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É verdade que o uso excessivo de telas pode causar miopia nas crianças?

O prejuízo do contato constante com smartphones e tablets é ainda maior para crianças menores de dois anos e há uma explicação médica para isso.

Por Alice Arnoldi
Atualizado em 3 Maio 2021, 11h54 - Publicado em 14 abr 2021, 12h33

No desenvolvimento do segundo ano consecutivo da pandemia causada pelo novo coronavírus, a comunidade médica junto aos pais observam cada vez mais os reflexos da doença na vida das crianças. Os pequenos têm enfrentado percalços emocionais devido a falta de contato físico, ganho de peso pela ausência de atividades físicas na rotina e até mesmo a visão não escapa de consequências negativas do período de isolamento.

Publicado no início deste ano no periódico JAMA Ophthalmology, um estudo realizado com crianças chinesas trouxe os primeiros dados em larga escala sobre a pandemia estar aumentando os casos de miopia entre o público infantil. A pesquisa mostrou que, enquanto a incidência do problema oftalmológico era de 5,7% entre crianças com seis anos, durante os anos de 2015 a 2019, o número saltou para 21,5% em 2020, dentro da mesma faixa etária. O acréscimo também foi observado entre os menores de sete e oito anos.

O estudo ainda indica que esse aumento abrupto dos casos também está relacionado com a falta de atividades ao ar livre e a quantidade de tempo que as crianças forçam o olhar para algo muito perto, como nas aulas virtuais e nos joguinhos em tablets e celulares.

Smartphones e tablets são mais perigosos antes dos dois anos

A oftalmologista pediátrica Ana Carolina Cassiano, da clínica EyeKids, em São Paulo, enfatiza que este cenário indica que, além da pandemia causada pelo novo coronavírus, também vivemos um surto de miopia entre as crianças.

Junto a um fator genético da miopia, em que há uma pré-disposição do paciente para desenvolvê-la, a especialista explica que a ocorrência do problema visual também pode acontecer entre crianças pequenas pelo contato excessivo com as telas. E o risco de prejuízo é ainda maior para as menores de dois anos, já que possuem um tecido ocular maleável e que se deforma com facilidade, levando ao surgimento da miopia.

Ainda de acordo com a oftalmologista pediátrica, o problema visual tão comum aos brasileiros leva à necessidade de correção do grau e tende a surgir a partir de dois fatores. “O primeiro é o tamanho do globo ocular, que é maior do que o ideal, e o segundo é a córnea muito curva”, detalha.

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Em um olho sem miopia, a imagem captada visualmente passa por duas lentes naturais chamadas córnea e cristalino. Eles fazem com que ela seja comprimida e depositada em cima da retina, um tapete de células fotorreceptoras que enviam a informação para o cérebro. Já quando o paciente é míope, isso significa que a imagem captada está sendo depositada antes da retina, devido a um globo ocular mais longo ou pelas lentes naturais estarem convergindo.

E um dos motivos que leva o globo ocular aumentar além do necessário, ocasionado o problema visual, é o uso demasiado de telas no início da vida. “Smartphones e tablets são relacionados ao desenvolvimento da miopia, porque uma criança pequena não fica lendo um livro ou brincando em algo de montar por horas, mas nos aparelhos eletrônicos sim. E, para isso, ela fica usando a visão de perto, o que acaba estimulando os receptores muscarínicos e isso causa o crescimento ocular”, explica Ana Carolina.

E se no início da pandemia falava-se sobre reservar alguns minutinhos da rotina para tomar sol e aumentar a imunidade do organismo, saiba que estudos também suspeitam que a falta de contato com a luz natural do dia a dia pode contribuir para o surgimento da miopia devido a baixos índices de vitamina D. “Só que quando falo sobre ficar exposto à luminosidade natural, não precisar ser ficar embaixo do sol. É apenas estar em um ambiente externo aberto”, ressalta a oftalmologista pediátrica.

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Ana Carolina ainda explica que pesquisas inicias indicam que atividades físicas ou pausas diárias para ver algo além das telas ajudam as crianças a olharem com frequência para longe, o que também contribui para evitar a progressão da miopia – já que o problema visual se dá principalmente quando a visão de perto hiperestimula os receptores que aumentam o tamanho do globo ocular.

Sinais de que a criança pode ser míope 

A especialista pontua que os pais precisam levar a sério quando as crianças sinalizam dificuldade de enxergar algo. Já os menores que ainda não são verbais, é preciso ficar atento a comportamentos que podem estar relacionados à miopia.

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O primeiro sinal é quando o pequeno demonstra mais interesse por smartphone e tablets, já que podem ser segurados próximos ao rosto, e descartam a televisão. Ou, ao assistirem ao aparelho, eles se levantam do sofá para chegar mais próxima a ele.

Ações que demonstram insegurança também podem estar relacionadas ao problema visual. Por não conseguir focar em objetos ou pessoas distantes, a criança opta por não desbravar novos caminhando e fica sempre próxima de um responsável. O mesmo vale para quando ela demora para responder a um chamado de alguém distante dela, pois não está enxergando-o.

O atraso de fala também pode estar ligado com o problema visual. Ana Carolina esclarece que isso acontece porque o pequeno não consegue fazer a leitura labial dos pais ou professores e, consequentemente, há o prejuízo do desenvolvimento verbal.

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O que fazer ao suspeitar que meu filho é míope? 

Como qualquer outra doença, é fundamental que os responsáveis pela criança trabalhem na prevenção do surgimento da miopia. A oftalmologista pediátrica orienta os pais a incentivarem os pequenos a terem contato com a luz do natural do dia a dia por meio de janelas abertas em casa, atividades ao ar livre e pausas durante a rotina que, por meio de uma brincadeira lúdica, a criança seja induzida a olhar para longe.

Sobre o uso excessivo de telas, é importante que entre tablets, celulares e televisão, os pais dêem preferência para a última. Assim, é melhor que as aulas online sejam assistidas em computadores com a tela a 60 centímetros de distância dos pequenos ou seja espelhada em uma TV para garantir o estímulo da visão longe.

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Além disso, é fundamental estar atento aos exames periódicos de visão. O primeiro check-up deve ser feito entre os seis meses do bebê até o primeiro ano. Após esse período, a visita ao consultório médico deve ser anual e o médico precisa dilatar a pupila para conseguir aferir corretamente o grau.

Se neste meio tempo, os pais perceberem sinais que mostrem um comportamento visual diferente do filho e que podem ser reflexo de miopia, é importante levá-lo a um oftalmologista pediátrico antes do exame anual. Caso contrário, esse grau pode ir aumentando cada vez mais e, ao chegar no consultório médico, o prejuízo ser maior do que o esperado.

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