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Mortalidade infantil aumenta pela primeira vez desde 1990

Zika e crise econômica são apontados como justificativas para alta, classificada como grave e preocupante pela Sociedade Brasileira de Pediatria.

Por Chloé Pinheiro
17 jul 2018, 19h07

A taxa de mortalidade infantil, que contempla mortes entre crianças de 0 a 5 anos, subiu 4,8% em 2016, segundo dados divulgados nesta semana pelo Ministério da Saúde. Em 2016, foram 14 óbitos para cada mil nascidos vivos contra 13,3 em 2015. É a primeira vez desde 1990 que o indicador sobe ao invés de diminuir. Na época, a taxa era de 47 mortes por mil nascimentos.

Segundo comunicado do Ministério da Saúde, o cenário é de um “repique” que não configuraria um aumento significativo. Isso porque, em 2016, houve redução de 5,3% na taxa de nascimentos, impulsionada pelo adiamento da gestação e pelo impacto do zika, além disso a mortalidade é calculada comparando o número de nascidos com o de óbitos infantis no período. Ou seja, com menos nascidos, o índice seria puxado para cima.

Mesmo assim, o sinal de alerta foi dado. “Há outros fatores a se discutir, como a letalidade do próprio zika vírus, pois além de sequelas ele pode causar a morte; e a condição socioeconômica do país”, aponta Rosana Richtmann, infectologista do Hospital e Maternidade Santa Joana, em São Paulo.

SBP se posiciona

A SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria) divulgou nesta terça-feira, 17, uma nota aos brasileiros pedindo “união de forças” contra a mortalidade infantil. Na avaliação da entidade, o zika e o impacto da crise econômica na situação financeira da população não devem ser considerados os únicos responsáveis pela mudança nos indicadores.

O texto aponta problemas que já haviam sido pontuados pela SBP ao governo e ao Ministério da Saúde e que podem influenciar no aumento. Entre eles, a falta de recursos e infraestrutura, desvalorização de profissionais que prestam cuidados, desmonte de equipes especializadas no atendimento infantil e dificuldade de acesso dos pacientes a serviços como consultas, exames, internações e cirurgia.

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“Nós atingimos a meta do milênio de reduzir a mortalidade infantil em dois terços, mas, depois disso, parece que houve um relaxamento do Estado”, comenta Alexandre Miralha, do Departamento Científico de Neonatologia da SBP. Esse afrouxamento de medidas importantes de saúde pública foi acompanhado, por outro lado, da volta de algumas doenças e perigos que haviam diminuído.

“Vemos uma precariedade da assistência primária, especialmente no pré-natal, políticas sociais sendo derrubadas e o aumento do desemprego nos últimos anos”, destaca Miralha. “E quando a taxa de mortalidade infantil cresce, significa que a qualidade de vida da população caiu e que o meio em que as crianças vivem não está apropriado para que cresçam”, completa o pediatra.

O texto pode ser conferido na íntegra no site da SBP.

Preocupação para os próximos anos

A queda histórica na cobertura vacinal observada recentemente pode ainda impactar de maneira mais significativa a mortalidade infantil nos próximos anos. “Estamos vendo a volta de sarampo e até o medo da poliomielite e cada criança morta por uma doença que poderia ser evitada com a vacina aumenta a nossa taxa, pois durante décadas não houve nenhuma morte por essas doenças”, destaca Rosana.

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O avanço da pobreza extrema – que agora atinge 15 milhões de pessoas, um crescimento de 11,2% em 2017, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) – também deixa uma perspectiva negativa no ar. A situação financeira difícil atrapalha o acesso a serviços de saúde e abre caminho para doenças infectocontagiosas como a diarreia, parasitoses, tuberculose, meningite, sífilis congênita e outras.

São justamente as famílias mais vulneráveis economicamente as mais expostas ao aumento das mortes nos primeiros cinco anos de vida. Para reverter o quadro, só mesmo um esforço conjunto. “É preciso investir e atuar em várias frentes: saúde, educação, saneamento básico… Ou seja, não é tão simples assim, tanto que demoramos anos e anos para reduzir a taxa de mortalidade”, opina Rosana.

O que será feito?

Em nota enviada ao Bebê.com.br e divulgada pela Agência Brasil, o Ministério da Saúde afirma estar desenvolvendo ações com outros órgãos governamentais para reverter o aumento e diz ter criado um grupo de trabalho com acadêmicos para compreender suas causas. Além disso, anuncia que fará reuniões em agosto com secretários de saúde de estados e municípios para “discutir a situação em profundidade e estudar formas de ação mais urgentes”.

Já a SBP declarou que prepara um documento com propostas a serem implementadas pelo governos atual (e futuros), tendo em vista as eleições deste ano. O texto, entre outras sugestões, aponta a necessidade urgente de que todas as famílias tenham acesso ao pediatra no pré-natal, na sala de parto e no acompanhamento do nascimento à adolescência.

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