Continua após publicidade

Sinais de que há algo errado com o comportamento da criança

Detectar desconfortos emocionais nos pequenos não é tão simples quanto perceber os de ordem física. Saiba mais.

Por Cristiane Marangon (colaboradora)
Atualizado em 1 mar 2017, 15h56 - Publicado em 25 Maio 2015, 10h52

Desejar que um filho cresça saudável, feliz e que nada de mal aconteça a ele é natural e faz parte de cada dia da vida de pais e mães. A pergunta “será que está tudo bem o meu filho?” ecoa como um mantra na cabeça dos adultos. Afinal, quais são os sinais que revelam que algo está fora dos padrões?

Para a psicanalista e professora Isabel Kahn Marin, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o principal critério é observar se a criança, frente ao novo, busca coragem para ir adiante. “Estranhar as novidades é comum. O que não pode acontecer é a paralização diante de um desafio”, explica. “Não conseguir dormir, ter medo de tudo, ficar calado demais e ter atitudes de recusa o tempo todo são indícios de que algo não vai bem.” Cuidado apenas com os diagnósticos antecipados. O pequeno pode até não querer comer, mas, se no fim das contas se alimenta, tudo corre dentro da normalidade.

Em um primeiro momento, as referências familiares são fundamentais para detectar qualquer dificuldade. Pais, mães, avôs, avós e babás devem se organizar para ajudar o pequeno. “Se ele quer o brinquedo de outro garoto e, por isso, joga a areia do parque nele, cabe aos responsáveis orientá-lo, alertando que essa atitude não é adequada”, ensina a professora. “É fundamental a mediação de um adulto para que ele se adapte às exigências do mundo.”

Quando uma dificuldade não é resolvida em casa, vale conversar com os profissionais que atendem a criança – professor e pediatra. Caso não se observe mudanças importantes nas manifestações de desconforto, o caminho é buscar orientações com profissionais ligados ao desenvolvimento infantil, como os psicólogos.

Cabe ressaltar que muitos problemas apresentados sofrem influência paterna ou materna. Agressividade pode indicar pais permissivos ou abusadores e ansiedade tem a ver com pais autoritários ou também ansiosos. “Muitas vezes, na psicoterapia infantil, um treinamento parental é o suficiente para reduzir a frequência do comportamento problemático”, afirma a psicóloga Juliana de Brito Lima, de Teresina (PI), e também colunista do blog do Instituto de Psicologia Aplicada (InPA), de Brasília (DF).

Segundo a psicóloga não é raro encontrar crianças com problemas de comportamento que são reflexo de desajustes conjugais ou mesmo emocionais de seus progenitores, uma vez que elas estão sensíveis ao ambiente que as cerca. “Daí a importância da avaliação comportamental do pequeno e encaminhamentos dos responsáveis para outros tratamentos, como terapia de casal ou individual.”

Comecinho de vida
Os bebês, desde cedo, apresentam sua personalidade, mesmo que ainda em formação. “Com o tempo, identificamos suas preferências e aprendemos a vê-lo como um indivíduo, trazendo em si aquilo que diferencia um ser humano de outro – sua subjetividade”, explica a equipe do Entre Laços – núcleo de atenção à primeira infância. “Quanto mais nos abrimos para ler o bebê, mais aprendemos sobre ele!” Para que sua mensagem seja interpretada pelo adulto que o cuida, é fundamental estar aberto para aprender e ensinar como a relação entre eles vai se desenvolver.

Continua após a publicidade

No início da vida, a criança traduz, por meio do corpo, suas experiências psíquicas. Ela pode expressar bem-estar quando o desenvolvimento se dá de maneira harmoniosa ou algum sofrimento psíquico quando algo não vai bem. “Ao observarmos como acontece a alimentação, o sono, a vocalização, o olhar, o brincar e a postura desse bebê, podemos traçar um panorama de como ele está se desenvolvendo do ponto de vista cognitivo, social e emocional”, afirmam os profissionais do Entre Laços.

Bebês que comem demais ou rejeitam com frequência diversos alimentos, que dormem muito ou mantém um sono curto por longo período, que não se comunicam com o olhar ou emitem gritos inarticulados ou mudismo excessivo, que não interagem ao brincar com o próprio corpo ou na exploração de objetos, que apresentam o corpo relaxado ou tensionado demais podem estar sinalizando que algo não vai bem do ponto de vista emocional.

Vale destacar que o estranhamento a cada fase nova de seu desenvolvimento é esperado, como apresentar dificuldade de sono por mudar do berço para a cama ou recusar a se alimentar na passagem da dieta pastosa para a sólida. Os adultos serão os condutores dessas mudanças. Se elas forem feitas respeitando o ritmo individual, as fases de estranhamento não devem permanecer por muito tempo.

Pouco depois
Mesmo quando o quando o bebê cresce e já faz uso da fala para expressar seus desejos e protestos, os adultos que o rodeiam devem se atentar. O fato de começar a dominar o discurso não quer dizer que ele já domina as causas de seu desconforto, principalmente se for emocional. “O que dá pistas de que algo não vai bem é, de novo, o seu comportamento”, explica o pessoal do Entre Laços. “Além de todos os sintomas já citados como preocupantes para os bebês, roer unha, diminuição do apetite, reagir à entrada na escola e pesadelos também são indícios.” Vale destacar que essas manifestações podem ser ocasionais, frente à introdução de novidades, afinal, qualquer um apresenta alguma mudança de comportamento diante do novo.

Juliana enfatiza outros fatores de observação, considerando a necessidade de auxílio profissional: apatia, tristeza, irritabilidade, olhar vago ou perdido, esquiva de contato visual, atrasos na aquisição e desenvolvimento da linguagem e psicomotricidade, dificuldade na compreensão e aprendizagem, déficit no seguimento de regras impostas pelos cuidadores, agressividade, agitação psicomotora e perturbação do sono.

Os cuidadores, ao observarem mudanças de comportamento nos pequenos, podem traduzir o que imaginam estar acontecendo, independentemente de sua idade: “Você pode estar estranhando essa nova comida, mas já tem dentinhos fortes e condições de mastigar”, “Sua cama está diferente, mas o papai e a mamãe vão continuar contando historinhas antes de você dormir”. Com palavras tranquilizadoras e apostando na condição da criança de superar as dificuldades iniciais, o comportamento não tende a persistir.

Continua após a publicidade

Bem maiorzinho
Quando ingressa na escola, a criança  exercita aspectos cognitivos (pela aprendizagem de conteúdos escolares) e sociais. É nessa fase que se desenvolve a socialização, pois já é possível interagir, brincar em grupos e assimilar regras, valores, habilidades (como civilidade, expressão emocional, empatia, fazer amizades e resolver problemas interpessoais).

Os pais devem observar, sobretudo, dois sinais: se há problemas acadêmicos (baixo desempenho escolar, alguma dificuldade de aprendizagem, baixas concentração e atenção, agitação ou retardo neuropsicomotor, recusa de ir à escola, ansiedade diante de atividades escolares) e prejuízos sociais (se exclui ou é excluído dos grupos de amigos, se é isolado, se é bem quisto pelos colegas, se é agressivo ou retraído diante dos amiguinhos etc.). Como a criança chega da escola também merece de atenção. Perceba como ela relata as atividades acadêmicas de que participa (se com entusiasmo ou apatia, por exemplo), se chega com dúvidas que poderia ter sanado com os professores e como interage socialmente.

Recomenda-se que os pais observem um pouco a criança antes do início das aulas ou na saída da escola. “Muitas vezes, as questões escolares são fontes de ansiedade quando um fracasso ou um erro vem acompanhado de uma punição. É o caso das provas, que podem desencadear ansiedade significativa quando a família é exigente quanto às notas”, explica Juliana.

É importante avaliar cada comportamento em seu contexto, buscando variáveis que o influenciam e o mantêm. O contato frequente com os professores e com os demais pais nas reuniões escolares e a conversa diária com os filhos, verificando como foi o dia, o que aprendeu, quem são os amigos, de quem gosta mais, o que faz diante de alguém que não gosta muito, também constituem fatores que ajudam na detecção precoce de problemas infantis, favorecendo um melhor prognóstico.

Fontes: Entre Laços – núcleo de atenção à primeira infância; Instituto de Psicologia Aplicada (InPA);
Isabel Kahn Marin, psicanalista e professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)

Publicidade