O medo faz parte da natureza humana. É um estado emocional que ativa os sinais de alerta do corpo diante dos perigos e uma importante etapa do amadurecimento afetivo de bebês. A tarefa dos pais é ajudá-los a lidar com os próprios temores, que tendem a florescer ainda mais nos primeiros aninhos de vida. Mas qual o limite entre o medo normal e o exagerado? O que fazer quando o pequeno começa a sofrer?
Para a psicóloga Maria Tereza Maldonado, de São Paulo, o saudável é buscar o equilíbrio. “A falta de medo expõe a criança ao risco e o excesso dele faz com que ela se feche, numa espécie de prisão sentimental”, explica a especialista. “O ideal é ajudar a criança a identificar o medo ‘amigo’ e o medo ‘inimigo’. O primeiro ela deve obedecer, e o segundo, desobedecer.”
Na prática, o que se espera é que o pequeno aprenda a dominar seus temores e não ser dominado por eles, assim como acontece com os adultos. A diferença é que meninos e meninas têm uma percepção mais inocente dos acontecimentos, uma imaginação bastante fértil e uma menor capacidade de discernimento dos fatos. “Esses três ingredientes juntos transformam um simples ralo de piscina na mais pavorosa ameaça à vida humana”, ilustra Maria Tereza, cujo filho passou por essa situação. “Ele viu uma folha ser tragada pelo ralo e deduziu que o mesmo aconteceria com qualquer um que entrasse na água.”
Identificar a origem ou mesmo a existência do medo infantil exige dedicação. É preciso estar atento aos sinais demonstrados pela criança e saber conversar com ela sobre o que lhe causa pavor. Os pais e os responsáveis devem dar corda e valorizar tudo o que a garotada diz. Também precisam lembrar-se de que nem sempre os pequenos se comunicam por palavras. “A oportunidade de se expressar dá à criança a chance de encontrar a saída sozinha”, garante Maria Tereza.
Sintomas
O medo excessivo causa reações fisiológicas e comportamentais na criança. Coração palpitante, calafrios, suor nos pés e nas mãos, sono intranquilo, descontrole para fazer xixi, diarreia e dor de barriga são alguns dos indícios do problema. “Quando esse quadro se instala, a saúde da criança pode ser prejudicada por causa de uma desidratação ou anemia, por exemplo”, alerta a psicopedagoga Eliane Pisani Leite. As reações comportamentais – inibição e agressividade – por sua vez prejudicam a rotina da criança, mas podem se agravar e virar fobias, caracterizadas por reações exageradas que fogem ao controle da criança. Para detectar essas situações o quanto antes, conheça os principais tipos de medo.
Tipos de medo comuns na infância
O pediatra carioca Júlio Dickestein diz que o medo costuma surgir diante de alguns elementos reais na vida de uma criança: o médico, a creche ou escola, a alimentação, a violência e a dor recorrente. Essas causas reais geram um medo verdadeiro, mas também podem derivar para estados secundários (medo de escuro, de monstros etc.).
“Cada criança reage de uma maneira e o temor pode se tornar banal ou catastrófico”, explica o médico. “O importante é que os pais saibam a origem do medo, que acaba se manifestando de forma mais clara quando a criança fica sozinha ou está em lugares escuros”, explica o pediatra. Conheça cada um deles:
Medos comuns por idade
0 a 18 meses
Barulhos estranhos ou altos, luzes intensas, pessoas estranhas e riscos de quedas. O bebê chora ou fica irritadiço e agitado.
18 a 36 meses
Água, pessoas mascaradas (Papai Noel), escola e tudo o que for estranho à sua rotina. É importante saber que a zona de conforto do bebê está ligada à ordem.
3 a 5 anos
Fantasias assustadoras, como monstros e fantasmas. É a fase da imaginação fértil, que pode se intensificar na hora de dormir. Ela acontece por causa do desenvolvimento da massa cinzenta. Vale lembrar que a capacidade de imaginação aumenta à medida que ocorre o desenvolvimento biológico do cérebro.
A partir dos 6 anos
Medos mais vinculados à realidade, como o de ladrões e o de acidentes em geral. A família deve transmitir a malícia necessária para a criança ter segurança. Nessa hora, é importante demonstrar como agir em uma piscina ou, então, o que fazer diante do assédio de estranhos.
Como lidar com o medo infantil
- Dê atenção, questione e estimule a criança a enfrentar o medo irreal (ou inimigo): ela encontrará sozinha uma solução para suas fantasias. Exemplo: a sombra na parede pode se transformar em uma aliada no confronto dos medos (em vez de causá-los).
- Não gaste tempo demais falando sobre o assunto para evitar que a criança fique ainda mais ansiosa. Mude de tópico, distraia.
- Fale a verdade sobre os medos reais (ou amigos) para que a criança construa noções de perigo. Exemplo: ela tem de saber que escadas, piscinas e animais presos representam riscos. Mas faça isso sem aterrorizá-la.
- Brinque com seu filho e entre na fantasia dele (a do bicho-papão, por exemplo): experiências lúdicas ajudam os pequenos a lidar com seus anseios.
- Bonecos e brinquedos treinam a criança para a vida. Os pequenos costumam representar em brincadeiras o sentimento de medo frente a uma situação real, como a ida a um hospital.
- Avalie a intensidade do medo e fique atenta para o limite da normalidade, que é a rotina saudável de vida.
- Faça a apresentação formal das pessoas para que a criança saiba que aquele estranho tem autorização do pai para se aproximar. É verdade que nem sempre isso funciona. Nesse caso, é preciso ter paciência e saber dar tempo ao tempo. Essa fase passa. Mas é importante não confundir o choro da criança que fica sem a mãe a semana inteira e não quer largar o colo no fim de semana do choro de medo de estranhos.
- Ofereça objetos para ela se sentir mais segura, principalmente na hora de dormir sozinha. São os chamados objetos transicionais, que reduzem a ansiedade da criança durante a passagem da vida desperta para o sono. Pode ser o famoso ursinho, o naná, a boneca e até a mantinha. O importante é que ele tenha algo familiar à mão para enfrentar os temores na hora de dormir.
- Jamais use o medo da criança como meio de poder: além de cruéis, ameaças de deixar o filho sozinho ou no escuro reforçam o medo inimigo.