Pé torto congênito: como é o tratamento desde a primeira semana do bebê

Mais conhecido como PTC, é uma deformidade em que o bebê nasce com os pezinhos virados para baixo e costuma ser diagnosticado ainda na gestação.

Por Manuela Macagnan
17 out 2021, 10h00
Bebê com pé torto congênito
 (AGLPhotoproductions/Getty Images)
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O Pé Torto Congênito, mais conhecido como PTC, é uma deformidade onde o bebê nasce com os pezinhos virados para baixo e se curvam para dentro, um pé em direção ao outro. É uma alteração nos ligamentos, músculos, tendões e ossos do pé e acontece ainda na gestação. Em até 50% dos casos, a doença acomete os dois pés, mas também pode acontecer em apenas um dos pezinhos.

“Também são percebidos a presença de uma parte posterior da perna (panturrilha) mais fina e o pé e a perna um pouco menores do que deveriam ser. Apesar disso, o bebê não sente dor”, explica a pediatra Roberta Virna.

Apesar de ser considerada uma das malformações congênitas mais comuns, ocorrendo, segundo estatísticas mundiais, em 1 a cada 1000 bebês nascidos, a ciência ainda não sabe exatamente quais genes resultam a deformidade. “As causas não são definidas, mas sabemos que há o fator hereditário: se o pai ou a mãe da criança teve PTC, a criança tem maior chance de ter”, explica Carolina Santini, ortopedista pediátrica e neuro-ortopedista.

Atenção para o ultrassom!

O PTC costuma ser identificado ainda durante a gestação, através das ultrassonografias. “É possível diagnosticar antes do nascimento, sim, mas a ecografia é um exame que depende de quem faça, então é importante buscar um ecografista que saiba localizar este problema no exame, com medidas e outros meios”, alerta Carolina.

Quando o problema é diagnosticado, os pais já podem agendar com seu ortopedista e pediatra de confiança para receber orientações, tirar dúvidas e já ter informações sobre o plano de tratamento. 

“Quando o bebê nasce, o diagnóstico é feito ou confirmado através da análise da forma e flexibilidade do pé. Exames de imagem, raramente são necessários”, completa Roberta.

De acordo com a posição e flexibilidade encontradas no pezinho, a alteração pode ser apenas postural e se corrigirá espontaneamente (pé torto postural). No entanto, se o diagnóstico de pé torto congênito for confirmado, o tratamento precisa ser iniciado. 

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O tratamento começa cedo

De acordo com a ortopedista pediátrica Carolina, o tratamento deve ser iniciado na primeira semana de vida. “Utilizamos o método Ponseti, que é difundido em todo o mundo e é o que apresenta melhores resultados. Ele consiste em trocas de gesso seriadas, uma vez na semana. Com o fim das trocas, é necessário fazer uma pequena cirurgia de liberação do tendão para terminar de corrigir a deformidade que não conseguimos apenas com o gesso. Em 90% dos casos é necessário fazer essa cirurgia”, pontua. 

Criança usando gesso, parte do tratamento de pé torto congênito
(BRIAN MITCHELL/Getty Images)

Depois disso, a criança tem que usar uma órtese noturna (um tipo de “botinha”) até os 4 anos de idade, porque o gene do PTC fica ativo até esta idade e fica mandando sinais para que o pé volte à posição inicial, torta”, explica Carolina.

O tratamento do pé torto congênito acaba sendo um desafio muito maior para os pais do que para a criança. Exige paciência e dedicação e não deve ser negligenciado, pois se a deformidade não for tratada, a criança terá dificuldade para usar calçados e até para caminhar.

“O ideal é que se inicie o tratamento na primeira semana de vida e, se isso não for feito, as outras opções são cirurgias mais extensas quando a criança é mais velha”, enfatiza a ortopedista pediátrica.

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Tratamento feito com sucesso, é preciso observar. “É importante que a criança seja acompanhada por toda a fase de crescimento, pois as recidivas devem ser prontamente tratadas para que seja garantido todo o potencial de normalidade à criança”, completa Roberta, que tranquiliza os pais. “Fiquem confiantes, pois hoje temos profissionais especializados e tratamento correto. Procure seu pediatra e um ortopedista pediátrico especializado e eles saberão ajudá-los a passar por este momento cheio de desafios e alcançar o sucesso no tratamento”.

A seguir, o relato de Paula Barbara Boque, mãe de Maísa, que tem 5 anos e PTC no pezinho esquerdo, é um sopro de esperança para os pais que estão começando o tratamento agora. “Maísa tem uma vida como de qualquer outra criança: corre, brinca, anda de bicicleta. A única limitação é no momento que a gente tem que usar a botinha para ela dormir”, conta e completa: ” A força que a gente tem neste momento que vai fazer a diferença para os nossos filhos lá na frente”. 

Confira o relato na íntegra:

“A maioria dos casos de PTC é identificada no exame de ultrassonografia, durante a gravidez. Nós descobrimos o pé torto congênito no parto e foi um susto. 

O tratamento da Maísa foi com o método Ponseti e começou ainda na maternidade. Saímos do hospital já com gesso. São feitas trocas semanais: o médico vai posicionando o pezinho até o limite que ele pode colocar, indo para o lugar certo e faz as trocas de gesso. Posiciona o pé, engessa, e assim o pezinho fica durante uma semana.

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No caso da Maísa, foram 5 ou 6 trocas de gesso. Quando o pé chega ao lugar que o médico quer, é feita a cirurgia de liberação do tendão, para a criança ter o movimento do pé para cima e para baixo. Como esse tendão é entortado, o movimento é limitado, como se fosse um pé de bailarina.

Depois da cirurgia, ela engessou o pé novamente e, após 21 dias, começou a usar a órtese de Dennis Brown (estrutura que mantém o pé na posição indicada pelo médico). Nos primeiros três meses, ela usou a órtese o dia inteiro – só é liberado tirar duas vezes por dia, para dar banho na criança.

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Depois dos três meses, a órtese é utilizada 14 horas por dia até os 4 anos, porque até esta idade, a chance de o pé voltar a entortar é muito grande. Depois disso, a chance diminui, mas ainda existe. É a recidiva e foi o que aconteceu com a Maísa. 

Hoje ela está com 5 anos e teve a alta da bota quando fez 4 , mas seguimos acompanhando. Num primeiro momento, o pezinho dela estava ok, mas fomos observando que ele estava para dentro.

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Tentamos fisioterapia por seis meses, mas não deu o resultado que a gente esperava e o médico deu como alternativa retomar o uso da órtese para dormir e chegar a um resultado legal para este pezinho voltar para o lugar. Caso a gente não consiga, vamos ter que retomar o tratamento do zero: gesso, cirurgia e uso novamente da botinha para conseguir um resultado melhor.

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Maísa tem uma vida como de qualquer outra criança: corre, brinca, anda de bicicleta. A única limitação é no momento que a gente tem que usar a botinha à noite. Aí ela não tem como caminhar, então a gente calça e ela já sabe que tem ficar paradinha. 

A preocupação em relação a vida adulta é de ela sentir um pouco de dor. Quando, por exemplo, for usar salto, mas a gente sabe também que adultos que tiveram PTC praticam esportes e têm uma vida como dos outros. Mas todo pai, toda mãe têm os seus medos.

Além disso, outro receio é a questão da parte estética, porque ela tem a diferença de uma numeração de um pezinho para o outro, mas a gente imagina que ela vai lidar com isso da melhor forma possível. A panturrilha fica um pouco menor do que a outra perna, mas procuramos não dar ênfase a isso, porque queremos que ela lide com leveza.

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Para os pais que estão enfrentando o mesmo desafio, peço que nunca se esqueçam que o tratamento é muito mais difícil para a gente do que para a criança, que costuma se adaptar facilmente.

Nós é que moldamos os nossos filhos a enxergarem este tratamento da forma como a gente enxerga. Aqui em casa, levamos com muita alegria, sempre falamos que a botinha era amiga da Maísa. Quando ela era bebê, a gente ensinava ela a beijar e abraçar, cantávamos uma música divertida quando íamos calçá-la. Criamos até uma música (risos)! E a hora de tirar nunca era comemorada. Tirávamos a botinha como se estivéssemos tirando um calçado qualquer, para ela não associar este momento com uma festa. A festa era para colocar!

Com o bebê é muito mais fácil. A criança vai crescendo e vai ficando mais difícil. Tivemos que retomar o uso da botinha e a Maísa aceitou, entendeu, mas tem dias que ela diz que não quer, pede para dormir sem e a gente diz que não, que faz parte do tratamento dela.

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A fase de adaptação do uso da órtese é difícil para os pais e para as crianças, só que a gente não pode ceder, senão você vai estar prejudicando o filho lá na frente. Quando a Maísa colocou a órtese, eu dei muito colo pra ela. É como colocar aparelho nos dentes: nos primeiros dias causa desconforto e dor, mas depois a gente vai se acostumando.

O recado que tenho para dar para os pais é que perseverem, que não desistam, porque é a força que a gente tem neste momento que vai fazer a diferença para os nossos filhos lá na frente.

As pessoas que têm a oportunidade de oferecer o tratamento para o filho, que façam da melhor maneira possível. Não tenham dó, não enxerguem como ‘coitados’ por terem que usar a órtese e, sim, como crianças que são guerreiras, seres abençoados, que vieram para nos ensinar a ter resiliência e fé.”

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