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“Tive meu primeiro filho depois de tratar um câncer de mama”

Aline descobriu o tumor quando tinha 31 anos e teve que decidir antes da hora planejada se queria ser mãe. Conheça sua história de superação e aprendizado.

Por Chloé Pinheiro
9 out 2017, 16h02

Se o primeiro filho é um divisor de águas na vida de qualquer mulher, para Aline dos Reis Matheus, de 36 anos, o acontecimento é ainda mais especial. Isso porque, nessa mesma época do ano, há 5 anos, a professora de São Paulo descobriu um câncer de mama. Hoje ela comemora a vitória contra a doença com Clara – que acaba de completar um mês de vida – nos braços.

Confira o depoimento de Aline, concedido entre os resmungos (fofíssimos) da pequena. 

“Em 2012, estava de férias na Bahia. Enquanto passava protetor solar, senti um caroço que não estava antes no meu seio esquerdo. Parecia que tinha brotado do nada, o que me surpreendeu, pois conheço bem meu corpo. Sinto que nossa geração é bem conectada com o corpo, mais do que eram nossas avós, por exemplo.

Na hora me deu uma intuição muito ruim e, quando voltei da viagem, marquei uma consulta com o ginecologista. Ele pediu um ultrassom, mas disse que provavelmente não era nada, porque eu era nova, tinha apenas 31 anos. Durante a realização do exame, a médica me avisou que o nódulo tinha características preocupantes e que era melhor checar com um mastologista. Saí da consulta bem preocupada.

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Depois de fazer mais exames e biópsias, recebi o diagnóstico do câncer no dia 6 de outubro de 2012, um dia antes do meu aniversário de 32 anos. O tumor era um triplo negativo e, a princípio, achei que isso fosse algo bom, mas na verdade queria dizer que ele não reagia a uma série de coisas, como aos hormônios – o que dificultava de certa forma o tratamento.

Aí começou a correria, escolher onde tratar. Eu optei pelo A.C. Camargo e foi uma ótima decisão. Fiz mais alguns exames, incluindo um mapeamento genético para detectar possíveis causas do tumor, pois só tinha um caso na família, em uma prima distante, que depois descobrimos que nem era o mesmo tipo de tumor que o meu.

Assim, descobri que tinha alterações em dois genes ligados ao desenvolvimento de câncer, o BRCA1 e BRC2, que aumentavam também o risco de ter a doença no ovário. E também que meu tumor tinha 3 cm e era um tipo agressivo, por isso notei o crescimento de uma hora pra outra. Não tinha metástase, mas o tratamento precisava começar logo. A médica optou pela quimioterapia antes da cirurgia e antes me explicou que as sessões poderiam afetar minha fertilidade e que muitas mulheres ficavam estéreis depois.

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Por isso, me perguntou se eu gostaria de fazer algum tratamento para preservar a fertilidade. Sempre quis ser mãe, mas nem pensava nisso naquele momento, eu trabalhava bastante, enfim, tive que antecipar um tema que não estava presente na minha vida. Decidi por congelar alguns óvulos. Foi um processo custoso, tanto física quanto emocionalmente, mas importante porque significava que haveria um futuro, um depois do câncer.

Sofri com a quimioterapia o que não sofri com a doença, que não chegou a apresentar sintomas fora o nódulo em si. Tive enjoos, dores fortes, perdi o cabelo e entrei em uma espécie de menopausa com todos os seus sinais: o calorão, a ausência de menstruação, as mudanças no corpo…

Antes do diagnóstico, eu tinha dois empregos e fazia um mestrado. Acabei me afastando do trabalho para o tratamento, mas mantive o mestrado, o que foi bom porque ocupei a mente com outras coisas. Minha família foi fundamental nesse processo também. Eu fazia terapia há anos e continuei durante o tratamento – o que acredito que ajudou muito!

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No fim da quimioterapia, que durou seis meses, o tumor já havia sumido. Mesmo assim, era preciso fazer a cirurgia para bater o martelo e retirar qualquer célula suspeita que ainda houvesse. A cirurgia também iria definir o que faríamos para prevenir a volta do câncer, pois se trata de um tipo agressivo e genético.

Optamos pela adenomastectomia, que não retira o seio inteiro, só o máximo de tecido mamário – que pode virar tumor um dia – possível. Decidi retirar as duas mamas para evitar riscos e me sinto mais tranquila por causa disso, apesar de nunca estar 100% tranquila porque sei que ainda há o risco no ovário. A cirurgia mantém a estrutura do seio, aréola, mamilo e preenche com silicone onde antes havia a glândula e fiquei satisfeita com o resultado estético.

Aline e o marido depois do tratamento (Aline dos Reis Matheus/Arquivo Pessoal)

Assim, estava livre do câncer. O curioso é que, quando a quimio acabou, minha menstruação voltou regularmente, o que é raro acontecer. Por dois anos, tive que usar métodos contraceptivos, porque nesse período a chance da doença voltar é mais alta. Depois disso, decidimos não evitar a gravidez, mas também não forçar. Já era 2015, eu tinha chegado aos 35, não era mais tão jovem. E o que aconteceu foi que engravidei naturalmente e nem precisei usar os óvulos congelados. 

(Júlia Valéria/Arquivo Pessoal)

Durante a gravidez, tive que fazer acompanhamento com o oncologista e fazer mamografia, usando colete de chumbo para proteger a Clara, nome da minha filha. Mas a gestação correu superbem, só tive uma complicação não relacionada ao câncer, que me fez optar pela cesárea, mas Clara nasceu saudável no último dia 9 de setembro. Só não posso amamentar. Apesar do pouco de tecido mamário que sobrou ter produzido um pouco de leite, não é o suficiente para alimentá-la e também o estímulo é perigoso pois aumenta os riscos do tumor voltar.

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A maternidade é uma montanha russa de emoções, especialmente agora nesse começo. Fico pensando se a experiência com o câncer afeta a experiência de ser mãe e a resposta é que sim e não. Não porque a maternidade é muito maior que a doença, tem desafios e alegrias muito particulares. Mas ao mesmo tempo sim porque o fato de ser mãe representa mais do que isso agora. Representa sobrevivência. Acho que minha família sentiu isso mais do que eu, todos comemoraram muito o nascimento da minha filha.

Clara posando em seus primeiros dias de vida (Aline dos Reis Matheus/Arquivo Pessoal)

Para mim, também foi um período de aprendizado, porque quando recebi o diagnóstico estava conciliando dois empregos, um deles como coordenadora em uma escola onde não me sentia muito feliz. Aproveitei a volta da licença e me demiti e, aos poucos, foram surgindo outras oportunidades. Agora falta decidir o que vou fazer com os 19 óvulos congelados”.

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