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Como conscientizar crianças autistas sobre o que é coronavírus

A ideia é apostar em demonstrações visuais e que sejam objetivas para ajudar os pequenos a entenderem o que é o Covid-19.

Por Alice Arnoldi
Atualizado em 2 abr 2020, 15h40 - Publicado em 2 abr 2020, 15h24

Com as diferentes informações que surgem diariamente sobre o coronavírus (Covid-19), e o incentivo ao isolamento social por todo o mundo com o intuito de diminuir o número de casos confirmados da doença, os impasses dentro de casa ficam maiores. Entre negar uma ida ao parque do condomínio ou uma visita rotineira à avó, pais também precisam explicar o porquê dessa mudança de vida repentina. E para as crianças dentro do Transtorno do Espectro Autista (TEA), esse esclarecimento precisa ser feito de forma mais cautelosa.

O primeiro passo é entender que elas, na maioria das vezes, compreendem com mais facilidades os assuntos quando são tratados visualmente e objetivamente. “Crianças com autismo entendem muito melhor quando você se utiliza de figuras, formas geométricas, filmes com desenhos, ou seja, de uma forma visual e concreta, sem nenhum tipo de informação abstrata ou subliminar.”, explica Clay Brites, neuropediatra do Instituto NeuroSaber.

Com a internet, muitos personagens queridinhos dos pequenos ganharam espaço nas redes sociais com histórias que explicam a doença e a importância de lavar as mãos. Para as crianças autistas, também vale usá-las, só que é importante fazer um filtro para escolher as que são mais objetivas.

Além disso, os pais também podem criar as próprias narrativas de acordo com as preferências do filho. Michelli Freitas, psicopedagoga e diretora do Instituto de Educação e Análise do Comportamento (IEAC), enfatiza que, para esse processo, os adultos precisam ter bem esclarecido o que querem passar às crianças. É como o vírus se parece? O que é isolamento social? Ou o porquê de lavar as mãos com frequência? 

Com o objetivo da história definido, o próximo passo é encontrar os recursos visuais que irão representá-la melhor. “É pensar: como eu consigo traduzir em imagens aquilo que eu quero falar? Quanto menos palavras, melhor, pois crianças com autismo têm um prejuízo grande da linguagem. Portanto, se falar demais, elas não vão entender.”, ressalta Michelli.

A especialista ainda aconselha os pais a optarem por fotos reais na hora de construir a narrativa para o filho, pois crianças autistas tendem a compreendê-las melhor pela associação direta com a realidade.

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Só que mesmo com uma explicação elaboradora do que é o coronavírus, não é fácil de entender a dimensão da doença, ainda mais para os pequenos dentro do espectro. Mas a tendência é que eles consigam assimilar o primordial.

“Sabemos que 50% das crianças com autismo têm deficiência intelectual, outras são não verbais, ou têm dificuldade de entender comunicação. Portanto, muitas vezes elas vão ter, nesse contexto, muita dificuldade de entender a magnitude e as consequências que o coronavírus pode ter na vida social. Mas entender o que é o vírus, onde ele vive, da onde ele vem e para onde vai, isso vai ser muito mais simples delas entenderem.”, enfatiza Clay.

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Como ensiná-las a lavar as mãos?

Junto com a importância de tornar a doença algo mais real para as crianças autistas, há também a necessidade de ensiná-las as medidas de prevenção. A principal delas é a limpeza das mãos com frequência.

“Quando vamos ensinar uma habilidade que é composta de diversas etapas, como lavar as mãos (que pode ter até dez passos), é preciso pensar em dividi-la em pequenos pedaços”, explica Michelli. Isso significa que os pais vão fazer com os filhos o passo a passo da higienização.

“Vai pegar na mãozinha da criança, para fazer com que ela consiga esfregar as mãos. Vai abrir a torneira e pegar o sabão junto, e assim os pais vão fazendo junto com o filho parte por parte”.

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O uso de vídeos mostrando a técnica também pode ajudar, mas é preciso saber quando fazê-lo. “Uma demonstração visual do processo, em um segundo momento, pode ser bacana para estimular a independência e autonomia da criança. Ou seja, sai a presença do adulto, dando essa ajuda mão na mão, e entra um apoio visual. Mas só depois que o pequeno estiver conseguindo fazer a lavagem com menos ajuda do adulto.”, esclarece a psicopedagoga.

E para contornar o ato de levar a mão à boca?

Clay ressalta que a lavagem frequente das mãos continua a ser a medida mais efetiva para prevenir pais e filhos do coronavírus, principalmente se a criança estiver acostumada a tocar a boca repetitivamente – como pode acontecer com quem está dentro do espectro.

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“Precisa ser mais intensificada a lavagem de mãos nas crianças com autismo porque é muito fácil que ocorra situações que os pais podem não perceber e criança colocar a mão na boca. Portanto, é necessário lavar as mãos várias e várias vezes ao longo do dia, porque é uma criança – que por mais que você crie modelos e formas de reduzir isso, uma vez ou outra ela vai acabar colocando a mão na boca.”

Entretanto, isso não significa que os incentivos visuais devam ser deixados de lado. Em paralelo com a atenção à frequência com que a limpeza das mãos ocorre, o neuropediatra aconselha os pais a investirem nas histórias sociais.

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“É uma historinha que você cria para que a criança imagine, ou pela descrição da história social, aprenda a proceder em uma determinada situação de forma construtiva. Ou seja, ela vai aprendendo na historinha como poderia fazer igual ao personagem para conseguir aquilo que ela quer”.

Nessa situação, Clay dá o exemplo de uma narrativa em que o personagem principal demonstra que colocar a mão frequentemente na boca pode acabar machucando-a. Só que é preciso estar atento para que a história caminhe para um final positivo, ou seja, deve acontecer algo bom com o amiguinho que parou de fazer o movimento repetitivo. Isso é importante para que a criança assimile o processo por meio de um sentimento otimista e não assustador.

(Juliana Pereira/Bebê.com.br)
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