue com os exames normais, como ultrassonografias periódicas. “A menos que tenha uma condição que indique gravidez de risco associada, como descolamento de placenta”, pontua Basso Filho. Nesse caso, terá de ser acompanhada também por um infectologista.

“Se a mulher já sabe que tem HIV, deve procurar seu infectologista assim que descobrir a gravidez. Ela tem de continuar tomando os medicamentos nas mesmas dosagens e frequência. Entretanto, existem alguns remédios contraindicados na gravidez”, explica Victor Hugo Melo, ginecologista e obstetra, especialista em pré-natal de risco e professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

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“Caso ela ainda não seja acompanhada por um infectologista, é hora de começar”, recomenda Jorge Senise, que atua em um centro de referência em tratamento de gestantes com doenças infecciosas, o Núcleo Multidisciplinar de Patologias Infecciosas da Gestação (Nupaig), filiado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). No Nupaig, a grávida recebe apoio multidisciplinar para ter uma gestação tranquila e baixar os riscos de contaminação do bebê. Além de grávidas com HIV, o espaço atende mulheres – gestantes ou não – com outras doenças infecciosas, como sífilis, toxoplasmose e hepatite. Lá, elas são atendidas simultaneamente por uma equipe com obstetra, infectologista, enfermeira obstetra, nutricionista e psicólogo. “Mais do que apoio médico, essas gestantes precisam de acolhimento. Não é só um problema de saúde, e sim social”, explica Abes Amed, professor adjunto do departamento de obstetrícia da Escola Paulista de Medicina, responsável pela assistência obstétrica à gestante do Nupaig. Isso porque, muitas vezes, a mulher não conta com uma estrutura familiar que a apoie durante a gestação. “Às vezes a família nem sabe que ela tem o vírus ou foi abandonada pelo companheiro. Fica fragilizada porque se sente sozinha e tem medo de que o bebê se contamine.” A falta de suporte em casa leva a outros problemas, como dificuldade financeira. 
 
Descobriu durante a gestação?

Outro ponto importante do quadro de ocorrências de HIV atualmente são as particularidades do contágio. Muitas vezes as mulheres pegam o vírus do companheiro e só descobrem no momento da gestação. “Por lei, o companheiro tem de avisar o outro de que tem o vírus”, afirma Amed.

Realizados o acolhimento e a orientação da gestante, é preciso se certificar de que a gravidez correrá normalmente e de que o bebê não será contaminado. Para isso, é feita a negativação da carga viral da mulher. Quanto menor for essa carga, menor o risco de contaminação da criança. O Ministério da Saúde preconiza que seja de, no máximo, mil cópias do vírus por mililitro de sangue. No Nupaig, a ideia é que a quantidade de cópias por mililitro de sangue seja desprezível, ou seja, abaixo de 50. Existem atualmente vários tipos de medicação que fazem o papel do famoso coquetel, e cada um deles é mais apropriado para determinada pessoa. A carga viral é baixada com medicamentos antirretrovirais que não tenham contraindicação para grávidas.

Por convenção do Ministério da Saúde, a medicação é administrada a partir da 14ª semana de gestação e mantida durante toda a gravidez. Caso a mulher já tome medicação antirretroviral liberada para gestantes, ela mantém até o fim da gestação. Alguns médicos recomendam que o tratamento com antirretrovirais seja iniciado a partir da 24ª semana de gestação, já que o segundo e o terceiro trimestre correspondem ao período com maior risco de contaminação. É preciso avaliar caso a caso e consultar o obstetra e o infectologista responsável pelo atendimento. Ainda não há consenso entre os médicos sobre a continuidade da medicação antirretroviral após o parto.
 
Contaminação na gravidez 

Se a contagem viral for mantida baixa com a medicação sendo tomada corretamente, é possível ter um bebê saudável. O exame de carga viral é feito periodicamente para acompanhar a evolução da paciente com a medicação. “Os antirretrovirais agem rápido para baixar a carga viral. Alguns deles conseguem diminuí-la drasticamente em poucas semanas”, afirma Amed.

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Senise explica que, nesses casos, a gravidez é considerada de risco e deve ser acompanhada por dois médicos – um obstetra e um infectologista. Na prática, a gestante conta com um suporte global, com enfermeiras obstetras, nutricionista e psicólogo. “Como o atendimento do obstetra e do infectologista é feito em conjunto, reunimo-nos e falamos com a paciente sobre a evolução da gravidez, a taxa de carga viral e o parto. Ela tem de ser orientada”, acredita Senise.
 
Evitando a contaminação durante o parto

A última contagem de carga viral é feita próximo ao parto, entre a 34ª e a 36ª semana de gestação. Em geral, o tipo de parto mais indicado para a mulher com HIV é a cesárea eletiva, feita cerca de dez dias antes da data prevista para que a mulher não entre em trabalho de parto. As contrações aumentam o bombeamento de sangue entre a placenta e o bebê, o que pode estimular a maior circulação do vírus. A ideia é que o bebê entre em contato o menos possível com o sangue e as secreções da mãe. Amed explica o processo da retirada da criança: “Fazemos o corte da cesárea e vamos descolando a bolsa das paredes uterinas. Quando ela estiver mais solta, puxamos para fora da cavidade abdominal e rompemos a bolsa depois que a cabeça do bebê já estiver para fora. Assim, ele não aspira as secreções e o sangue da mãe”.

Amed diz que, se a mulher desejar o parto normal, poderá fazê-lo, contanto que a carga viral seja indetectável. Deve-se também evitar que a bolsa fique rota por mais de quatro horas, para que o bebê não tenha contato direto com as secreções da mãe; o uso de fórceps, que pode causar escoriações na cabeça do bebê, criando uma entrada para o vírus; e a episiotomia, que põe a criança em contato direto com o sangue da mãe.

A mulher recebe o antirretroviral injetável durante o parto. No caso da cesárea eletiva, ele é administrado a partir de quatro horas antes do parto até o nascimento. O bebê toma um xaropinho de antirretroviral desde o nascimento até a sexta semana de vida.
 
O acompanhamento do bebê no pós-parto

Existem orientações diversas sobre o acompanhamento do bebê após o parto. O Ministério da Saúde defende que a criança faça dois testes de carga viral – um no primeiro mês de vida e outro no quarto – para certificar que a infecção não foi transmitida da mãe para o filho ao longo da gestação ou durante o parto. Se os dois resultados forem negativos, a conclusão é de que a criança não foi infectada. A infectologista Rísia Oliveira, responsável pelo ambulatório de gestantes do Centro de Referência de Treinamento DSCT/Aids de São Paulo, aconselha que a criança faça um acompanhamento com um infectopediatra até os 2 anos. “Somente após a realização de exames nesse período, o médico pode dizer se houve ou não a transmissão do HIV.” 
 
Amamentar pode?

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João Bortoletti Filho, coordenador do setor de medicina fetal do Hospital Santa Catarina e professor do departamento de Obstetrícia da Escola Paulista de Medicina, é enfático: “Ela não deve amamentar”. Rísia justifica: “Existem estudos que demonstram risco adicional de 7% a 22% de transmissão vertical por essa via. A gestante recebe medicação para inibição da lactação e o Ministério da Saúde fornece fórmula láctea infantil ao recém-nascido”. Segundo Senise, em alguns países da África a amamentação não é proibida porque existe um perigo maior do que a criança ser contaminada pelo HIV: ela pode morrer em decorrência de inanição ou contaminação por água com coliformes fecais. 

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