Os desafios de uma mãe taxista

Conheça a história de uma mulher que sofreu preconceito por trabalhar em cargos que ainda são vistos pela sociedade como masculinos, mas que deu a volta por cima e criou uma associação com taxistas mulheres em Belém, no Pará.

Por Luísa Massa
Atualizado em 27 out 2016, 19h36 - Publicado em 3 mar 2016, 07h00
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Francinete Ferreira Matos, 31 anos, é taxista, empreendedora e mãe de quatro filhos: Vitória Caroline, de 15 anos, Deivid William, 13, Deyse Dayane, 11, e de Marissol Esther, de 1 ano e 10 meses. Aqui, ela conta a sua trajetória e fala sobre a difícil tarefa de conciliar a carreira com a maternidade.

“Eu sempre gostei de dirigir e, além disso, recebi muito apoio do meu pai, que é taxista. Já trabalhei como moto girl, dirigindo caminhão e até operando máquinas pesadas – tudo relacionado com a área automotiva, que é minha paixão. Em busca de uma renda melhor, decidi ser taxista há dois anos. No começo, entrei em uma associação onde trabalhava com 19 homens e era a única mulher. Muitos passageiros preferiam que eu dirigisse e confesso que o meu relacionamento com os outros profissionais foi se desgastando por causa das discussões.

Então eu pensei: “será que não existem outras taxistas em Belém?”. Comecei a pesquisar, montei um grupo no WhatsApp e fui atrás de mulheres que gostariam de exercer essa função. Achei algumas em lava a jatos, postos de gasolina e por aí vai. Assim como eu, a maioria delas trabalhava em cargos que são muito ocupados por homens. Expliquei que queria montar uma associação somente com taxistas mulheres, mas que não sabia se daria certo. No meio dessa procura, entrei em contato com pessoas que tentaram colocar a mesma ideia em prática há aproximadamente quatro anos, mas o projeto não deu certo. Fui encorajada por elas a apostar novamente, pois hoje as coisas estão evoluindo cada vez mais – temos a presença forte das redes sociais e a mídia está cada vez mais focada nos assuntos femininos.

Decidi investir e em abril de 2015, a Lady’s Taxi Belém foi criada. Atualmente, temos 10 taxistas, mas pretendemos aumentar o número de funcionárias porque a demanda é muito grande. Nós atendemos mais mulheres do que homens, mas não fazemos nenhum tipo de discriminação. Trabalhamos 24 horas por dia e eu sou responsável por organizar tudo. O negócio está indo bem, acredito que muitas passageiras sentem mais segurança em fazer corridas com taxistas mulheres, pois não assediamos, não somos inconvenientes, mantemos os carros sempre bem arrumados e o atendimento é melhor: ajudamos um idoso a se sentar, levantamos uma criança do carro… Acho que a mulher é parceira, amiga e compreende todos os lados – esse acaba sendo o nosso diferencial.

É claro que nem tudo são flores. Como exerci funções que ainda são vistas pela sociedade como masculinas, sofri preconceito nos empregos. Quando operava máquinas, eu era a única mulher na obra. Os outros trabalhadores homens ficavam comentando, tiravam fotos e até me paqueravam. Quando dirigia caminhão, vi muitos funcionários torcerem o nariz e falar que eu não conseguiria fazer manobras porque era mulher. Dentro de casa, a situação não foi muito diferente. O meu pai me incentivou, mas a minha mãe nunca gostou e diz que é perigoso, que eu trabalho em atividades que devem ser exercidas por homens. Inclusive, ela já pagou vários cursos para mim, mas não adiantou, é isso que eu sempre gostei de fazer. Por vários motivos, o meu ex-marido também não me apoiou e acredito que muitos problemas que surgiram no casamento foram causados pela minha opção profissional.

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Eu tenho quatro filhos: três meninas com 15, 11 e 1 ano e 10 meses e um menino de 13 anos. Os maiores entendem a minha profissão e acham legal. Eu também sinto que eles sentem orgulho de mim. A filha mais velha trabalha comigo atendendo telefones e ajudando a cuidar de algumas coisas da associação. Dentro da escola e no ambiente com os amigos, eles nunca sofreram preconceito por causa do meu trabalho. O problema é que é muito difícil conciliar a carreira com a maternidade. Sinto que passo menos tempo do que deveria com os meus filhos, porque a minha vida é muito corrida, pois além de administrar o negócio, também trabalho como taxista. Devido a essa loucura toda, o meu ex-marido pediu que a bebê fosse morar com ele até eu me adaptar e ajeitar as coisas. Apesar de ser uma decisão muito difícil, eu acabei aceitando, pois sei que essa é a melhor escolha no momento. O bom é que a distância entre as nossas casas não é longa. Eu consigo ver minha pequena aos finais de semana e até mesmo em alguns dias da semana. O pai cuida muito bem dela, assim como a madrasta, que é uma pessoa excelente. Eu só tenho a agradecer.

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É claro que às vezes eu me sinto culpada, mas acredito que temos que nos sacrificar para colhermos bons frutos no futuro. Sei que uma hora as coisas vão se acalmar e entrar nos eixos. Pelo fato do projeto ter sido idealizado por mim e por eu ser presidente da associação, acho que quero que ele dê certo mais do que todo mundo. Eu abri mão de muitas coisas para fazer com que o meu negócio aconteça e progrida. Eu fico muito tempo no escritório, não cultivo outros aspectos da minha vida. Espero que mais pra frente eu possa encontrar pessoas parceiras, que estejam dispostas a se comprometer com a Lady’s Taxi tanto quanto eu.

Apesar de tudo, os meus filhos são muito importantes para mim e os valores que eu pretendo passar para eles são que nada é fácil, que nós conquistamos as coisas com muito esforço e que tudo tem o momento certo para acontecer. Espero que eles respeitem os mais velhos, que tenham paciência, que estejam prontos para ajudar as outras pessoas. Também quero que estudem bastante para ter oportunidades melhores do que as que eu tive. Desejo que eles tenham aprendido que não devemos rotular os empregos como sendo “de homem” ou “de mulher” e que tenham consciência de que todas as mulheres têm muita capacidade, pois nós estamos entrando em várias áreas do mercado de trabalho e quando fazemos algo, fazemos muito bem.”

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