Uma mãe solo consegue descansar ou essa é mais uma romantização inventada?
A missão de relaxar se torna ainda mais desafiadora com a chegada da maternidade – mas como é possível fazer uma pausa, mesmo em meio ao temporal?
Há algumas colunas, falei sobre a rede de apoio no trabalho e a importância que essa organização tem não só para uma mãe solo, mas para todos os tipos de maternidade. Pois bem, eis que, neste mês, após um cenário de crises de ansiedade e de pânico, eu pedi demissão, pois precisava descansar. Atitude pensada, conversada com a chefia previamente e com noites e noites de avaliação.
Nessa hora, a gente sempre tende a procurar a culpa ou os culpados… E, olha, as voltas que damos fazendo essa análise são muitas, com um final quase sempre chegando no sistema como um todo. Sou eu? Sim. É o empregador? Também. É a maternidade? Sim. São as redes sociais? Com certeza. Quase uma emboscada a que estamos fadados para sempre, afinal, a pane no sistema, como canta Pitty em Admirável Chip Novo, de 2003, já aconteceu faz tempo e nós estamos, lentamente, tentando reconfigurar o que está vigente.
Aliás, esse disco, que marcou minha iniciação no rock’n’roll, na adolescência, tem várias letras interessantes para “transpormos” para a nossa maternidade e refletirmos sobre o descanso dentro dela. As letras das músicas Teto de Vidro, Máscara e Emboscada são interessantíssimas para o diálogo desta vez. Todavia, para mim, uma, em especial, traz metáforas para avaliarmos mais de perto.
A maternidade é um temporal atemporal
Pitty escreveu Temporal sem ser mãe, no entanto, em cada verso, é superpertinente a comparação com a trajetória do maternar e suas transformações, além dos medos e das preocupações que vamos carregando em nossa caminhada. “Se o tempo hoje vai depressa, não tá em minhas mãos. Cada minuto me interessa, me resolvendo ou não”, diz a cantora, em uma melodia um tanto mística no violão.
Gostaria muito de saber o que ela acha dessa comparação, especialmente depois da chegada da Madalena. Aliás, para fazer a versão de Temporal no projeto Admirável Chip Novo (Re)ativado, recém-lançado, ela chamou a Sandy, outra mãe de opiniões fortes e reflexivas. Duas mães que admiro.
Ao saber da minha saída, uma amiga disse que a maternidade é um mergulho louco dentro da gente mesma, justo no momento em que temos menos tempo para pensar em nós mesmas. Faz sentido, não faz? E, em Temporal, no trecho “Quero uma fermata que possa fazer agora o tempo me obedecer. E só então eu deixo os medos e as armas pra trás”, o uso da fermata, símbolo usado na teoria musical e que significa parada, traz essa questão do relaxar para o centro do diálogo, muitas vezes necessário, porém, banalizado. Afinal, as mães solo precisam prover, cuidar, educar…
A pausa precisa ter a mesma importância que o oxigênio
E, deixando nossos medos pra trás, como propõe Pitty, eu me pergunto se não conseguimos vislumbrar uma pequena folga? Se não conseguirmos, precisamos e muito!
“Leve a sério os momentos de descanso, como se fossem tão essenciais como sua alimentação ou oxigênio, porque são. Mães cansadas têm menos paciência e tolerância, se tornam mais reativas, desatentas e têm mais riscos de desenvolverem transtornos mentais, como depressão e ansiedade”, aponta a psicóloga Ana Streit.
No meu primeiro dia de férias/desempregada, deixei o Francisco no berçário e, voltando para casa, elaborei mil planos de ação, quer dizer, de descanso. Resultado? Nada feito, pois eu não sei descansar. Para Pitty, são “tantas placas e tantos sinais” e, como ela, também já não sei por onde caminhar.
Segundo Ana, fantasiar o descanso é colocá-lo como algo muito idealizado ou longe de si, ou mesmo, associá-lo apenas a momentos de férias e muito tempo livre, o que é um problema. “É preciso trazer para perto o descanso, organizar melhor a rotina, para realmente viver momentos de descanso no dia-a-dia, e não só no final de semana ou nas férias. Você não precisa de um spa ou de um resort para descansar, pode fazer isso em 5 minutos de meditação, por exemplo, ou mesmo em um café da manhã com calma”, afirma a especialista.
Gosto de fazer cafés tranquilos, tanto que, no período que me dei de férias, um dos primeiros planos é visitar cafés para ler um livro, observar as pessoas e, quem sabe, até tocar alguns projetos que estavam parados. Simples, porém algo que me agrada, afinal, cada mãe (e indivíduo) tem suas particularidades e suas maneiras únicas de apreciar e curtir a vida.
De toda forma, fica o alerta para o comportamento de fazer várias coisas ao mesmo tempo, pois temos essa habilidade – e ela é perigosa. “Quando nosso cérebro precisa dar conta de muitas tarefas simultâneas, seu gasto de energia é muito maior do que se fizéssemos cada atividade separada. Então, se estiver tomando o seu café da manhã, por exemplo, procure não mexer no celular todas as vezes. Se permita fazer algumas coisas isoladas e se permita pedir ajuda. Isso terá um impacto não só na sua saúde, mas na de seu filho ou de sua filha também” finaliza Ana, que parafraseia John Bowlby, pesquisador da Psicologia do Desenvolvimento e criador da Teoria do Apego: “Se quiser cuidar do bebê, cuide da mãe.”
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