“Como foi descobrir que o meu filho tinha mielomeningocele”
Conheça a história de uma mãe que, após receber o diagnóstico da doença do seu bebê, realizou uma cirurgia de risco durante a gravidez para oferecer melhor qualidade de vida para o pequeno.
Thaís Araújo, 24 anos, é mãe do Miguel, de 2 anos e 4 meses, estudante de jornalismo e idealizadora do Instagram Thaís por Thaís. Aqui, ela conta como foi descobrir que o seu filho tinha mielomeningocele e quais são os desafios que eles enfrentam no dia a dia.
“Eu sempre quis ser mãe, mas confesso que não estava planejando engravidar quando descobri que teria um filho. Mesmo assim, eu e o meu marido ficamos muito felizes com a notícia! A gestação estava tranquila e os exames que eu fazia indicavam bons resultados. Tudo normal. Só que com 17 semanas, quando fui realizar o exame morfológico, tive uma surpresa: a médica disse que o bebê era um menino, mas que havia alguma coisa errada, pois ele tinha uma má formação que afetava a coluna. De uma forma nada gentil, ela falou que o problema do meu filho era muito grave, que ela não conhecia casos de crianças que tinham sobrevivido e que se ele vivesse seria em estado vegetativo. A médica também informou que conversaria com a minha obstetra e pediu que voltássemos no dia seguinte para confirmar o diagnóstico.
Depois de ouvir tudo isso, o meu mundo caiu! Eu não sabia o que era aquela doença e o que ela poderia causar, aliás, eu sequer tinha ouvido falar sobre ela. Fiquei muito assustada! Eu e meu marido fomos para casa chorando e não acreditávamos que aquilo estava acontecendo com a gente. Tanto é que falei para ele: ‘Amanhã vamos voltar para fazer o exame e vai dar que o nosso filho não tem nada’. Repetimos o procedimento no outro dia e a mielomeningocele – um defeito congênito que afeta a coluna e a medula espinhal da criança – foi confirmada.
Depois disso, fui consultar a minha obstetra e ela disse que conhecia um especialista aqui de Brasília que trataria o caso. Fomos ao seu consultório, ele olhou os exames e falou de uma cirurgia que ofereceria uma qualidade de vida melhor para o meu filho, mas que deveria ser feita ainda na gestação. Ele explicou que havia duas maneiras de realizá-la: uma em que os médicos fazem furos na barriga, colocam câmeras e realizam o procedimento e a outra em que eles abrem a barriga, cortam o útero, chegam até a criança e depois a colocam dentro da barriga de novo. Essa decisão varia muito de médico para médico, então, ele me deu o contato de profissionais que faziam esse tipo de intervenção em São Paulo.
Após consultar os especialistas, eu e o meu marido escolhemos o médico e decidimos que o procedimento seria feito por ele. Marcamos a cirurgia quando eu estava com 25 semanas de gravidez e ela foi feita, como eles dizem, a céu aberto: abriram a minha barriga para mexer no Miguel. O custo total foi de 150 mil reais, mas o plano de saúde arcou com tudo. Eu tive muito medo de passar por isso porque havia risco de que eu e o meu filho morrêssemos. Mesmo assim, decidi arriscar, pois isso traria uma vida melhor para ele. Graças a Deus, correu tudo bem!
Fui informada de que os bebês que passam por esse tipo de cirurgia devem nascer com até 36 semanas porque a cicatriz do útero vai afinando conforme a barriga cresce e há o risco de ela romper. O Miguel adiantou um pouco e chegou com 35 semanas de cesárea. Eles tiraram o pequeno da minha barriga, me mostraram rapidamente e o levaram para a incubadora. Eu só consegui vê-lo com calma no outro dia de manhã quando fui visitá-lo. Apesar disso, não pude pegá-lo no colo ou amamentá-lo.
Eu fiquei quatro dias internada, depois recebi alta. Já Miguel ficou por 10 dias na UTI e esses foram os piores 10 dias da minha vida! A sensação de sair do hospital sem o meu filho nos braços, de não poder amamentá-lo quando os meus peitos estavam explodindo de leite, o fato de ter que dormir em cadeiras no hospital, de ter que tirar leite de 3 em 3 horas para alimentá-lo foi muito desgastante – tanto emocionalmente quanto fisicamente. Eu também tinha que lidar com a minha frustração porque muitas vezes os médicos me diziam que ele receberia alta, então eu ia para o hospital, chegava lá e era informada de que o Miguel ainda não sairia naquele dia. Enfim, depois de muito esperar, meu pequeno finalmente pode ir para casa! No dia seguinte já estávamos todos no avião voltando para Brasília. A médica recomendou que ficássemos por um período maior em São Paulo, mas eu já estava cinco meses longe de casa, não via os meus familiares e não aguentava mais aquela situação.
Hoje o Miguel tem 2 anos e 4 meses e é uma criança normal. O seu desenvolvimento cognitivo foi preservado, ele não teve hidrocefalia – que poderia ter desenvolvido até os dois anos, mas nasceu com um pé torto congênito, que foi corrigido com o uso de gesso e botinhas. Além disso, ele tem luxação bilateral no quadril e não tem sensibilidade nos pés, por isso, ele ainda não anda e, como está muito pesado e não aguentamos mais pegá-lo no colo, ele está na cadeira de rodas. Meu filho também tem a bexiga e o intestino neurogênico, então, trocamos a sonda de 4 em 4 horas para que ele possa fazer xixi.
O Miguel ainda não frequenta a escola, mas tem uma rotina puxada: faz fisioterapia e hidroterapia duas vezes na semana, fonoaudiólogo uma vez na semana e tem consultas frequentes com os médicos. Nem sempre ele encara isso com naturalidade e chora nas sessões de fisioterapia. Apesar disso, em momento algum ele para de fazer os exercícios porque ele sabe que é para o bem dele. Eu explico que isso o ajudará a andar e ele continua.
Nós já sofremos preconceito várias vezes. Uma vez estava com ele no colo em uma fila preferencial, sem cadeiras de rodas e botinhas, e as pessoas disseram que eu estava mentindo, que o meu filho andava, sim, e outros falaram: ‘Já que ele é deficiente é melhor trazê-lo em outro horário’. Fiquei arrasada! Mas eu tento não ficar triste na frente dele quando essas coisas acontecem e procuro sempre mostrar minha força. É claro que eu fico chateada, não sou de ferro, mas sei que um dia ele terá que enfrentar essas situações. Para mim, só o fato de ele estar aqui é milagre e as suas limitações não o impedem de levar uma vida normal.
Eu recebo muitas mensagens no Instagram de mães que descobriram que o filho tem mielo. Geralmente, elas me procuraram quando estão desesperadas, mas eu tento sempre passar calma e mostrar que o Miguel está bem e que eu sou feliz independente de qualquer coisa! Não é o fim receber o diagnóstico de que o seu bebê tem essa doença. Vemos que, na prática, acontece outra coisa: um recomeço. A vida começa de novo de outra maneira, que não é pior, mas só diferente”.