Mãe cria projeto de cartas para acalmar grávidas durante a pandemia
A ideia de "Querida Gestante", da jornalista Xenya Bucchioni, surgiu em uma tarde enquanto olhava para a filha Nara brincar, no começo da quarentena.
Por Alice Arnoldi
Atualizado em 15 Maio 2020, 15h47 - Publicado em 8 Maio 2020, 11h54
Se gerar um bebê já é um processo que traz um misto de alegrias e incertezas, pensar em vivê-lo durante uma pandemia é ainda mais delicado. Só que mais do imaginar, essa tem sido a realidade de muitas grávidas que estão gerando uma vida em meio ao surto do novo coronavírus (Covid-19). E foi pensando nessas mulheres que a jornalista Xenya Bucchioni criou o projeto “@queridagestante”, uma conta no Instagram que recebe e publica cartas de mulheres grávidas para outras gestantes.
A ideia surgiu ainda no começo da quarentena, quando as escolas e as empresas davam os primeiros passos para a paralisação e o home office.
Ela estava em casa cuidando da filha Nara, de um ano e seis meses, quando diferentes questionamentos começaram a borbulhar em sua mente. “Eu estava olhando para ela, brincando, e lembrei da minha gestação. Pensei que se fosse há pouco tempo atrás, eu estaria grávida nesse momento”.
A partir desse instante, a jornalista lembrou de toda a trajetória que precisou passar para que Nara chegasse ao mundo. Aos 23 anos, Xenya sofreu um acidente, em que fraturou a bacia e ficou um mês de cama. Esse período em repouso total levou ao quadro de trombose na perna esquerda.
“Na visão do médico obstetra especialista, isso me enquadrava em gestação de risco. Desde o início, tive que usar meias elásticas e com 14 semanas ele indicou as injeções de anticoagulante. A partir de então, me vi como doente”, explica a jornalista.
A ênfase constante de que a gestação que estava vivendo era de risco fez com que Xenya acreditasse por um longo período de que estava doente em vez de grávida. Esse cenário demandou muito trabalho interno para conseguir contorná-lo, como a atitude de decidir participar de rodas de escrita com mulheres.
“Isso mudou muita coisa na minha vida, como pensar no feminino, na matriz feminina da minha família, olhar para as histórias de mulheres a minha volta e me conectar com as histórias de parto”, detalha a autora da proposta.
Olhando para a filha, esse processo intenso do gerar uma vida voltou à tona e o projeto de cartas nasceu. “Comecei a escrever uma carta mentalmente para uma mulher grávida qualquer. E a noite, quando minha filha foi dormir, coloquei o texto no papel e pensei: ‘Que título eu vou dar?’. Nessa hora, veio o “Querida Gestante” e, em seguida, surgiu a ideia de como seria legal ter um lugar em que as mulheres pudessem escrever cartas para outras mulheres que estão gestando”, conta ela que, em parceria com o marido designer, construiu uma identidade visual.
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A troca é mútua
Os primeiros textos do projeto foram de mulheres que fazem parte da rede de apoio da jornalista, como a sua doula. Mas com o passar do tempo, ele começou a ganhar forma e gestantes até então desconhecidas passaram a escrever para ela.
O objetivo do projeto é auxiliar outras grávidas que estão vivendo esse momento delicado durante a pandemia. Mas ele também tem ajudado Xenya a se reconectar com o que foi interrompido repentinamente com o novo coronavírus.
“Eu estava voltando a trabalhar, com perspectiva de novos projetos, estava em um movimento de ter mais tempo para mim. A minha filha também estava no processo de adaptação da escola. E, como todo mundo, tive a vida de antes cancelada. Então, poder me conectar com esse tema, que é gestação, traz conexão com a vida”.
E, assim como a roda de escrita a lembrou do poder da união feminina na gestação, o projeto continua a trazê-la para próximo desse sentimento. “Nós, mulheres, temos que caminhar mais juntas. A força que esse projeto traz para o meu maternar é imensa, de querer estar mais próxima delas. Fortalecer essa presença feminina fora do ponto de vista comum em que competimos uma com a outra”.
Para participar, as cartas podem ser enviadas pelo e-mail queridagestante@gmail.com ou ainda pelo direct do Instagram. Sobre o tamanho, Xenya pede pelo máximo de 30 linhas para que o texto não vá para os comentários. Mas a jornalista entende que, às vezes, alguns assuntos pedem por mais espaço.
Já sobre o tema, ela apenas direciona as participantes para que pensem que estão realmente escrevendo uma carta para outra grávida e como gostariam de acalantá-la neste momento. A única exigência é que ela seja feita com sinceridade e carinho, sem se preocupar com os erros de português ou outros detalhes menores.