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Recuperação pós-parto normal: como cuidar das cicatrizes e lacerações

As lacerações locais, por episiotomia ou não, exigem cuidados constantes com a higiene e podem ser prevenidas com a fisioterapia pélvica.

Por Chloé Pinheiro
Atualizado em 14 set 2021, 19h00 - Publicado em 14 fev 2020, 14h17

O banimento de um comercial que retratava os cuidados pós-parto normal do intervalo do Oscar 2020 não só gerou polêmica, mas deixou claro como a cicatrização do parto normal é um assunto pouco conhecido e discutido. 

Uma pena, pois ficar com a região genital lesionada depois da passagem do bebê é normal. Estima-se que até 85% das mulheres com parto natural terá algum tipo de trauma local, seja ele uma laceração espontânea ou um corte cirúrgico, a episiotomia – uma prática que é contraindicada na maioria dos casos. 

As lacerações espontâneas são divididas em quatro graus, conforme sua intensidade. A maior parte delas é de grau 1 e 2, ou seja, afetam apenas a mucosa da vagina e os músculos do períneo (parte entre a vagina e o ânus), mas algumas terão uma recuperação um pouco mais chatinha e atrapalham a vida da mulher. 

“Trata-se de um local que dificilmente fica limpo por estar em contato direto com urina e fezes, então há risco de infecção. Outra complicação comum é os pontos abrirem, dificuldade para ir ao banheiro e dores na relação sexual depois da recuperação”, comenta Cinthia Calsinski, enfermeira doutora pela Universidade Federal de São Paulo. 

Fatores de risco e prevenção 

Algumas condições facilitam o aparecimento da laceração. No primeiro parto, por exemplo, ela é bem mais comum. Tamanho e posição do bebê, ter uma síntese anormal de colágeno e má nutrição também podem aumentar esse risco. “Há ainda uma questão de idade. As mais jovens estão mais sujeitas à episiotomia, enquanto as mais velhas podem ter mais lacerações graves”, comenta Fernanda Penido, enfermeira e professora da Universidade Federal de Minas Gerais. 

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Outro fator associado às lacerações é a história de mandar a mulher fazer força, prender o ar e empurrar. Sob efeito de anestesia, ela tem mais dificuldade de fazer esse movimento de forma correta, fora de sincronia com a contração uterina. “O ideal é que o profissional seja paciente para aguardar a descida do bebê”, explica Miriam Siqueira do Carmo Rabello, enfermeira obstetra e supervisora do programa Parto Seguro, do CEJAM (Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim). 

Não dá para garantir que a mulher não terá uma laceração no parto, mas é possível reduzir o risco de estragos mais graves com uma preparação durante a gestação. Neste sentido, quanto mais forte a musculatura do períneo, melhor. Uma estratégia benéfica para isso é a fisioterapia pélvica, que envolve massagens e exercícios específicos, e deve ser feita por um profissional especialista.

“Fazer atividades físicas desde o início da gestação, quando possível, ajuda. A caminhada, por exemplo, pode fortalecer a pelve antes de fazer os exercícios específicos para o períneo”, comenta Alessandra Fernandez, obstetra e ginecologista da clínica Por Ellas.

Os cuidados 

A higiene é o mais importante deles. “As de primeiro grau nem sempre são suturadas, ficam como um arranhão, e aí a orientação é apenas lavar com água e sabão com frequência, sempre que for ao banheiro, e secar com uma toalha”, aponta Miriam. Dê preferência para sabonetes específicos da região íntima, com pH neutro.

Se houver pontos, inchaço, vermelhidão, o médico pode recomendar sprays antissépticos, analgésicos e repouso. Para todos os casos, os médicos recomendam utilizar calcinha de algodão (e, quando possível, ficar um tempo sem), evitar fazer muito esforço e higienizar as mãos antes e depois de ir ao banheiro. 

Algumas medidas, embora não tragam benefícios para a cicatrização em si, aliviam o incômodo do início da cicatrização, como o uso de compressas geladas com gaze e chá de camomila. Usar almofadinhas especiais para sentar só costuma ser necessário para trazer conforto quando a laceração envolve a região anal. 

A recuperação vai depender muito destes cuidados, mas leva, no máximo, cerca de 15 dias. Se a lesão for leve, em poucos dias tende a passar.  

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Laserterapia 

Para lesões mais graves, há a possibilidade de realizar aplicação de laser no local. “Ela pode ser feita em casa, com um aparelho específico por um profissional habilitado, para acelerar o processo de cicatrização, além de promover efeito analgésico”, explica Daniele Pimenta, enfermeira mestre em Saúde Materno Infantil pela Universidade Federal Fluminense, fundadora da consultoria Bem Nascer Gestantes. 

Converse com um profissional de saúde de confiança antes para saber se realmente o procedimento vale a pena no seu caso. 

Pode fazer banho de assento? 

Até pode, tanto frio, para aliviar as dores, quanto morno. “A água levemente aquecida ajuda a reduzir o edema, alivia desconforto, promove a recuperação da ferida e reduz inflamações”, aponta Fernanda. Só que vale conversar com o médico antes, pois nem todas as mulheres estão liberadas para a prática, especialmente com a água quente ou o uso de qualquer produto para fazer o banho

Sangramentos esperados 

Usar absorvente é necessário porque depois do parto aparecem os lóquios, secreções resultantes do processo de cicatrização interno. Nos primeiros cinco dias, o que aparece é sangue, semelhante ao da menstruação, de volume variado. A partir daí aparece uma secreção primeiro amarelada, depois branca e, enfim, transparente. O processo pode demorar até 60 dias para acabar, mas geralmente passa em 40 dias. 

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Mas atenção: o sangue não deve sair da laceração em si. Se isso ocorrer, é preciso buscar atendimento médico.

As hemorroidas 

Elas aparecem no final da gestação por conta da pressão do útero sob o ânus, e podem piorar depois do parto. As compressas mornas de chá de camomila podem trazer mais conforto, além de cremes específicos para hemorroidas, receitados pelo médico. Manter uma dieta rica em fibras, tomar bastante líquidos, evitar usar papel higiênico e realizar banhos de assento frequentes são outras estratégias que aliviam.

Se o incômodo piora…

Sinal de que é melhor procurar ajuda. O esperado é que dores, inchaço e vermelhidão melhorem dia após dia. Sentir dores intensas, perceber que o ponto rompeu, a presença de sangue ou outra secreção no local da lesão e um odor diferente também devem ser motivo para ligar o sinal de alerta. 

É importante dizer que algumas lacerações podem deixar sequelas como dor nas relações sexuais, dores constantes no local e incontinência urinária ou fecal em algum grau. Daí a necessidade de realizar um trabalho preventivo (que explicaremos abaixo) e tomar os cuidados descritos aqui durante a recuperação. 

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Outra dica dos especialistas é fazer um fortalecimento local com exercícios para a musculatura pélvica. Eles envolvem, basicamente, contrair e relaxar ânus e vagina, e devem começar a ser feitos só 30 dias depois do parto.  

Episiotomia x laceração espontânea: faz diferença? 

Se a laceração é um corte imprevisível, a episiotomia, por outro lado, sempre foi defendida como uma intervenção controlada e necessária para facilitar a saída do bebê. Só que não é bem assim. O corte feito com o bisturi é considerado uma laceração profunda, de graus 3 e 4, e tende a deixar mais sequelas por meses depois do parto. 

“Ele está associada a maior dor perineal, dor durante as relações sexuais e redução da elasticidade local quando comparado às lacerações espontâneas”, destaca Fernanda. O ideal é que a episiotomia seja feita em último caso, quando o bebê está em sofrimento ou o períneo da mãe não demonstra nenhuma flexibilidade. Estima-se que entre 5 e 10% dos partos realmente precise dela. 

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