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O valor das licenças maternidade e paternidade para a criação dos filhos

O período em que pais e mães podem se desligar do trabalho para se dedicar exclusivamente à chegada do bebê é fundamental não só para o desenvolvimento da criança durante a infância, mas também para a sua formação na vida adulta.

Por Luiza Monteiro
Atualizado em 28 out 2016, 08h06 - Publicado em 4 Maio 2016, 10h15

A licença-maternidade vai muito além de garantir apenas que o recém-nascido se alimente e se desenvolva nos seus primeiros meses de vida. Assegurar que a mãe consiga se dedicar exclusivamente ao pequeno que acabou de chegar ao mundo é também contribuir para formar uma criança (e um adulto) mais segura e com uma estrutura emocional sólida. “O bebê está começando a formar a base da sua personalidade. E isso se sustenta nas primeiras relações dele com o cuidador”, explica o pediatra Renato Coelho, presidente do Comitê de Pediatria do Desenvolvimento e Comportamento da Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul (SPRS).    

Os especialistas defendem que, no mundo ideal, o período em que a mãe deveria focar nos cuidados com o filho (longe do trabalho) seria de um ano. Que sonho! Mas há países em que ele já é realidade: na Noruega, por exemplo, as mães têm direito a um ano de licença; na Suécia, a quase oito meses. Infelizmente, não é o que acontece da maior parte das famílias no resto do mundo. E não pense que estamos falando só do Brasil, não. Holanda, França e Espanha, por exemplo, garantem 112 dias de afastamento às mulheres que tiveram filho. Nos Estados Unidos, a situação é pior – as mamães têm direito a apenas 84 dias de licença e sem qualquer remuneração.

 

 

Aliás, ao contrário do que muitos imaginam, a legislação brasileira não está entre as mais atrasadas quando se trata da licença-maternidade. Por aqui, mulheres que estão empregadas e que contribuem para a Previdência Social (INSS) têm direito a 120 dias de recesso remunerado – o equivalente a quatro meses. A exceção são as funcionárias públicas ou que trabalham em companhias que fazem parte do programa Empresa Cidadã, que têm garantidos 180 dias (seis meses) de licença. “Ainda que não seja o ideal (os 120 dias), acho que é um período que permite à mulher o equilíbrio entre se manter no mercado de trabalho e ficar com o filho até uma certa idade”, opina a advogada Maria Lucia Benhame, especialista em direito do trabalho e sócia-fundadora do escritório Benhame e Forster Sociedade de Advogados, em São Paulo.

Mas isso não significa que não é preciso avançar mais. Devemos continuar lutando por mais direitos das mamães brasileiras – e estamos no caminho certo. Em dezembro de 2015, o Senado aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 99/2015, que propõe a ampliação da licença-maternidade para mães de prematuros. De acordo com a PEC, de autoria do senador Aécio Neves (PSDB-MG), o recesso dessas mulheres só passaria a contar a partir da alta do bebê, e não do nascimento. A proposta está em tramitação na Câmara dos Deputados.

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Licença parental

Em países como a Suécia e a Noruega, tanto a mãe quanto o pai podem tirar licença do trabalho para cuidar do pequeno que acabou de nascer. E não estamos falando de direitos exclusivos do homem ou da mulher, mas de ambos. “Trata-se da licença parental, que é quando o pai ou a mãe pode escolher quem vai ficar com o filho”, esclarece Maria Lucia. No Brasil, esse benefício se restringe aos pais que adotaram uma criança. “Mas eu acredito que um avanço seria permitir a licença parental também para os pais biológicos”, diz a advogada.

A licença-paternidade

Não é apenas a mãe que precisa de um tempo longe da rotina profissional para cuidar do pequeno – o pai também! “O papel do pai é de sustentar a dupla mãe e bebê. Para que a mulher possa cuidar do filho, ela precisa sentir que tem um apoio por trás”, analisa Coelho. A criança também tira muito proveito da presença do papai. “Ele tem grande importância no crescimento e no amadurecimento do filho”, revela a psicóloga Salete Arouca, do Hospital e Maternidade Santa Joana, também na capital paulista.

É por isso que a licença-paternidade é tão essencial quanto a licença-maternidade. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 garante ao homem o direito a cinco dias de afastamento do trabalho após o nascimento do filho. Mas isso está mudando – e para melhor. No dia 8 de março de 2015, a presidente Dilma Rousseff aprovou um projeto de lei que aumenta a licença-paternidade para 20 dias. O benefício vale para quem está empregado em companhias do Programa Empresa Cidadã e para funcionários públicos federais. No caso destes últimos, a mudança já está em vigor; para os demais trabalhadores, ela ainda depende da aprovação de questões fiscais no Congresso. De qualquer forma, a medida representa um grande avanço. Para se ter uma ideia, a nova licença nos coloca à frente de nações como Austrália e Reino Unido, que oferecem 14 e 15 dias de licença-paternidade, respectivamente. Considerando os cinco dias garantidos à maior parte dos pais brasileiros, contudo, ainda estamos muito atrás desses países.

 

 

Benefícios para mãe e bebê

Já deu para entender que o período de afastamento do trabalho para cuidar do recém-nascido é importante para toda a família. Mas quando se trata da mãe e do recém-nascido, ele é fundamental para garantir que essa dupla estejam bem e em sintonia. Um estudo de 2013 das universidade de Maryland e de Minnesota, ambas nos Estados Unidos, demonstrou que ter esse tempo para se dedicar ao filho diminui o risco de a mulher apresentar depressão pós-parto. “O vínculo entre a mãe e o bebê pode ser um fator que auxilie para o não desenvolvimento desse transtorno”, avalia Salete.

Quando se trata do aleitamento materno, a licença também é imprescindível para que esse processo aconteça de forma tranquila e saudável. “Tendo mais tempo, a mãe se sente mais segura para uma amamentação de livre demanda e exclusiva, que faz parte dos primeiros seis meses de vida do bebê”, observa a psicóloga do Santa Joana. A presença do pai também ajuda a promover a amamentação. “Crianças de pais que não fazem uso da licença-paternidade têm menor probabilidade de ser amamentadas no primeiro ano de vida do que aquelas cujos pais estiveram presentes”, conta Marina Fragata Chicaro, coordenadora de Conhecimento Aplicado da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal.

A questão é que muitas mamães não conseguem amamentar por muito tempo porque o tempo da licença não permite. É o caso do Brasil. Uma pesquisa feita em 153 países, publicada no dia 29 de janeiro no periódico científico The Lancet, apontou que, embora os índices de amamentação tenham crescido por aqui nas últimas décadas, 61% das crianças brasileiras de até 6 meses não são alimentadas de forma exclusiva com o leite da mãe, como recomenda a Organização Mundial da Saúde (OMS). E a realidade não é diferente em outros países: nos Estados Unidos, 18,8% dos bebês mamam apenas no seio até os 6 meses, de acordo com o Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC); no Reino Unido, esse índice é de 1%, segundo a OMS. “O aleitamento materno depende de vários fatores, mas a licença-maternidade de seis meses facilita e promove, sim, a amamentação”, defende o pediatra da SPRS.

Investimento a longo prazo

E não pense que as vantagens de investir nas licenças maternidade e paternidade se limitam aos primeiros anos de vida. Elas vão além: a consequência será uma sociedade melhor lá na frente. “Muitas pesquisas mostram que investimentos feitos nesses primeiros anos de vida têm impacto no futuro, reduzindo a criminalidade, melhorando os níveis de educação e diminuindo gastos com saúde”, conta Marina Fragata Chicaro, coordenadora de Conhecimento Aplicado da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal. Dar amor e atenção aos nossos pequenos, portanto, é construir o mundo que sempre sonhamos. 

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