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Sobre o desmame noturno e a frustração materna

Filhos não vêm com manual de instruções e, na prática, tudo é diferente da teoria. Confira o relato de uma mãe que fala sobre as dificuldades que enfrentou ao optar por aquilo que acreditava ser o melhor para o seu filho.

Por Luísa Massa
Atualizado em 20 jul 2017, 20h54 - Publicado em 4 Maio 2015, 08h03

Karen Bussacarini, 27 anos, é mãe do Gustavo, de 1 ano e 6 meses, arquiteta e idealizadora do blog Mamãe de Casa. Aqui, ela conta sobre como foi decidir que não tiraria as mamadas de madrugada da rotina do seu filho. Confira!

“Você já parou para pensar na quantidade de livros que ensinam como você deve agir com os seus filhos, desde o momento em que eles chegam do hospital? São inúmeros títulos e eu posso dizer que li a maioria deles na gestação. Sabia de todas as técnicas de encantamentos, tomei nota de como os franceses educam suas crias, decorei todos os passos para que o bebê tivesse doze horas de sono nos primeiros meses de vida. Na teoria, estava tudo perfeito!

Uma coisa que não te contam nesses livros é que filhos não vêm com manual de instruções, afinal, eles são seres únicos. Isso não parece óbvio?! Pois é, agora eu preciso confessar uma coisa para vocês. Hoje faz 18 meses que eu não durmo mais do que 3 horas seguidas. (Parece até uma daquelas frases que se diz em reuniões de grupos anônimos!).

Vou explicar melhor: o Gustavo sempre mamou muito bem, era um bebê do tipo comilão e, apesar de eu ter amamentado em livre demanda, ele mesmo regulou seu apetite para o intervalo de 3 horas já nos primeiros dias de vida.  Mas quando ele completou 9 meses, me bateu os “5 minutos” e eu decidi que queria dormir a noite toda – era a hora de fazer o desmame noturno. 

Li tudo o que pudesse me ajudar, ouvi diversos conselhos e palpites, estava munida de todas as informações para fazer aquilo acontecer. Sabia que não seria fácil, mas que em 3 noites, milagrosamente, tudo funcionaria, afinal, é o que dizem por aí. Uma coisa era certa: jamais deixaria o meu filho chorando sozinho no berço, como algumas técnicas cruéis indicam fazer. Poderia chorar, mas nunca sozinho.

Na primeira noite, Gustavo acordou à meia-noite, religiosamente. Fui até a rede (sim, na época ele dormia na rede), cantei, ninei, deu certo! Ele voltou a dormir depois de 20 minutos de resmungos. Duas horas e meia depois, a mesma coisa. Às cinco da manhã aconteceu igual. Às 6h, ele acordou novamente, aí eu o amamentei. A segunda noite foi muito parecida, o que foi mudando foi o tempo que ele demorava para voltar a dormir. Algumas vezes eram os 20 minutos, outras 10 e outras, com muita sorte, só 5 minutinhos.

Parecia tão fácil! Um sucesso! Claro que eu ainda estava acordando de 3 a 5 vezes por noite, aliás, precisava de muito mais energia para estar ali pacientemente cantando e embalando, do que se estivesse amamentando. Mas fazia parte! A terceira noite do processo – que dizem que é o marco, onde a criança entende que aquele é o fim da amamentação noturna – foi bem difícil. Dessa vez ele chorou de verdade, não apenas resmungou. E foi assim a noite toda, como das noites anteriores, porém com mais choro. 

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A quarta, quinta, sexta e sétima noites foram iguais – tão cansativas e tão exaustivas quanto a terceira. Meu leite? Jorrava e meus seios ardiam, parece que chamando pelo Gustavo. Eu me perguntava o porquê daquilo tudo. Por que havia passado mais de três dias e as técnicas não tinham funcionado? Por que ele não deixava de mamar a noite? Por que eu estava fazendo aquilo com nós dois? Por que as pessoas me criticavam tanto por amamentar na madrugada? Por que a sociedade impunha a regra de que o bebê tem que parar de mamar e dormir uma noite inteira, sem acordar? Por quê?

Na sétima noite, uma amiga me disse que agora daria certo – ao completar uma semana do desmame noturno tudo mudaria. Nesses dias, os primeiros dentinhos do Gustavo estavam nascendo e ele começou a não comer bem as papinhas e frutas. Nem preciso dizer o óbvio, né?! Ele não pegou mamadeira – nunca. Então, se alimentando mal, eu comecei a achar que aquilo poderia ser fome – contradizendo toda a humanidade. Isso me preocupou. Apesar de ter um filho sempre bem acima da média de peso e altura, qual mãe não se preocupa ao pensar se seu pequeno está comendo mal? Qual mãe não se desespera ao imaginar que possa estar negando a única fonte de alimento que seu filho precisa? Isso chega a doer!

Na oitava noite, eu desisti de tentar. Perdi uma batalha que eu mesma havia travado e percebi que em oito dias, eu perdi oito noites de sono. Eu descobri que o meu filho não se enquadra em técnicas teóricas escritas por pessoas que tem bebês perfeitamente capazes de se adaptar às suas necessidades. Entendi que aquele não era o momento de tirar as mamadas noturnas e que eu deveria conviver com aquilo.

Não foi fácil encarar isso, aceitar a derrota. Mas faz parte da maternidade. Enxerguei que ter leite materno em volumes incalculáveis aos 9 meses era uma dádiva divina, já que tantas mães não conseguem amamentar o filho nem até o terceiro mês sem complemento. Lá fomos nós, felizes da vida, acordar de 3 em 3h para a amamentação.

Quando Gu fez 1 ano e 1 mês, um grupo de mães que participava começou a falar sobre o desmame noturno. Aquilo me incomodou muito. A derrota bateu à minha porta e disse “agora está na hora!”. E lá fui eu tentar colocar todas as velhas técnicas – já sabidas falíveis – em prática! Nesse momento eu estava tomada pelo cansaço físico e emocional, coisa muito natural da maternidade. Minha menstruação havia voltado e, não sei se por motivos hormonais, me deu uma vontade louca de parar de amamentar.

Recolhi todas as minhas armas e fui para a minha Segunda Guerra Mundial. Agora o inimigo estava muito mais inteligente e ágil. Quase impossível de combater. Com um par de pulmões extremamente poderosos, Gustavo chorava quase a ponto de derrubar as paredes. Eu nunca o deixava sozinho, mesmo assim, aquilo partia meu coração em frangalhos. Nessa época ele já dormia no berço e na hora em que acordava para mamar ficava em pé, com os bracinhos esticados, pedindo “mãmã“.

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Ele gritava, berrava, perdia o ar e 40 minutos depois eu cedia, porque sou fraca, não sou perfeita. Arrumava mil desculpas: “hoje ele não jantou muito”, “depois de tanto chorar o nariz entupiu e só mamando vai desentupir”, “já deve estar com dor de cabeça de tanto chorar”. Eu sabia que não deveria deixar, que sempre que cedia eu voltava à estaca zero. Mas eu permitia. Foi assim por duas noites. Ele chorava, eu tentava, desistia e deixava que ele mamasse. Tudo errado, eu sei.

Na terceira noite eu estava tão exausta, mas ainda queria tentar. Em um desses momentos da primeira mamada, em que ele se esgoelava a plenos pulmões, eu saí do quarto dele. Sabe aqueles 2 minutos que você precisa ficar sozinha, respirar um ar puro e repensar suas escolhas? Nem chegou a dois minutos, mas um estrondo veio do quarto dele e quando corremos pra lá o encontramos estatelado no chão, com os olhos arregalados de medo, sem nem entender o que aconteceu. Pois é, ele pulou do berço e caiu de cabeça.

Nem preciso contar o meu desespero, o sentimento de culpa e ódio-próprio que eu senti por horas, dias  aliás, que ainda o sinto! Prometi que nunca mais tentaria desmamá-lo a noite, que esse processo iria acontecer de forma natural, nem que eu precisasse fazer isso pelos próximos anos. Para facilitar a minha vida noturna, aderimos à cama compartilhada.

Desde sempre tive muito leite e percebia que o Gustavo mamava até esvaziar o seio e quando estava satisfeito, largava o bico, empurrava e virava para o outro lado e voltava a dormir. Uma noite dessas, com preguiça de virá-lo de lado, dei o mesmo seio às 2h e depois às 5h, mas esse seio estava vazio. O Gustavo chupava duas vezes, largava e resmungava bravo. Fez isso umas três vezes até eu me dar conta do que estava acontecendo. Quando o virei e dei o outro seio cheio, ele mamou, mamou, mamou, se saciou, virou pro outro lado e dormiu. Isso se repetiu mais umas duas vezes e me fez pensar: se elequisesse chupetar era só chupetar, mas ele queria leite!

Precisei passar por todas essas experiências para entender que o meu filho é diferente da maioria dos bebês, ele tem fome sim! Espero que, com esse relato cheio de insucessos e sentimentos reais, você que está passando pela mesma situação, sinta-se abraçada! Esqueça o que a sociedade, as palpiteiras e os livros dizem. Viva sua vida e amamente o quanto quiser. Permita-se o direito de ter os seus 5 minutos de desespero, pensando que sua criança nunca vai desmamar, mas retorne, redobre toda aquela sua energia de mãe que ainda amamenta e seja feliz! É assim que eu estou tentando viver.”

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