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“Amo meus filhos mais do que tudo, mas não gosto de ser mãe”

Este sentimento não é raro e, com ajuda especializada, tem solução

Por Raquel Drehmer
28 mar 2018, 21h46
 (monkeybusinessimages/Thinkstock/Getty Images)
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Sem conseguir mais guardar para si a aflição, a professora Renata P. (que autorizou o relato, mas pediu para não ter o sobrenome publicado) desabafou em um grupo fechado de mães no Facebook: “Não me entendam mal, mas detesto ser mãe. Amo meus filhos mais do que tudo, juro por tudo que é mais sagrado, mas não gosto de ser mãe. Detesto ter que lidar com todos os detalhes da vida deles. O mais velho tem 5 anos e a menina tem 2 anos, eles dependem de mim para tudo. Não consigo nunca esquecer que sou mãe, sinto falta de pensar só em mim às vezes, para variar. Será que quando eles crescerem vou gostar mais de ser mãe?”

Apesar de algumas pessoas terem criticado, a maioria dos comentários foi de apoio, e muitos de identificação. As respostas positivas podem ser resumidas em “Estamos juntas, e não tenho coragem de falar aqui em casa”, “Já me achei uma monstra por não gostar de ser mãe, hoje estou conformada” e “É melhor você procurar uma terapia para cuidar disso.”

Ao Bebê.com.br, Renata contou que decidiu buscar a ajuda de uma psicóloga para lidar com essa confusão interna: “Não tenho nenhum sentimento ruim em relação às crianças, por eles sinto só amor, o maior amor da minha vida. Já entendi, no começo da terapia, que preciso ajustar os papeis que desempenho”.

O encaminhamento a um grupo de apoio tem sido excelente. “Uma vez por semana, encontro outras mães com problemas em relação à maternidade. Não tem nenhuma ‘mãe de Instagram’ com a vida perfeita lá, é tudo vida real. Além de eu saber que não estou sozinha, este acaba sendo o momento para mim que eu tanto queria. Meu marido fica com os dois e está tudo dando muito certo”, comemora.

Questões profundas e frustrações naturais

Ser mãe nem sempre é o arco-íris pintado em redes sociais e propagandas de TV – na verdade, quase nunca é. Cynthia Boscovich, psicóloga especializada em mães e bebês, afirma que a realidade pode mexer com o humor e com os sentimentos, sim.

“A maternidade traz à tona uma série de sentimentos e questões profundas com os quais a mulher não tinha que lidar antes. A dependência absoluta do bebê faz com que ela tenha que prestar cuidados com que não estava acostumada, se adaptar às necessidades da criança. É muito difícil”, diz ela, que é colaboradora do Progruda – Programa de Transtornos Afetivos do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.

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Para o psiquiatra Sérgio Lima, especialista em Psicologia Social pela USP, o fator cultural pesa muito nessa equação. “Vivemos uma cultura em que tudo é muito rápido e líquido. O que precisa de processos, e ser mãe precisa de um processo, tende a ser idealizado de uma forma que não condiz com a realidade”, observa. E, quando a realidade bate à porta, vem a inevitável sensação de não estar fazendo a coisa direito.

O processo a que ele se refere é, essencialmente, a transição do papel de filha para o papel de mãe. “Ser mãe é um processo de ruptura. A mulher passa a ser a fonte de segurança para um outro ser humano – o filho”, pontua. “Ter um filho vai demandar saber lidar com esse processo. É necessário também saber lidar com as frustrações, que são naturais.”

Aí entra a influência das “mães perfeitas de Instagram” às quais Renata se referiu. “Há um ideal de felicidade e perfeição por meio delas. É um limiar muito grave para a frustração”, opina o psiquiatra.

Saúde mental na maternidade

Outra questão relacionada ao sentimento de insatisfação com a maternidade pode ser a depressão pós-parto, lembra Cynthia. “Ela pode acontecer sem tristeza, é muito importante ressaltar isso. Pode vir simplesmente com falta de energia. A privação do sono pode ser um gatilho. É uma mãe que precisa prestar cuidados com dedicação exclusiva ao bebê, mas como vai fazer isso sem energia?”, questiona.

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Pelo ângulo da saúde mental, Sérgio conta que todos nós temos potencial para desenvolver algum transtorno psiquiátrico, e que a sobrecarga da maternidade pode levar à depressão pós-parto.

Ele explica: “Uma mãe sem rede de apoio tem potencial para uma depressão pós-parto, sem dúvida. Antigamente, as novas mães eram introduzidas à função com os bebês pelas próprias mães, avós, sogras. Hoje, o ambiente não é tão acolhedor. Além de não contar com o auxílio das mais velhas, a nova mãe ainda tem que lidar com críticas e cobranças da mãe, da sogra. A depressão pós-parto vem porque as mães estão cada vez mais desamparadas.”

E como lidar com esse sentimento?

Se você estiver passando por tudo isso, em primeiro lugar é importante saber que não é sua culpa e que você não está sozinha. Em segundo lugar, é importante você procurar ajuda de psicóloga, psiquiatra e grupos de apoio.

“A mãe deve buscar tratamento e cuidados com quem entenda do assunto. A depressão precisa ser muito bem diagnosticada, para poder lidar com ela de forma adequada”, afirma Cynthia.

A abordagem costuma ser combinada e multidisciplinar. “Terapia, grupo de apoio e medicamentos para tratar os sintomas são os primeiros passos, pois isso é causado por fatores biológicos, emocionais e sociais. Esta mãe deve saber que tudo tem a ver com o momento e, se bem encaminhada, ela mudará suas perspectivas e, com o tempo, se restabelecerá”, finaliza o psiquiatra Sérgio.

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