Recepção de embriões: técnica para engravidar custa menos, mas tem tabus
A “adoção” de embriões, como também é chamada, ainda gera resistência tanto em quem quer ter filhos quanto em quem pretende fazer a doação
A batalha contra a infertilidade é árdua e há diversas histórias de pessoas que tentam de tudo para conseguir engravidar. Felizmente, cada vez mais, a medicina reprodutiva evolui, aperfeiçoando as técnicas de reprodução humana assistida. Há várias opções disponíveis e uma delas é a embrio-recepção. Embora seja uma alternativa financeiramente mais viável em vários casos, ainda há certa resistência, tanto da parte de quem recebe os embriões, quanto de quem doa. Para entender melhor o assunto, conversamos com especialistas.
A recepção de embrião acontece quando o indivíduo que quer engravidar adota de outras pessoas um embrião já formado por gametas (óvulos e espermatozoides) que foi previamente fertilizado e congelado em uma clínica. “É uma opção bastante viável, principalmente para casais que precisam de espermatozoides doados e, simultaneamente, de óvulos doados, ou porque o companheiro masculino não produz espermatozoides em quantidade ou qualidade adequada ou a companheira feminina, por uma idade mais avançada ou qualquer outra questão, não produz óvulos”, explica o especialista em reprodução humana Paulo Gallo de Sá, presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana (SBRH).
A chance de engravidar com o processo, segundo ele, é de 30 a 40%. O médico afirma ainda que essa costuma ser a última alternativa para parceiros que não produzem espermatozoides e óvulos.
Menos gastos
Além de ser mais simples do que a fertilização in vitro com os próprios gametas (já que o casal não precisa passar pelo controle de ovulação, coleta de óvulos e coleta de espermatozoides), é mais econômica.
“Em média, a embrio-recepção custa por volta de R$ 8 a 10 mil, dependendo da clínica”, diz Gallo de Sá. “Acaba sendo muito mais barato que um tratamento de reprodução assistida [como a FIV], que fica entre R$ 30 e 35 mil”, compara.
No Brasil, vale lembrar, não é permitido comercializar material genético. Mas, se os embriões são doados, o que explica esse valor? De acordo com o médico, ele se deve a outros custos, referentes ao armazenamento e ao uso. “Não é cobrado pelo embrião e sim pela manutenção do embrião congelado até que ele seja utilizado, além do processo de descongelamento e a transferência embrionária”, explica.
Resistência em aceitar
Apesar de ser um método mais simples, que pula etapas da FIV e que custa consideravelmente menos, ainda há relutância das pessoas em adotá-lo. “Inicialmente, todo mundo quer ter um filho com material genético seu”, comenta o especialista. “Porém, para muitos casais que já tentaram ou sabem que não têm condições de produzir espermatozoides e óvulos de qualidade, essa é a única opção. De modo geral, as pessoas que aceitam são aquelas que não teriam alternativa”, acrescenta. Ainda assim, vale lembrar que qualquer indivíduo que deseje, ainda que não precise, pode adotar embriões para amenizar o custo da reprodução assistida.
Segundo a ginecologista especialista em reprodução humana Ana Paula Aquino, coordenadora do programa de doação de óvulos e embriões na Clínica Huntington, em São Paulo, mulheres na menopausa, que querem fazer produção independente, costumam buscar esse caminho. “Em vez de comprar óvulo e sêmen, adotam embriões já prontos”, explica. “Homens solteiros ou casais homoafetivos masculinos também podem pegar embrião pronto, em vez de ter que adotar o óvulo, além do útero de substituição [barriga solidária]”, complementa.
Doar também é tabu
Na maioria dos casos, as pessoas que optam por fazer a doação são aquelas que se submeteram a um tratamento de reprodução assistida, tiveram um número grande de embriões, já conseguiram engravidar e preferem doar do que descartar o excedente. “Mas também há resistência”, diz Paulo Gallo de Sá.
“Muitos casais, mesmo já tendo constituído sua prole, não querem doar porque têm aquela sensação de estar ‘doando um filho’”, explica ele, ressaltando que essa é uma barreira tem sido cada vez mais ultrapassada. “É um trabalho das clínicas de reprodução conversar com esses pacientes e mostrar que, da mesma maneira que eles tiveram dificuldades para engravidar e precisaram de tratamento de reprodução assistida, poderiam ajudar outras famílias que enfrentam problemas parecidos”, sugere.
Quando há opção por doação, o processo é simples: um documento é assinado e a clínica fica com os embriões até encontrar alguém que queira recebê-los. De acordo com o Conselho Federal de Medicina, a mulher precisa ter menos de 35 anos e o homem menos de 45. Eles também não podem ter nenhuma doença genética transmissível. “Antes de fazer o embrião, o casal passa por consulta com o médico durante o próprio tratamento e são feitos todos os exames”, diz Ana Paula.
Aceitei receber o embrião. E agora?
Quem decide receber um embrião pode recorrer à clínica de fertilização. “A partir das características físicas do casal que doou, como peso, altura, cor de olho, cor de cabelo e tipo de sangue, a equipe seleciona embriões com compatibilidade sanguínea e mais parecidos com os receptores, antes de oferecer”, diz Ana Paula. Como, em geral, são embriões de parceiros que já engravidaram de bebês saudáveis, eles não precisam passar por novos testes específicos, como os genéticos ou de sorologia.
Como qualquer procedimento médico, a embrio-recepção tem riscos. “Também não existe nenhum exame que garanta a saúde de um embrião ou de uma criança, nem mesmo aqueles testes de biópsia embrionária. Eles diminuem a probabilidade de riscos, mas há muitos fatores que podem levar um bebê a nascer com malformações e eles são muito variáveis, vão muito além das alterações genéticas”, reforça Gallo de Sá.
É possível implantar mais de um embrião em um mesmo ciclo? “A conduta médica correta é transferir um embrião de cada vez”, explica o médico. “Se a mulher engravidar, tiver o bebê e depois quiser tentar outra gravidez, com um novo embrião doado, o processo é repetido”, diz.
Identidade sob sigilo
No Brasil, as técnicas de reprodução assistida são reguladas pelas resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM), que determinam que a doação e a recepção de embriões devem ser anônimas. “Além do casal que recebe não saber quem doou, quem doou não pode saber para quem foi doado”, diz o especialista.
No Brasil, a criança só tem direito de conhecer a origem dos embriões caso a vida dela esteja em risco por alguma doença grave que requeira, por exemplo, um transplante de alguém que seja parente consanguíneo, para ter compatibilidade. “Somente nessas situações raras é que o juiz pode quebrar o sigilo da doação e da recepção”, completa.