Pare e pense em quantas mulheres divorciadas que possuem a guarda dos filhos você conhece. Se a resposta não for todas, pelo menos é a maioria, certo? Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 86,3% dos divórcios concedidos no país em 2013 a custódia das crianças foi dada às mães, unilateralmente. Já a guarda compartilhada — quando tanto o pai quanto a mãe são responsáveis pela criança — foi aprovada em apenas 6,8% dos casos.
No entanto, esse cenário deve começar a mudar. Isso porque, em dezembro de 2014, a presidente Dilma Rousseff sancionou um projeto de lei que torna a guarda compartilhada obrigatória — ainda que não haja consenso entre o casal. De acordo com as novas regras, o regime só não será aplicado quando um dos pais abrir mão do direito ou nos casos em que o juiz considerar que um deles não tem condições de cuidar da criança.
Avanços
O principal objetivo dessas alterações é beneficiar o pequeno e evitar que ele se torne o centro da disputa entre pai e mãe ou até mesmo que seja usado para colocar um contra o outro — situação conhecida como Síndrome da Alienação Parental. “É preciso entender que quem está se separando é o casal”, afirma a psicóloga Monica de Vasconcellos Dias, professora da Universidade Veiga de Almeida, no Rio de Janeiro. “E a guarda compartilhada busca reforçar a importância de a criança conviver com os dois”, analisa.
Nesse ponto, o texto da nova lei é claro: “o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e o pai”. Isso não significa, contudo, que os pequenos passarão um dia em cada casa — como na convivência alternada —, mas sim que a frequência com a qual visitam um ou outro deverá ser maior. “A guarda alternada nunca foi bem vista pelos tribunais e havia uma discussão muito grande sobre o que, de fato, era a ‘guarda compartilhada’. A nova lei veio estabelecer o significado dessa expressão”, analisa a advogada Alessandra Rugai Bastos, sócia do escritório Guimarães Bastos Advogados, de São Paulo, especializado em Direito de Família e Sucessões. “A ideia é flexibilizar o tempo que a criança passa com os pais de modo que ela usufrua melhor da companhia dos dois”, ressalta a advogada especialista em Direito de Família Sylvia Mendonça do Amaral, também da capital paulista.
É claro que, nem sempre, o equilíbrio é possível. Para a advogada Alessandra Bastos, o juiz provavelmente levará em conta a idade da criança na hora de definir, por exemplo, onde será sua residência e quem será o guardião dos seus documentos. “É evidente que o que vale para uma criança cuja mãe está amamentando não é o mesmo para um adolescente de 15 ou 16 anos”, pondera.
Outro grande passo que a lei proporciona é fazer com que o pai esteja mais presente na vida dos filhos, que tenha deveres e direitos que vão além do pagamento da pensão alimentícia e de visitas esporádicas. A partir de agora, pai e mãe serão igualmente responsáveis por autorizar viagens ao exterior, mudanças de municípios e por decidir aspectos da criação e da educação das crianças. Segundo as novas regras, as escolas, por sinal, e outros estabelecimentos públicos ou privados serão obrigados a prestar informações sobre os filhos a qualquer um dos pais, sob pena de multa diária pelo não atendimento da solicitação.
Se tudo isso for feito de maneira pacífica e madura, os pequenos só terão a ganhar com a guarda compartilhada. “Independente da idade do filho, os pais devem ser capazes de dividir tarefas sem brigas, pois isso terá impacto em todo o desenvolvimento da criança”, garante a psicóloga Clarisse Mosmann, professora da Universidade do Vale do Rio Sinos (Unisinos), no Rio Grande do Sul.
A importância da família em cada fase
Não é apenas convivendo como um casal que os pais podem participar da vida dos filhos. Isso é possível, sim, mesmo depois do divórcio. Confira, abaixo, que tipo de suporte a criança precisa de acordo com a faixa etária e saiba o que fazer para garantir que os vínculos familiares não se percam após a separação.
ATÉ OS 2 ANOS
O que a criança está desenvolvendo
Os laços entre o bebê, a mãe e o pai começam a existir já na barriga. “São os chamados vínculos primordiais, que vão ser a base para essa criança se sentir segura para explorar o ambiente lá fora”, explica o pediatra Ricardo Halpern, presidente do Departamento de Pediatria do Comportamento e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Além disso, é nos primeiros meses que os pequenos constroem figuras de referência e entendem o mundo ao seu redor.
Como lidar com o seu filho
Mesmo aqueles que acabaram de nascer sentem quando algo não vai bem com os seus pais. E isso pode, sim, se refletir no comportamento dos pequenos. Além de ficarem mais irritados e chorões, bebês até os dois anos tendem a apresentar problemas de sono, de apetite e até irritações na pele.
Para preservar o bem-estar do filhote e garantir que os vínculos sejam construídos com ambos os pais, a dica dos especialistas é que os dois participem ao máximo do dia a dia do bebê — dando banho ou colocando-o para dormir, por exemplo. É claro que, muitas vezes, a mãe acaba ficando mais próxima por causa da amamentação e até por estar em licença maternidade, mas o pai também pode (e deve!) estar presente. “A divisão de tarefas faz com que exista uma relação familiar mais saudável”, pontua Clarisse.
DOS 2 AOS 6 ANOS
O que a criança está desenvolvendo
Nessa faixa etária, o pequeno aprofunda os laços afetivos com os pais, além de começar a interagir muito mais com outras crianças — dentro ou fora da escolinha. E os pais precisam proteger o filho, dar regras e ensinar o que é certo ou errado. “A partir dos 2 anos, a criança começa a ter muita necessidade de receber limites”, conta a professora da Unisinos.
Como lidar com o seu filho
Nesse momento, é fundamental que os pais separados estejam em sintonia no que diz respeito às regras de suas respectivas casas. “Se em cada lugar a criança receber uma mensagem diferente, ela pode se atrapalhar e ter dificuldade para lidar com a situação”, alerta Halpern. Quando há desorientação, não é raro que a garotada apresente sintomas como ansiedade, depressão e até agressividade.
ACIMA DOS 6 ANOS
O que a criança está desenvolvendo
Nessa idade, a escola já faz parte da rotina dos pequenos e eles iniciam um processo de grande aprendizado e de expansão das suas relações sociais.
Como lidar com o seu filho
Se a criança está enfrentando problemas em casa, é geralmente na escola onde eles vão se manifestar. Isso pode se dar tanto por meio de dificuldades de relacionamento quanto de aprendizagem. Por isso, ela vai precisar de atenção! “É importante que os pais tirem um tempo para ficar só com a criança, brincar, desenhar, ajudar nas tarefas escolares…”, recomenda a professora Clarisse Mosmann. É uma ótima fase, portanto, para afinar a relação com cada um dos pais. “Tanto um como o outro podem construir espaços para conviver com o filho, criando seus valores”, aponta Monica Dias.