Os impactos da nova política de educação que separa alunos com deficiência

A principal preocupação é de que a nova Política Nacional de Educação Especial leve escolas regulares a negarem crianças com deficiência.

Por Alice Arnoldi
6 out 2020, 16h54
 (FatCamera/Getty Images)
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No dia 30 de setembro, o presidente Jair Bolsonaro instituiu a “Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida”, publicada no Diário Oficial da União. Os artigos trazidos no documento têm gerado opiniões divergentes por permitir a criação de escolas e salas especializadas, isto é, apenas com estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento (como autismo), altas habilidades ou superdotação.

Um dos artigos que causou divergência é o sexto, que diz: “Instituições de ensino planejadas para o atendimento educacional aos educandos da educação especial que não se beneficiam, em seu desenvolvimento, quando incluídos em escolas regulares inclusivas e que apresentam demanda por apoios múltiplos e contínuos”. Ou seja, a ideia seria criar escolas especializadas para estudantes com deficiência que não se adaptaram as escolas inclusivas. 

Já o sétimo artigo detalha outro ponto também criticado, que é a definição de classes especializadas, que serão organizadas dentro de escolas regulares. “Com acessibilidade de arquitetura, equipamentos, mobiliário, projeto pedagógico e material didático, planejados com vistas ao atendimento das especificidades do público ao qual são destinadas, e que devem ser regidas por profissionais qualificados para o cumprimento de sua finalidade”, pontua o decreto. 

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Mas isso significa mais inclusão?

Na teoria, a nova política pode ser vista como uma gama a mais de possibilidades para pais com filhos com deficiência. Entretanto, o que defende Roseli Olher, supervisora do Atendimento Educacional Especializado (AEE) do Instituto Jô Clemente (antiga Apae de São Paulo), é que o decreto é um retrocesso nos direitos de pessoas com deficiência.

“Com certeza esta nova política traz de volta práticas inconstitucionais, porque não reconhece os avanços que tivemos desde 2008, com a política de educação especial na perspectiva inclusiva. Sabemos que ainda há muito para se fazer, mas vínhamos de um processo de evolução, empoderamento, visibilidade e respeito dessas pessoas estarem juntas no mesmo ambiente que qualquer outra pessoa – o que é um direito delas. E infelizmente ele está sendo violado”, reforça Roseli.

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As consequências desta nova política

A primeira delas é a possibilidade de uma segregação que afete negativamente tanto as crianças com quanto as sem deficiência. “Muitas escolas vão passar a negar a vaga, porque agora elas podem. E, pior ainda, vão indicar as escolas especiais para essas pessoas”, explica a supervisora.

O mesmo é apontado por Michelli Freitas, psicopedagoga e diretora do Instituto de Educação e Análise do Comportamento (IEAC). “Cada caso é um caso, e deve ser avaliado visando as necessidades individuais, bem estar de cada um já que temos populações bastante heterogêneas. O grande problema é que se comece a não incentivar a inclusão, que as pessoas não se esforcem pra que ela dê certo, e já encaminhem estas crianças para fora da educação regular”, esclarece.

Outra justificativa para quem defende a nova política é de que ela possibilitará o contato de pessoas com deficiência apenas com profissionais capacitados, o que diminuiria as possibilidades de situações preconceituosas e ensinos não inclusivos.

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“Só que o ponto é exatamente de que o profissional precisa entender que ele precisa estar apto para ensinar diversos tipos de crianças. E não só aquelas ditas mais “fáceis” de ensinar. O problema é que temos no ambiente educacional não só crianças com atrasos no desenvolvimento, mas também aquelas com dificuldades ou transtornos de aprendizagem. E se começarmos a retirar do ambiente educacional as crianças que fogem ao padrão poderemos começar um processo de segregação bastante perigoso“, completa a especialista.

A indagação de Michelli também continua para refletirmos quais exemplos estamos dando às crianças que não têm deficiência ao fazermos esse tipo de separação dentro das escolas. Elas aprenderão a respeitar as diferenças desde cedo?

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Roseli finaliza apontando que a implementação desta nova política volta para uma questão mais profunda à sociedade: a culpabilização do indivíduo e não o olhar atento para as falhas do sistema.

“Eles estão colocando a culpa na pessoa com deficiência, de que é ela quem não consegue acompanhar. E não no sistema que não está bem desenvolvido para receber essas pessoas. Infelizmente, o que falta nesse governo é um investimento maior nas escolas públicas, melhorar a capacitação de profissionais, e qualidade de ensino com recursos e materiais acessíveis para todas as pessoas”, reforça a supervisora.

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