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“Eu tive depressão pós-parto”

Conheça a história de uma mãe que encarou a doença, procurou ajuda, venceu preconceitos e descobriu a força que tem dentro de si.

Por Luísa Massa (colaboradora)
Atualizado em 26 out 2016, 11h38 - Publicado em 4 abr 2016, 08h13

Valéria Bastos, 36 anos, é pedagoga e mãe da Vallentina, de 11 meses. Aqui, ela fala sobre o período conturbado que passou após o nascimento da filha e o que aprendeu com a sua experiência pó-parto.

“Me pergunto todos os dias por qual motivo a depressão pós-parto aconteceu comigo. Minha filha foi muito desejada, eu fiz tratamentos, tentei engravidar por longos cinco anos e não consegui. Até que em setembro de 2014 descobri que estava grávida naturalmente. Foi uma felicidade imensa!

Passei por uma gestação tranquila, como a de toda mulher que espera muito o seu bebê. Vallentina estava prevista para chegar em junho, mas nasceu prematura com 34 semanas de parto cesárea. Mesmo assim, senti uma alegria indescritível no momento em que a segurei nos meus braços pela primeira vez e a amamentei. Só que tive dificuldades com a amamentação, pois ela não pegava o peito corretamente e não estava se alimentando como deveria.

Então, chegou o dia em que eu recebi alta, mas a pequena teve que ficar no hospital. Foi aí que começou a verdadeira saga, pois uma das piores sensações da minha vida foi chegar em casa sem o meu bebê. Me sentia frustrada, triste e vazia. Mesmo recém-parida, com pontos doloridos, eu ia todos os dias cuidar da minha filha. Ela mamava o leite que eu tirava do meu peito na bombinha elétrica através de uma sonda. Aquela cena me cortava o coração.

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Até então eu não havia apresentado nenhum sintoma de depressão pós-parto, até mesmo porque eu não tinha tempo para manifestar, já que a Vallentina precisava muito de mim. Durante as três semanas em que ela ficou no hospital, os meus pontos se abriram e eu não conseguia vê-la com sonda sem chorar. Mas no domingo, no Dia das Mães, tive uma surpresa: ela recebeu alta! Fiquei muito feliz!

Chegando em casa, enfrentei os desafios de uma mãe de primeira viagem: amamentação de três em três horas, noites perdidas, cuidados com a higiene do bebê… Enfim, uma rotina desgastante para quem nunca havia passado por isso. Uma semana depois da sua volta, comecei a sentir angústia e uma vontade de chorar que não ia embora nunca. Passei a não comer, não dormir e a ter um inexplicável medo de ficar próxima da minha filha. O choro dela me dava calafrios e eu comecei a pensar que a minha vida não valia mais a pena, pois eu tinha perdido a minha liberdade. Confesso que já cheguei a ter pensamentos suicidas e até mesmo de fazer mal para o bebê. Eu não me sentia mãe. Eu não queria ser mãe e passar por todo aquele processo. Eu queria a minha vida de antes. A culpa por ter esses pensamentos me consumia e como contar para alguém? Como pedir ajuda para o meu marido, para a família e ter que dizer que eu não tinha certeza se amava minha filha e que eu não estava gostando da experiência da maternidade?

O meu esposo me via chorando o tempo todo, sem coragem de cuidar da nossa filha e não entendia. Ele jogava na minha cara que eu tinha desejado tanto ser mãe e ficava com frescuras agora que isso tinha acontecido. Com a minha mãe aconteceu a mesma coisa. Eu disse para ela no auge da doença que sentia a bebê como uma estranha, mas que não era culpa minha porque eu não queria ter aquele sentimento. Ela vivia falando que eu não deveria mais repetir aquilo, que era impossível eu não ter certeza de que amava uma coisa tão linda, que tinha saído de dentro de mim.

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Mesmo assim, admiti para mim mesma que eu precisava de ajuda. 11 anos antes eu já havia tido um episódio depressivo – bem menor do que aquele que eu estava vivendo – e sabia que era imprescindível o apoio médico. Resolvi procurar o psiquiatra e falei tudo o que estava acontecendo. Primeiro ele me passou uma medicação que não deu certo e eu continuei me sentindo mal. Depois disso, ele receitou outro remédio e em mais ou menos 15 dias os primeiros efeitos foram percebidos. Lentamente, comecei a melhorar, o choro constante foi passando, a angústia e pensamentos ruins diminuindo.

Quanto à família, as coisas só começaram a aliviar quando fomos os três – eu, meu marido e minha mãe – ao psiquiatra. Ele conversou conosco sobre o que é a depressão pós-parto, quais são os sintomas da doença e deu dicas para eles contornarem a situação. Infelizmente, o depressivo ainda é visto na nossa sociedade como um louco, um desequilibrado, mas isso não é verdade. A doença pode acontecer com qualquer pessoa, mas existe tratamento e luz no fim do túnel.

Minha filha completou 11 meses e hoje posso dizer que não estou 100%, mas já sei lidar muito melhor com as sequelas que a depressão deixou em mim. Já não tenho sintomas físicos com a mesma frequência e consigo até aconselhar outras mães que estão tendo essa vivência. Graças a Deus, a relação com a Vallentina está ficando cada vez mais próxima e do meu jeito, no meu tempo, posso dizer que a amo. O nosso amor é muito especial porque ele não foi nato e, sim, construído. Quero que esse sentimento continue se solidificando cada dia mais.

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Com o meu depoimento, espero poder ajudar outras mães, pois como diz Caetano Veloso: “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Se você está passando por isso, fale com o seu ginecologista e com um psiquiatra. Para atender pessoas que não têm plano de saúde ou condições de pagar, existem serviços públicos para casos psiquiátricos. Procure saber sobre eles e envolva a sua família no tratamento!”

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