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Ovário artificial poderá ajudar mulheres com câncer que desejam ter filhos

Congresso apresenta primeiros resultados positivos da técnica que, apesar de estar longe de virar realidade, já é promissora. Entenda como funciona.

Por Chloé Pinheiro
Atualizado em 4 jul 2018, 19h03 - Publicado em 4 jul 2018, 19h02

Retirar o ovário é uma etapa comum do tratamento de mulheres com tumores nesse órgão, sem contar que a própria quimioterapia pode impedir que o local se regenere, impossibilitando uma gestação. Para contornar a infertilidade que acompanha estes casos, há alguns anos nasceu a técnica de criopreservação, que ainda é experimental, e consiste em congelar uma parte do tecido ovariano e a reinserir na mulher quando o tratamento acabar.

O problema é que a malignidade do tecido, ou o seu potencial para virar câncer, pode sobreviver ao congelamento, e a preservação dos óvulos, que é uma opção mais estabelecida e simples para esses casos, nem sempre pode ser feita. Agora, cientistas dinamarqueses anunciaram um ovário artificial que demonstrou suportar a vida dos folículos, estruturas que liberam o óvulo para que ele seja fecundado e gere um bebê.

O trabalho foi apresentado esta semana no 34º Encontro Anual da Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia (ESHRE), em Barcelona, pelo Rigshospitalet’s Laboratory of Reproductive Biology, da Dinamarca. A premissa tem ares de ficção científica. “Um ovário feito com bioengenharia poderia permitir o crescimento de folículos anteriormente congelados em um novo tecido, livre de malignidades”, explicou Susanne Pors, pesquisadora do Rigshospitalet’s e autora do trabalho no material de divulgação.

Entenda como foi feito o ovário

Os pesquisadores utilizaram amostras de células foliculares e tecido do ovário colhidas das mulheres antes que elas recebessem o tratamento para câncer. Depois, o tecido foi submetido a um procedimento que “descelulariza” a área – ou seja, mata as células vivas presentes para que o tecido vire apenas uma espécie de forma ou plataforma para um novo órgão se desenvolver.

O resultado é uma base sem células, chamada de matriz extracelular, que é uma promessa da bioengenharia já estudada para outros lugares do corpo. Neste caso, as células foliculares foram inseridas na matriz extracelular ovariana, que já continha nutrientes e estruturas do ovário e poderia simular o ambiente onde os folículos cresceriam e alcançariam a fase antral, quando estão prontos para funcionar.

“Descobrimos então que as células ovarianas e os folículos primários foram capazes de recelularizar o tecido in vitro, migrando para a matriz e repovoando-a”, explicou Susanne. Os transplantes do tecido em roedores, que foram feitos após essa etapa de cultivo, mostraram que o ovário artificial suportou o crescimento dos folículos primários.

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Limitações

Ainda é muito cedo para especular se ou quando a técnica poderá ser aplicada em humanos. Primeiro, é preciso avaliar a qualidade do funcionamento dessa estrutura. “A biologia nos sugere que os óvulos dentro dos folículos interagem intrinsecamente com seu entorno e com as células ovarianas. Folículos que crescem sem essas células de suporte poderiam ter seu desenvolvimento prejudicado”, comentou Ying Cheong, professor de Medicina Reprodutiva da Universidade de Southampton, nos Estados Unidos, após assistir a palestra.

Ou seja, trata-se de uma possibilidade para um futuro distante, que exige mais estudos in vitro duradouros e, depois, in vivo, em animais e humanos.

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